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O Chefe fala bem mas tem de fazer melhor

Paulo Rego*

A plataforma lusófona deixou de ser apenas o discurso político que garante a Macau o destino de ser diferente, na senda da sua História bilingue e multicultural. Como explica o empresário Jorge Valente, na entrevista que publicamos nas páginas 5/7, começa a ser evidente para todos – novas gerações à cabeça – que a única via para a diversificação económica é cruzar a integração regional com a ponte para os Países de Língua Portuguesa – nos dois sentidos.

Na semana em que recebeu governantes da China e dos nove parceiros lusófonos, durante a 6ª Conferência Ministerial do Fórum Macau, Ho Iat Seng teve o discurso politicamente correto: disse o que dele se espera, aquilo que faz sentido, e corresponde à narrativa de Pequim. As 20 medidas anunciadas pelo vice-presidente do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional, Li Hongzhong, focadas num bloco multilateral unido pela língua que é oficial em Macau, provam mais uma vez que não há margem para recusar esse caminho. Mas também é preciso, de uma vez por todas, que Macau cole o discurso à prática: do mindset político à visão económica, passando pelo quadro legal, e acabando no próprio projeto de sociedade.

Não se pode pedir a ministros, que de vez em quando reúnem no Fórum Macau, que sejam eles a fazer negócios. Não é justo, nem intelectualmente honesto. Também não é justo exigir ao Governo de Macau que resolva, de uma penada, a falta de empreendedorismo e cultura de risco que molda o tecido empresarial local. Durante pelo menos duas décadas, desde que houvesse amor à Pátria, dinheiro nos casinos, especulação imobiliária e negócios com o Estado… estava tudo bem. Fingir que havia diversificação económica, integração regional, e projeto lusófono, foi um enredo no qual todos se embrulharam – não foi só o Palácio. As novas gerações de Macau têm muito que andar, pelo seu próprio pé, numa direção diferente.

É verdade que o mandato de Ho Iat Seng combateu em parte o rentismo, e muitos dos vícios instalados na sombra. Mas não é verdade que tenha promovido o bilinguismo, o multiculturalismo, a livre circulação de bens e pessoas, o diálogo e a comunicação, a meritocracia, a atração de capital e de pessoas, a confiança nas leis, ou a reforma da Administração Pública… Antes pelo contrário. Por último, mas não menos importante: não encontrou discurso nem prática capazes de compatibilizar o nacionalismo, e o Primeiro Sistema, com a atração de pessoas, capital e know-how estrangeiro. Muito menos foi capaz de criar um ambiente moderno, livre e criativo, que é a cor que tem de ter o Segundo Sistema. Não há plataforma sem os dois lados da ponte; e pintar um lado de cor-de-rosa, atirando o outro para o buraco negro, prenuncia uma plataforma triste e cinzenta. Não há brilho na ferrugem.

Macau tem História, excedente orçamental, e projeto político para, de facto, criar uma sociedade bilingue e multifacetada; moderna e inteligente; capaz de entender, e aprender a ser competente nos dois lados da ponte. Mas este vício de fazer de conta que recuperar o Jogo é diversificar a economia; que as universidades são boas quando formam maus quadros; que os locais são felizes porque são protegidos da competição que vem de fora – China incluída – que a Administração fala duas línguas funcionando só numa; que há uma cidade de luz que se fecha sobre si própria – e que tem a rua deserta à noite… não está a correr bem. Mas dizer que sim com uma mão no destino, e a outra a contrariá-lo, ainda pode correr pior.

*Diretor-Geral do PLATAFORMA

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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