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Um discurso para português ler

Paulo Rego*

Ho Iat Seng foi claro no discurso preparado para o almoço esta semana oferecido à imprensa de língua portuguesa e inglesa de Macau. Oportunidade para transmitir três mensagens relevantes: a importância da comunicação social não chinesa, que reporta a realidade com olhos diferentes; a projeção para o mundo de uma Região autónoma, com liberdade de informação e de expressão; e a importância da plataforma lusófona, a propósito da qual realçou a visita a Portugal – a única ao estrangeiro do seu já longo mandato.

Nenhum destes temas tem sido central, quer no discurso quer na prática do Chefe do Executivo. Como ficou patente no seu discurso de fim de ano, no qual fez a súmula dos pontos essenciais e conquistas mais marcantes da sua governação. E, em bom rigor, a questão mede-se ao nível dos factos – e não da narrativa. Percebe-se, e tem significado político, que o tenha feito na receção à Imprensa de língua portuguesa e inglesa. É importante que assuma o objetivo político – que vem da China – de fazer a prova de uma cidade autónoma, plural, e aberta ao mundo.

Veja-se, contudo, o desabafo do cônsul de Portugal, que após um período de tentativa de negociação discreta, assumiu publicamente que a diplomacia portuguesa está perplexa com a mudança drástica da RAEM no direito de residência para cidadãos portugueses. Cada vez mais difícil – e distante. Também é verdade que essa visita a Portugal, tendo a importância teórica que tem, não teve até ver qualquer consequência na reaproximação económica, cultural, e da visão de ponte entre a China e a Lusofonia. Já para não falar do uso da língua portuguesa, claramente menorizada – para não dizer menosprezada.

Quanto à liberdade de expressão e ao direito à informação, o mínimo que se pode dizer é que a prática da governação é cada vez menos transparente e os contactos com a comunicação social cada vez menos frequentes; mais institucionais e padronizados. Já o debate, discussão e pluralidade, não existem sequer entre a hierarquia e os quadros da Administração, quanto mais na reflexão pública. É preciso lembrar que uma informação moderna, livre e plural, não se define só por leis e discursos, mas sim pela prática política.

Por fim, há uma reflexão que importa fazer sobre a propalada importância da imprensa portuguesa, e os meios que não tem para cumprir a missão que lhe compete. É um debate que tem de ser feito, em termos em que não se sente no poder político, nem vontade, nem entendimento cabal do que está em causa. Cá estaremos para o fazer, porque a prova faz-se caminhando… da narrativa para a prática.

*Diretor-Geral do PLATAFORMA

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