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“Temos que escolher uma especialidade de turismo médico em que queremos que a cidade se especialize”

O novo hospital no Cotai vai elevar a oferta e o nível dos cuidados médicos oferecidos na cidade, aponta Jacky Ho, Reitor da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de São José, em entrevista ao PLATAFORMA. No entanto, o especialista médico considera ser preciso usar um sistema híbrido de formação médica local e atração de profissionais no exterior para resolver questões de falta de recursos humanos. No que respeita ao desenvolvimento do turismo médico local, sugere que a cidade encontre uma área de foco e estabeleça mais parcerias com o setor hoteleiro

Nelson Moura

– O Complexo de Cuidados de Saúde das Ilhas, deverá entrar em funcionamento antes do final deste ano sob a gestão do Peking Union Medical College Hospital. Que impacto antevê que o hospital tenha nos serviços médicos da cidade?

Jacky Ho – O novo hospital faz parte da estratégia do governo local para expandir os serviços médicos disponíveis, não só em Macau mas na região. A cidade está muito bem posicionada em termos de turismo mas podemos também providenciar uma componente de serviços médicos que as regiões circundantes não oferecem com estas características.

Por exemplo, Macau tem vindo a focar-se na medicina chinesa tradicional e nós temos laboratórios dedicados a investigação de MTC e treino de profissionais na área, o que nos coloca numa ótima posição para nos alinharmos com as estratégias dão governo central.

“Se os prestadores de serviços de saúde locais […] conseguirem aproveitar estas vantagens e trabalhar com a indústria hoteleira poderão ajudar a cidade a elevar a sua indústria de saúde para um nível superior”

Ao mesmo tempo, o novo hospital vai ajudar a fortalecer os serviços médicos prestados para os residentes e não residentes da cidade. Como sabe, a procura por serviços médicos na cidade tem vindo. Crescer nos últimos 10 anos, e tanto o governo como a sociedade têm vindo a procurar maneiras de oferecer melhores serviços médicos na região.

Mas também crucialmente, o novo hospital pode trazer novos conceitos sobre como desenvolver tratamentos médicos no futuro. É verdade que o hospital será gerido numa parceria público-privada com uma entidade de renome no país, mas a qualidade e experiência que esta entidade pode trazer para Macau é uma grande mais valia.

Existem já também escolas médicas na RAEM, e no que toca ao treino de estudantes e médicos-estagiários este hospital irá permitir-lhes lidar com casos médicos mais complexos. Será um impacto muito positivo.

– E no que respeita aos desafios criados por este novo complexo no que respeita aos recurso humanos disponíveis?

J.H. – Os recursos humanos realmente são um problema, Macau tem sido uma zona de treino para profissionais locais como enfermeiras ou técnicos de laboratório.

O novo hospital será uma oportunidade para a sociedade perceber que Macau pode ser uma “escola” de profissionais médicos, não só para Macau mas para a região da Grande Baía. Claro que isto implica um investimento considerável e é preciso convencer as universidades e institutos de educação superior que o setor médico profissional inclui uma grande variedade de posições além de enfermeiros ou médicos, e que podem oferecer cursos para outras funções.

– Neste momento existe apenas um curso médico na Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau. O foco devia ser criar mais curso médicos locais ou em trazer profissionais médicos de fora que ajudassem a um desenvolvimento mais rápido do setor?

J.H. – No estágio inicial poderia ser uma abordagem híbrida. A procura por serviços médicos nunca para, é constante, por isso se estivermos à espera que as instituições locais produzam profissionais que possam corresponder às necessidades do mercado, será necessário um período de tempo de espera considerável. É esta a realidade.

“Deverá levar uns 30 a 40 anos antes de podermos dizer que podemos depender apenas dos proifssionais locais”

Uma combinação entre atrair profissionais médicos de outras regiões vizinhas como o interior da China, Hong Kong ou da região da Ásia-Pacífico e formação seria o ideal. Temos que ser realistas no que toca a resolver esta questão.

Depois de Macau estabelecer as fundações de um sistema de formação médica sustentável, então poderemos começar a considerar como levar os profissionais locais a formar outros futuros profissionais. Portanto, a primeira fase pode incluir a atração de profissionais do exterior, como Hong Kong fez há cerca de 150 anos. Sim, provavelmente deverá levar uns 30 a 40 anos antes de podermos dizer que podemos depender apenas dos profissionais locais, mas a verdade é que de momento não o podemos fazer.

– O desenvolvimento do turismo médico é um tema quente de momento, mas a verdade é que os próprios residentes locais muitas vezes se deslocam a Zhuhai ou Hong Kong para tratamentos médicos, principalmente tratamento especializado. Como pode a cidade transformar-se num destino atrativo se os próprios residentes não recorrem aos serviços locais?

J.H. – O governo tem vindo a mencionar o desenvolvimento da indústria de turismo médico local mas veja-se os países que investiram fortemente nesta indústria há já muitos anos como os Estados Unidos. Há pessoas que voam para os EUA para realizar cirurgias cardíacas, uma área que se tornou uma bandeira do setor médico do país. A Coreia do Sul focou-se mais em cirurgias plásticas, enquanto a Tailândia especializou-se em tratamentos de lazer e bem-estar.

Temos que escolher uma especialidade de turismo médico em que queremos que a cidade se especialize. Não podemos fazer tudo ao mesmo tempo. Com o novo hospital temos primeiro que atingir o objetivo principal de satisfazer as necessidades médicas dos residentes locais. Mas podemos também começar a pensar se existirá alguma área de turismo médico em que Macau se possa especializar.

Macau possui hotéis e resorts cinco estrelas de nível mundial. Poderíamos por exemplo oferecer tratamentos pós-parto na região em conjunto com tratamentos de lazer. Podemos também oferecer médicos de MTC, em acupuntura e outros tratamentos alternativos.

Temos também que falar de tratamentos médicos mais sofisticados, como tratamentos com o uso de células estaminais. De momento, este não é o foco principal porque países como o Japão têm vindo a oferecer tratamentos avançados e a investir muito dinheiro nesta área.

“Com o novo hospital temos primeiro que atingir o objetivo principal de satisfazer as necessidades médicas dos residentes locais. Mas podemos também começar a pensar se existirá alguma área de turismo médico em que Macau se possa especializar”

Não se trata apenas de um esforço governamental, mas de um esforço conjunto de universidades, institutos, e companhias farmacêuticas.

– Consegue antever um futuro em que os resorts e hotéis locais ofereçam estadias em parceria com instituições médicas locais?

J.H. – Já conseguimos ver um pouco disto. Algumas companhias privadas oferecem já tratamentos pós-parto em parcerias com hotéis locais. Isto é apenas o começo. Se os prestadores de serviços de saúde locais, não só hospitais, mas outras entidades conseguirem aproveitar estas vantagens e trabalhar com a indústria hoteleira poderão ajudar a cidade a elevar a sua indústria de saúde para um nível superior.

– Qual seria o foco principal deste desenvolvimento de turismo médico, o mercado do interior da China? Ou até países da Ásia-Pacifico?

J.H. – A região da Ásia-Pacifico poderia ser um dos alvos, mas a competição é elevada. Temos que ver que só nesta região temos a Tailândia, Taiwan, a Coreia do Sul. Se queremos competir a este nível temos que encontrar uma área médica em realmente podemos ser competitivos.

Estar a oferecer serviços semelhantes aos desses outros mercados não faz muito sentido.

Macau está apenas no inicio desta estratégia mas há áreas que podemos já começar a investigar, de maneira a posicionar a cidade dentro da indústria de turismo médico.

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