O Brasil transforma-se num caso mundial de estudo; infelizmente, pelas piores razões. O gigante lusófono talhado para ser líder regional e player mundial; uma das mais pujantes economias emergentes, com escola política alternativa – dita da esquerda internacional – encolhe de forma bruta e deita por terra o ego de quem quis e foi ouvido no palco das nações.
O fantasma da recessão corrói a classe média; o analfabetismo e a literacia estagnam em níveis terceiro-mundistas, a distribuição da riqueza não se fez… E Inácio Lula da Silva, herói metalúrgico da ascensão trabalhista, arrasta-se na lama da corrupção, numa luta crua e visceral pelo poder. Não há margem para ilusões; não há sonho nem ideologia.
É óbvio que por trás das manifestações de rua há uma direita conservadora, que manipula factos e discursos, irritada com as fatias que lhe escapam do orçamento de Estado, mas também com as conquistas sociais, multiétnicas e outras que marcam os consulados de Lula e de Dilma Rousseff. Mas a corrupção está lá; não foi inventada por maquiavelismos políticos. Resta o benefício da dúvida; o PT pode até ser menos responsável do que quem lá estava antes, ou de quem virá depois; mas a trapalhada do regresso de Lula ao governo – haja ou não veto do Supremo Tribunal – cheira mal e retira-lhe todo o glamour que um dia o levou do subúrbio industrial de São Paulo aos corredores do poder em Brasília.
A tese do impeachment ganha fôlego e sentido; metade do país está na rua, percebendo que Dilma está assustada; a outra metade assiste, atónita e incrédula, ao fim de um ciclo no qual acreditou para além da sanidade. Mas há mais que se vai neste caudal: a China e a Índia tinham no Brasil um dos poucos aliados ocidentais contra a obsessão pela austeridade e a favor do investimento público, numa espécie de pacto internacional pelo crescimento. Agora Dilma canta baixinho; fá-lo para dentro e o seu cantar não tem graça. A questão não é moral, nem sequer de justiça. É da vida. A voz de Dilma não tem força para ser ouvida.