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Atritos não param negócios

Carolina de Ré

A pandemia do novo coronavírus e os atritos diplomáticos entre o Brasil e a China parecem estar independentes das relações económicas entre os dois países. 

Em abril, o mercado chinês suportou o resultado positivo da balança comercial brasileira, período em que o volume exportado pelo país sul-americano para a China cresceu 30,9 por cento em relação a igual mês de 2019, segundo os dados do Indicador de Comércio exterior (ICOMEX), divulgados em maio pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

No mês passado, o Ministério da Economia brasileiro informou que a balança comercial do país registou um saldo positivo de 6,7 mil milhões de dólares. “A dependência das exportações das commodities e, em especial, do setor agropecuário traduz-se na crescente importância da China na folha de exportações do Brasil. Em abril, o volume exportado para a China cresceu 30,9 por cento em relação a igual mês de 2019 e 28,2 por cento, para o restante da Ásia. Para todos os outros mercados (…), o volume exportado recuou, seja na comparação mensal, seja no acumulado do ano até abril”, sustentou o relatório do ICOMEX.

Na comparação entre os dois primeiros quadrimestres, de 2019 e 2020, a subida das exportações brasileiras para a China foi de 8,1 por cento, segundo o mesmo relatório da FGV. Já as importações de produtos chineses ao Brasil aumentaram 1,1 por cento no mesmo período.

Atritos diplomáticos durante a pandemia

O relacionamento comercial entre as duas nações contraria projeções da Organização Mundial do Comércio (OMC), que no final de março projetou uma queda nas trocas comerciais globais de até 30 por cento em 2020.

No último dia 23 a divulgação de um vídeo sobre uma reunião ministerial convocada pelo Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, no contexto de uma investigação sobre uma alegada interferência política do Chefe de Estado na Polícia Federal, correu o risco de se transformar num novo capítulo público de atrito bilateral.

O problema foi evitado porque o juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, que autorizou a divulgação das imagens desta reunião do Governo brasileiro, suprimiu trechos em que os participantes da reunião se referiam de modo pejorativo, segundo fontes que viram o material na íntegra, ao mencionar o líder chinês Xi Jinping e o Partido Comunista Chinês.

No entanto, num trecho divulgado, o ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, comentou: as exportações brasileiras continuam porque “a China é aquele cara que você sabe que você tem de aguentar. Para vocês terem uma ideia, para cada um dólar que o Brasil exporta para os Estados Unidos, exporta três para China”.

Após a divulgação do vídeo desta reunião, a embaixada da China divulgou uma nota nas redes sociais afirmando que “a China e o Brasil são parceiros estratégicos globais (…) e que a parceria bilateral na área económica e comercial sempre tem sido norteada pelo princípio do respeito recíproco, benefício mútuo e cooperação ‘win-win’”.

Pragmatismo chinês

Túlio Cariello, membro da Rede Brasileira de Estudos da China (PBCHINA), considerou que estes atritos não têm efeitos sérios nos negócios bilaterais porque a relação Brasil-China está voltada para a agenda económica.

“De forma geral, a relação ainda é muito pautada na parte comercial, de investimentos e de empréstimos. É uma relação muito económica e este tipo de questão diplomática não tem grande efeito, principalmente porque a China sabe separar as coisas e não quer prejudicar os investimentos no Brasil nem deixar de comprar determinados produtos de que precisa”, afirmou.

E concluiu: “Existem fronteiras que não devem ser cruzadas sob pena de ferir o pragmatismo da relação. Alguns debates em relação a China não vão ter nenhum resultado prático. A China tem um poderia económico muito grande. O soft power chinês é basicamente económico”.

Para o advogado José Ricardo dos Santos Luz Junior, CEO do Lide China, um grupo de líderes empresariais fundado em 2013, também há uma separação de águas: “A China tem uma atuação antes de tudo, pragmática. Os chineses são muito pragmáticos e é uma relação estabelecida na base da confiança”.

O advogado lembrou que as relações entre os dois países pareciam caminhar para um momento melhor após uma visita de Bolsonaro à China em outubro do ano passado, quando houve um gesto de confiança por parte dos chineses em relação ao Governo brasileiro.

Este gesto, segundo Santos Luz Junior, foi protagonizado por duas petrolíferas chinesas que num prazo muito curto, a pedido de Pequim, entraram como sócias de um consórcio liderado pela estatal brasileira Petrobras e venceram um leilão para exploração de petróleo no Brasil.

“Estávamos em uma toada muito positiva em relação à China, mas este momento de pandemia teve todos estes pronunciamentos do deputado federal, do ministro da Educação e até mesmo do ministro das Relações Exteriores. Parece que a política externa brasileira em relação à China não está clara, está muito confusa (…) O Brasil quer fazer negócio com a China, mas não entende quais são meandros da política externa”, avaliou o advogado.

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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