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William Tsang – A ARTE DA OSTENTAÇÃO

Quando se questiona um artista so-

bre qual é o seu plano ou o seu objetivo, a resposta é quase sempre a mesma: neste momento estou a tentar colaborar com uma galeria, depois vou participar numa grande exposição de arte; as minhas obras serão vendidas em leilão e farão parte de coleções em galerias e em museus. Interrogo-me sobre a exposição da arte em grande escala, em leilões, galerias ou museus. Fará essa estratégia parte da última utopia criada pelos artistas? Ou será apenas mais uma das ilusões, que vêm uma atrás da outra?

Lembro-me de um famoso romance inglês, chamado Vanity Fair, de William Makepeace Thackeray – Mundo de Ostentação, na versão chinesa – no qual é retratada essa incessante busca do sucesso. A verdade é que, no fim, são poucos os que cumprem os seus sonhos e muitos aqueles que desperdiçaram a sua juventude a persegui-los. Fixar o seu ideal artístico na participação em grandes exposições e leilões, bem como ganhar espaço em galerias e museus, não é certamente um crime. No contexto do mercado de escala, a maior janela de  oportunidade, em Hong Kong, é a Art Basel, que decorre em maio – bem como o Asia Contemporary Art Show – mês durante o qual acorrem à cidade galerias de todas as dimensões e se multiplicam exposições organizadas por grupos de artistas que promovem todos os tipos de eventos artísticos e culturais. Compradores e colecionadores de arte do mundo inteiro desembarcam em maio em Hong Kong, dispostos a comprar um quadro por um milhão de dólares, na Art Basel, mas também interessados em visitar outras exposições onde se adquirire uma obra por menos de dez mil dólares. Em março tem lugar a Affordable Art Faire e, em Outubro, a Fine Art Asia e a Asia Contemporary Art Show. Contudo, nesses momentos o volume de negócios não se compara com o do mês de maio, estabelecido como o mais frenético do mundo das artes em Hong Kong. O facto é que todos estes eventos são direcionados para o mercado, dessa forma promovendo também a exposição internacional da própria cidade.

Várias galerias, bem como os próprios artistas, já perceberam que as oportunidades não se limitam a Hong Kong e à China Continental, espalhando-se um pouco por todo o mundo. As 245 galerias de arte – oriundas de 39 países e regiões  – que este ano participaram na Art Basel Hong Kong, atraindo 65.000 participantes, representam necessidades diferentes no mercado internacional. Consequentemente, as galerias e os artistas de Hong Kong jogam também a ambição de participarem nos mais diversos eventos globais, tais como Bienal de Veneza, Art Basel Suíça, Art Basel Miami, Art Beijing, Art Taipei, Art London, Paris Art Fair, Korea International Art Fair, e muitas outras exposições e circuitos de comunicação. Contudo, mantém-se a questão: o que representa verdadeiramente participar numa grande exposição? Como se forma o preço das obras? Será que muda realmente o grau de receção das obras, conquistando mercados diferentes? Será que participar numa exposição à escala da Art Basel significa que se atingiu o nível de artista internacional?

Qual é a verdadeira importância de se vender um quadro num leilão? A Christie’s realizou recentemente o seu famoso Leilão de Primavera, no qual colocou à vernda uma série de vinhos famosos, jóias, relógios de renome, antiguidades, artesanato e, claro, peças de arte contemporânea chinesas e ocidentais. O volume de negócios atingiu os três mil milhões de dólares de Hong Kong (USD 387 milhões). Não sei se o leitor tem a noção dos preços exageradamente altos que podem atingir em leilão peças de autores que, do ponto de vista artístico, não vão além do que fazem autores chineses comtemporâneos como XuBeihong, Chang Yu ou Wu Guanzhong. Na lista das peças mais caras do Leilão de Primavera da Sotheby’s apenas é possível encontrar os artistas chineses com maior visibilidade internacional, como Chang Yu, Zhang Xiaogang, Qi Baishi, Fu Baoshi, ou Xu Beihong… Também na China Guardian Auctions, trate-se de caligrafia antiga ou de arte moderna, de vinhos famosos ou de selos e moedas, os nomes chineses continuam a ser os mesmos: Qi Baishi, HuangBinhong, Zhang Daqian, Xu Beihong, PanTianshou… Por muito que procurem nos famosos leilões de primavera, se conseguirem encontrar nomes de Hong Kong venham contar-me.

Talvez seja apenas uma visão pessoal, mas refletindo em retrospectica sobre o maio frenético de Hong Kong, diria o seguinte: apesar das grandes exposições, dos leilões e da presença de representantes de galerias e museus de todo o mundo, a tal oportunidade de expor fora e de os artistas encontrarem uma “boa casa” para as suas obras não passa de uma plataforma de adaptação aos mecanismos existentes do mercado. Dos grandes eventos de outono aos que têm lugar no fim do ano, dos leilões de primavera aos do início do ano, repetem-se constantemente as várias faces do mesmo mercado: as únicas alterações visíveis têm a ver com os valores praticados e a troca de alguns nomes.

Quem acha que as grandes exposições e os leilões internacionais refletem faces diferentes do mercado, na esperança de que as obras de arte sejam colecionadas por galerias e museus e assim apreciadas pelas gerações vindouras; quem visita as galerias, os museus, as universidades ou os grupos artísticos de Hong Kong e aprecia as suas coleções de arte, perguntará: afinal, de onde surgem todos estes artigos de coleção? Seja como for – excepto se for colecionador especializado ou artista – as suas peças de arte serão sempre compradas no mercado.

Afinal, o que será mesmo real no mundo da ostentação? Qual é a conclusão que se tira sobre um artista ou a sua obra? Após uma vida inteira a perseguir o sucesso, há alguma garantia de que se tenha atingido o grau de mestre? Haverá certezas de que uma obra vingue no mercado e se torne um clássico, resistindo ao tempo para usufruto das futuras gerações? Ou será que quem dispensar a confusão deste Mundo de Ostentação evita perseguir um título que, no fundo, é apenas vazio?

Serão muitos aqueles que atravessam esse mundo de ostentação? Ou serão mais aqueles que nele entram, sem contudo chegar a lugar algum?!

 

 

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