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Não há Mundo sem os mundos ele tem

Paulo Rego*

A violência e o vandalismo que se seguiram ao assassinato do jovem argelino Nahel, estupidamente baleado por um polícia, fazem tremer uma das democracias mais consolidadas do liberalismo europeu.

Há ali grandes lições a tirar. Um país que recebe tantos milhões de emigrantes – dando-lhes oportunidades que não tinham nos seus países de origem – falha ao integrá-los. E com isso está de pernas para o ar, arrasada pelo ressentimento e o radicalismo daqueles a quem abriu as suas fronteiras.

É difícil perceber o que tem de fazer o Presidente gaulês para repor a paz social. Mas é precisamente neste ambiente que importa reter e valorizar o bom senso do Presidente gaulês, quando se refere à urgência em baixar a tensão entre a China e os Estados Unidos.

Basicamente, explica, que não é possível enfrentar os problemas globais sem o mínimo de consenso entre as duas maiores potências. Chapeau monsieur Macron.

Com o seu próprio país a arder – sabe-se lá com que culpas próprias – Macron mostra apesar disso uma consciência geopolítica apurada; e um bom senso que tantas vezes falta em França – como se vê – e um pouco por todo o mundo ocidental, a começar por Washington.

Numa recente entrevista concedida a Fareed Zakaria, estrela da CNN, Macron deixa clara a sua posição: os problemas que todos hoje enfrentamos; os conflitos existentes – e os latentes – incluindo questões iniludíveis como a redistribuição da riqueza, a agenda climática, a economia sustentável, ou a inteligência artificial… não podem de forma alguma ser abordados sem sentar à mesa do diálogo as duas superpotências.

Ou seja, é no mínimo ingénuo conceber a civilização moderna como se vivêssemos em dois mundos separados por muros ideológicos, económicos… ou geoestratégicos, no seio da crescente tensão entre Pequim e Washington.

O apelo que Macron deixa nesta entrevista não se cinge apenas às lideranças de Biden e Xi Jinping, mas antes a todos aqueles que hoje têm responsabilidades políticas globais.

Diz Macron que é do interesse de todos – ele próprio incluído – encontrar mecanismos que permitam baixar a tensão, procurando nos bastidores da diplomacia internacional o diálogo e a consciência de que urge encontrar um chão comum que todos possam pisar, em segurança e no interesse de uma agenda planetária. Sejam quais forem as divergências que nos separam.

A comunidade estrangeira em Macau – portugueses à cabeça – percebe muito bem a questão. Porque estão mais próximas da China, porque escolheram cá viver há muito aprenderam a respeitar e admirar culturas e visões políticas diferentes; sem acicatar idiossincrasias políticas divergentes.

E isto é válido para os dois lados, soprem os ventos da discórdia do oriente ou do ocidente. No fundo, essa é a beleza das cidades híbridas, que fazem da consciência de que não há verdades absolutas, e da sua capacidade de fazer pontes, o seu maior ativo económico, social e político.

É hoje em dia um prazer, e um orgulho, ter uma cultura de base ocidental, moderada pelo respeito e pelo interesse que em Macau se aprende quando se inclui a visão oriental. Porque esse ser híbrido desenvolve uma profunda consciência sobre a falta de senso que o radicalismo gera, venha ele do lado que vier.

Macron tem toda a razão. E Macau tem todas as condições para fazer parte desse bom senso. Não é sequer uma questão moral, ou ideológica. O radicalismo das convicções é hoje uma ameaça à própria sobrevivência do mundo como o conhecemos.

Diretor geral do Plataforma*

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