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Cidade dos residentes (e turistas)

Guilherme Rego*
Guilherme Rego

Os números da Semana Dourada do Dia do Trabalhador comprovam a recuperação galopante que Macau tem tido desde a reabertura das fronteiras. Não só no número de visitantes, como também no setor que importa para já – o jogo. Os dados só confirmam aquilo que os olhos vêem: multidões acumulam-se nos (poucos) pontos turísticos da cidade. Tudo ótimo para a economia local. Para os residentes, não se pode dizer o mesmo.

O Executivo pressiona para aumentar o número de visitantes. Ho Iat Seng reiterou essa vontade em abril e acrescentou ao pensamento: não se deve reformatar o setor turístico para receber apenas visitantes com maior poder de compra. Certo, assino em baixo. Várias empresas em Macau não estão perfiladas para satisfazer esse mercado de alto nível. Além disso, a sua sobrevivência depende dos turistas com menor poder de compra, e que naturalmente planeiam gastar menos quando viajam. O custo de uma viagem, desde os transportes, à estadia e preços dos serviços são preponderantes na escolha dos turistas. Se Macau se torna uma cidade muito cara, na ânsia de recuperar rapidamente as perdas dos últimos três anos, pode até estragar o seu futuro – e complicar financeiramente a qualidade de vida dos residentes. Devemos ser uma cidade multifacetada, com oferta para todos os gostos, feitios, e rendimentos.

Traduzindo para um conceito conhecido por todos: uma cidade diversificada. Tudo isso é verdade. Mas também é um facto que as multidões causam extremo desconforto nos residentes. Quem vive em Macau acaba por estar em dois pólos opostos neste momento: são os maiores beneficiários da retoma económica, mas também os mais prejudicados. Os preços dos serviços subiram drasticamente e a mobilidade, seja pelo trânsito ou pela falta de um táxi, tornaram a vida mais difícil.

O problema tem solução. Não se trata de menos turistas com maior poder de compra (embora este segmento deva continuar a ser desenvolvido); trata-se de acrescer à oferta turística tradicional, evitando o acumular dos turistas em poucos espaços que, por sinal, também são inevitavelmente do usufruto diários dos residentes. As autoridades até já fecharam o trânsito a favor dos turistas e ponderam tornar essa prática num hábito.

Pouco se pode avaliar nestes primeiros quatro meses de reabertura, mas há dados adquiridos. Há cada vez menos visitantes a chegar a Macau para jogar nos casinos, e cada vez mais são aqueles com menor poder de compra – afastando-se assim das propriedades das concessionárias. Posto isto, cabe ao setor público utilizar o seu património e requalificar certas zonas da cidade em prol do turismo. Mais oferta, menos pessoas acumuladas num só sítio. Em paralelo, cabe ao setor privado capitalizar as oportunidades – criar novas Ruas do Cunha, desviando as multidões.

Porque a procura é visível, e Macau está a pecar é na oferta. Embora tenhamos apenas 33 quilómetros quadrados para oferecer, é do conhecimento geral que a atividade turística está concentrada em poucas ruas e nas propriedades das concessionárias, quando na verdade há zonas “desertas” que podem ser aproveitadas para esse objetivo. Tanto o público como o privado têm responsabilidades neste capítulo, mas cabe ao Governo criar incentivos para que as empresas se estabeleçam em certos bairros e os revitalizem. Cabe ao Governo criar uma situação win-win, onde desenvolver a oferta turística traduz-se num acréscimo da qualidade de vida dos residentes e devolve-lhes a cidade.

*Diretor-Executivo do PLATAFORMA

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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