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Paulo Rego – OU HÁ MORAL OU COMEM TODOS

 

Está cada vez mais nas bocas do mundo o espanto, mesclado de preocupação, face à campanha anticorrupção conduzida pela nova liderança chinesa. Muitos analistas ocidentais descrevem-na como demasiado “feroz”, comparando-a com um radicalismo só comparável à desconfiança que Mao Tse Tung tinha em relação às elites partidárias. Há mesmo quem lance a suspeita de haverem alvos políticos selecionados. Mas do ponto da ética política, como na própria eficiência do regime e dos seus planos de crescimento económico, há factos positivos incontornáveis nesta campanha.

Do ponto de vista interno, para além da legitimidade ética do regime de partido único, bem como dos seus líderes, está em causa a retenção nos cofres públicos, mas também nas empresas estatais, de massa financeira essencial para o fomento do investimento em ativos nacionais estratégicos, para além do crédito às pequenas e médias empresas e a promoção do consumo interno. Do ponto de vista da sua afirmação internacional, a China tem igualmente emitido sinais claros de que pretende compatibilizar a sua economia com padrões internacionais de transparência, provando ter interesse crescente na adoção de sistemas de valores credíveis nos mercados globais. Aliás, a recente quebra na evolução das receitas do jogo, em Macau, tem muito a ver com essa conjugação de interesses que são nacionais – e não meramente locais: combate à corrupção, controlo da inflação, retenção de divisas para investimentos no mercado interno, transparência e integração nos padrões internacionais do controlo do fluxo de capitais.

Mais curioso, quiçá mesmo surpreendente, é perceber que Pequim assume hoje em dia, de forma exemplar, um discurso que prioriza o combate a um vírus que está longe de ser um problema chinês. A corrupção e a fuga ao fisco tornaram-se os maiores inimigos do estado social moderno, provocando a perceção de rutura no equilíbrio entre o que paga o contribuinte e os benefícios que o Estado lhe devolve. Esse desequilíbrio tem minado de forma acelerada, quiçá mesmo incontornável, a própria viabilidade das democracias capitalistas ocidentais.

Vejamos os escândalos de fraude fiscal e de lavagem de dinheiro recentemente descobertos na Suíça e no Luxemburgo. Mas também no caso grego, a corrupção, da mais pequena à maior, tem sido apontada como um dos piores venenos que mata as hipóteses de recuperação da conta corrente do Estado. Circunstância diferente, mas nem por isso despiciente, são os esquemas legais e aceites pela União Europeia, por exemplo, que permite às grandes corporações privada contabilizarem as depesas em solo nacional e os lucros em jurisdição estrangeira. Assim se fundos nacionais e se permitem mecanismos perversos de eficiência fiscal. Portugal é um exemplo óbvio dessa contabilidade negativa, uma vez que praticamente todas as empresas de topo da bolsa de valores transferiram as suas sedes para paraísos fiscais como a Holanda. Há no ocidente uma falsa moral que penaliza o pequeno contribuinte, constantemente fustigado com a caça aos impostos, vendo simultaneamente diminuídas as conquistas e os direitos sociais e laborais, em nome de crise mundial cuja receita insiste em proteger o grande capital, asfixiando as classes média e baixa.

Não é essa – antes pelo contrário – a tese do comunismo capitalista chinês. A chamada Likonomics, por ser atribuída ao primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, estará cada vez mais próxima de contribuir para uma reflexão global, que é essencial para se encontrarem novos consensos que conduzam à paz mundial e ao crescimento económico sustentável. Aliás, não é por acaso que o governo de Atenas, aconteça o que acontecer nas negociações que leva a cabo com a zona Euro, já sabe que conta com o apoio de Pequim.

 

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