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“Na Nanomedicina a China lidera o mundo”

Natural de Macau, Leong Kam Weng foi agraciado com um Doutoramento Honorário pela Universidade de Macau (UM) no início de dezembro. É membro da Academia Nacional de Engenharia dos EUA e ocupa o 8.º lugar do Ranking Mundial de Cientistas de Engenharia e Tecnologia / Engenharia Biomédica 2024 pelo AD Scientific Index. Em entrevista ao PLATAFORMA, afirma que a falta de um hospital de alto nível tem impedido o progesso local na biomedicina. Mas a integração na Grande Baía pode resolver o problema

Carol Law

– Decidiu estudar Engenharia Química nos Estados Unidos. Porquê?

Leong Kam Weng – Sempre tive interesse em investigação académica e foi uma grande oportunidade de ir para o exterior. Essa oportunidade foi dada pelos meus irmãos e pela minha mãe. Tive sorte, por ser o mais novo. Na verdade, ninguém sugeriu que estudasse Engenharia Química, mas como tinha aptidão em Química e Matemática, escolhi Engenharia Química, uma área que considero mais prática.

Não fiz uma tese para a minha licenciatura, mas para o meu doutoramento, produzi uma tese relacionada com Síntese e Aplicações de Composto de Intercalação de Grafite, sobre um composto polímero. Naquela altura, era uma pesquisa relativamente básica para verificar se grafite poderia ser convertido de um isolante para um semicondutor. Depois, candidatei-me a investigação pós-doutoramento e tive várias ofertas. Quando fui para o MIT encontrar o meu futuro professor, achei que a pesquisa na qual estava a trabalhar tinha grande potencial e poderia ter um grande impacto na saúde humana, algo que me interessou bastante. Desde então, começando com o meu pós-doutoramento, toda a minha carreira académica tem-se focado na biomedicina.

– Realizou uma palestra na UM sobre edição de genes aprimorada por ultrassom, com foco no tratamento de Alzheimer. Em que outras pesquisas está a trabalhar?

L.K.W – Resumidamente, trato da administração de medicamentos e genes. Faço isso há 20/30 anos, a edição de genes é uma especialidade da administração de genes. A edição genética é uma das descobertas científicas mais entusiasmantes da última década. Outra direção importante é a medicina regenerativa. Mais especificamente, trata-se de tecido humano em chip, ou seja, usando células estaminais pluripotentes induzidas para gerar um tecido 3D que imita o tecido humano, o qual pode ser usado para modelação de doenças e triagem de medicamentos.

A área de investigação de tecido humano em chip é bastante ampla e pode ser especialmente adequada para a China. Atualmente, a pesquisa e o desenvolvimento (R&D) de novos medicamentos levam entre 12 a 15 anos, e o custo ultrapassa os 2.5 mil milhões de dólares americanos.

Macau agora tem uma grande vantagem, que é ter boas fontes de financiamento na Área da Grande Baía, e os professores em Macau podem obter recursos para fazer pesquisa [em biomedicina]”

Mesmo assim, o medicamento ainda pode falhar, e por isso o desenvolvimento de novos medicamentos é muito dispendioso. A razão para o fracasso é que muitas vezes é difícil encontrar a população mais adequada para testar o medicamento em ensaios clínicos. Agora existe uma tecnologia muito importante que permite usar células estaminais pluripotentes humanamente induzidas, uma tecnologia que deu o Prémio Nobel de Medicina ao cientista japonês Shinya Yamanaka.

Muitos podem fazer isto agora, incluindo os nossos laboratórios nos EUA. Só precisamos de 20 miligramas de sangue para gerar células-estaminais pluripotentes induzidas. A partir dessas células, é possível gerar qualquer tipo de célula, e a partir dessas novas células, é possível gerar um tecido 3D que imita tecidos humanos. Com esse tecido humano podemos então testar a sensibilidade e eficácia do medicamento, e realizar muita pesquisa biológica.

– Por que é que o tecido humano em chip é particularmente adequado para a China?

L.K.W – Acredito que, com base nos dados que recolhemos nos últimos anos, 80 a 90 por cento dos medicamentos na China são importados. A China precisa definitivamente de desenvolver os seus próprios medicamentos e, na minha opinião, esta tecnologia de tecido num chip pode ter um grande impacto no desenvolvimento de medicamentos.

O tecido humano em chip não pode substituir completamente estudos em animais, mas é muito melhor do que a cultura celular que usamos agora. A cultura celular é 2D, mas as células do nosso corpo são 3D. Usar esse tipo de tecido para fazer cultura celular será muito melhor. Embora não possa substituir completamente estudos em animais, tem maior poder preditivo.

Outra grande falha no desenvolvimento de medicamentos atual é que é realizado em ratos, coelhos e cães. A reação nestes animais é muito diferente da dos seres humanos. Agora usamos células e tecidos humanos, o que é mais próximo da reação humana e tem maior poder preditivo. A taxa de sucesso pode ser um pouco maior, mas mesmo que seja apenas um pouco maior, já representa a poupança de um custo de desenvolvimento significativo.

Em termos de ciências biomédicas, a UM também tem uma desvantagem, que é não ter a sua própria faculdade de medicina e não poder cooperar com um bom hospital”

Agora que temos essa tecnologia, a China pode aplicá-la e desenvolver os seus próprios medicamentos sem estar restrita por importações, algo particularmente necessário para o país. No desenvolvimento de telecomunicações, por exemplo, a China saltou toda uma geração de linhas terrestres e de poucos telefones, para uma sociedade sem fios. Acredito ser possível fazer o mesmo neste caso, saltar muitas das etapas tradicionais no desenvolvimento de medicamentos e usar tecidos humanos em chip.

– Qual é o nível de desenvolvimento da pesquisa biomédica no interior da China?

L.K.W – O nível é bastante elevado. O âmbito da pesquisa biomédica é muito amplo e há muitas áreas de aplicação. Um delas é designada de nanomedicina, ou seja, encapsular medicamentos em nanopartículas, o que pode melhorar a eficácia dos medicamentos e reduzir a toxicidade. Na verdade, a China agora lidera o mundo na nanomedicina. Tanto em quantidade como qualidade, pode igualar os melhores do mundo. Quando trabalho com professores e alunos do interior da China, sinto que são muito diligentes e inteligentes.

– Como descreve o nível atual da pesquisa biomédica na Universidade de Macau?

L.K.W – É ótimo. Acho que os recursos são bons, as instalações são boas, a liderança é boa. Acho que a única coisa mais difícil é que ainda é uma área de pesquisa relativamente recente. Ainda é difícil atrair os melhores. Em termos de ciências biomédicas, a UM também tem uma desvantagem, que é não ter a sua própria faculdade de medicina e não poder cooperar com um bom hospital, o que torna as coisas mais difíceis. Mas com professores e alunos inteligentes, acredito que é uma questão de tempo até atingirem um nível mais elevado.

– O Complexo de Cuidados de Saúde das Ilhas será inaugurado em breve. Acha que a UM pode cooperar com este hospital?

L.K.W – Sim. Macau agora tem uma grande vantagem, que é ter boas fontes de financiamento na Área da Grande Baía, e os professores em Macau podem obter recursos para fazer pesquisa nesta área.

– Se Macau quiser progredir mais na pesquisa científica, quais são os próximos passos?

L.K.W – Pode ser necessário mais investimento em infraestruturas, por exemplo, em pesquisa biomédica, que requer muitos estudos em animais ou acesso rápido a materiais bioquímicos. Um melhor acesso a esses recursos facilitará e ajudará a acelerar a pesquisa biomédica.

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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