A visita de Xi Jinping, simbólica por comemorar 20 anos da transição de poderes, tem mais conteúdo político e foco estratégico do que a simples leitura do seu discurso revela. O novo ciclo que se anuncia já não surpreende, mas a narrativa dos Media chineses coloca em Macau os holofotes, de uma forma inédita e que em muito ultrapassa o aniversário e a própria presença do líder. Por oposição a Hong Kong, mas também pela sua própria identidade, Macau é agora exemplo, para consumo interno e externo. Para o bem e para o mal, com consequências incontornáveis.
Pensar em Macau para substituir Hong Kong, Shenzen ou Cantão, seja em que dimensão for, é uma ilusão que menospreza a dimensão económica, intelectual e política dessas centralidades. Percebem-se, naturalmente, os limites de Macau para competir nos serviços financeiros – atualmente em voga no debate – mas há oportunidades de nicho e sentido estratégico; nesse, como noutros pilares de diversificação. O ponto é outro: por mais baixo que seja o efeito deste ou daquele novo setor no PIB, o Governo Central mostra-se mesmo decidido em alterar o perfil do emprego e a identidade sociopolítica da Região.
A Grande Baía, “Uma Faixa uma Rota” e a plataforma lusófona há muito se anunciam como caminhos para a diversificação económica e renovação da identidade local. O que é novo é que as vozes mediáticas do regime o assumam de forma tão clara e repetida para o auditório nacional. O discurso de Xi Jinping tem de ser lido à luz dessa nova centralidade.
Macau é “vendido” como prova de que o princípio “Um País, Dois Sistemas” funciona, como Pequim o interpreta. Nesse discurso, o regime conclui e os Media chineses propagam que o problema não está no sistema, mas sim nos conflitos orquestrados em Hong Kong e – já agora – Taiwan.
É mais uma ilusão, como tantas outras. Mas é a que vamos agora viver. E isso moldará claramente a próxima década.
* Administrador do Global Media Group e Plataforma Macau
PAULO REGO 03.01.2020
