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Coronavírus pelos ares

António Bilrero

Um grupo de mais de 200 cientistas alertou a Organização Mundial de Saúde (OMS) de novas evidências de que o novo coronavírus se transmite pelo ar (aerossolização). A organização das Nações Unidas já reconheceu a existência dessas provas e recomendou medidas, tais como evitar espaços fechados e a necessidade do uso de máscaras. Essa é também a opinião de Ricardo Mexia, presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública portuguesa em declarações ao PLATAFORMA.

“A questão da aerossolização foi bastante estudada numa fase mais precoce da pandemia, quando se identificou a possibilidade de transmissão pessoa a pessoa. E a evidência que foi reunindo apontava para não haver uma particular transmissão por via aerossol. Entretanto, houve também evidências, seja com modelos ou com algumas experiências em laboratório, que apontaram para a possibilidade de as partículas se manterem em suspensão mais do que aquilo que se estava efetivamente a ponderar”, assinala Ricardo Mexia.

Para o especialista, essencial é saber “se a doença se espalha através de gotículas de maior dimensão, que são projetadas quando se tosse, espirra ou fala, ou se há essa aerossolização que leva a que o vírus possa permanecer no ar durante mais tempo”. 

“Por isso têm de se tomar mais cautelas e considerar que temos de ter uma maior preocupação naquilo que toca à ventilação dos espaços e não apenas a questão de distância de segurança entre as pessoas”, defende.

O médico lembra que, na prática, tem-se “assistido é a uma evolução do conhecimento científico de uma forma muito rápida”. 

“Esta é mais uma situação que, eventualmente poderá vir a apontar num determinado sentido. Se assim for poderá haver aqui um reforço de um conjunto de questões que têm a ver precisamente com o aumento da ventilação para reduzir o potencial de disseminação da doença e a utilização de máscaras de uma forma mais generalizada”, defende.

Para o especialista, “a situação da ciência tem evoluído de forma muito rápida e portanto, à semelhança do que já aconteceu com outras questões, aqui também pode haver uma evolução daquilo que é o conhecimento que se tem. Portanto, o essencial não é necessariamente a questão da carta. Mas sim a potencial evolução do conhecimento científico é que pode motivar essa mudança naquilo que são as recomendações do ponto de vista internacional”.

Já sobre o uso de máscaras, o clínico recorda que essa é “uma recomendação praticamente generalizada, que está em prática nos diversos nos contextos da OMS, incluindo em Portugal”. 

“Na prática há uma generalização da recomendação do uso da máscara. Essa situação já está mais ou menos acautelada. Agora o que pode mudar é que, mesmo em espaços em que as pessoas conseguem manter distanciamento físico, poderá ter de se utilizar a máscara por forma a reduzir o potencial de disseminação da doença”, diz. 

Todavia, o especialista julga que “a evidência ainda não é assim tão robusta que permita afiançar de forma tão positiva essa situação”. 

“Claro que gera preocupação e ao abrigo do princípio da precaução poderá motivar medidas mais amplas daquilo que é a recomendação do uso de máscaras, mas até ver a situação acaba por estar já enquadrada com as recomendações genéricas”, defende.

Ou seja, prossegue, “há motivos para reavaliar aquilo que é a evidência disponível e eventualmente reforçar algumas das medidas que já estão a ser colocadas em prática. Julgo que neste momento é isso que deve ser feito e, particularmente nos contextos em que a doença tem uma expressão muito relevante, eventualmente ponderar uma adoção mais abrangente daquilo que são estas medidas”.

Já sobre críticas que apontam para um acerta rigidez da OMS, Ricardo Mexia admite, mas relativiza lembrando que isso acontece em outras organizações, nomeadamente em Portugal.

“Sabemos que a OMS é uma organização pesada e que tem obviamente uma reação que por vezes não é tao ágil como seria desejável, ou como seria o ideal. Mas isso é verdade para a OMS como para outras organizações, como também acontece m Portugal, por exemplo. Mas, perante uma evidência que fosse inequívoca, provavelmente a OMS teria uma maior facilidade em adotar essas medida”, afirma.

E deixa um exemplo: “Em relação a um conjunto de medicamentos que foi sendo proposto ou identificado com potencial para intervenção no caso da covid-19, a OMS foi célere a adotar ou rejeitar essa adoção. Ou seja, a rapidez na resposta também depende da robustez da evidência. Neste sentido, esta questão da aerossolização, já há longo tempo que tem vindo a ser discutida. A evidência não é inequívoca nesse sentido e, portanto, temos também de ter isto em atenção”.

OMS admite transmissão pelo ar 

A OMS já admitiu haver novas provas de que o novo coronavírus se transmite pelo ar e recomendou medidas como evitar espaços fechados e uso de máscara.

Depois de um grupo de 239 cientistas ter alertado para essa possibilidade numa carta aberta, em conferência de imprensa esta semana Benedetta Allegranzi, especialista da OMS em prevenção e controlo de infeções, reconheceu que há novas provas sobre a matéria e que é preciso estar atento para perceber as implicações e precauções a serem tomadas.

“A transmissão pelo ar é uma das formas de transmissão, é importante adotar medidas para evitar essa transmissão. Daremos mais informação assim que estiver disponível”, disse também Maria Van Kerkhove, epidemiologista e uma das responsáveis na OMS pela luta contra a pandemia do novo coronavírus, que provoca a doença covid-19.

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