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Prioridade nas creches é pouco

Mais de quatro mil famílias receberam, no ano passado, subsídios do Governo destinados a agregados vulneráveis. O Instituto de Ação Social desconhece, no entanto, quantas crianças estão em situação precária. A partir deste ano, as famílias carenciadas passam a ter prioridade nas creches subsidiadas pelo Executivo. 

As creches apoiadas pelo Governo vão passar a ter de dar prioridade a crianças em situação de risco, a partir deste ano, ao abrigo do novo “regime de admissão prioritária das crianças de famílias em situação vulnerável nas creches”. O mecanismo criado pelo Executivo tem como destino as crianças com idade inferior a três anos inseridas em famílias economicamente carenciadas – monoparentais, com membros portadores de deficiência ou doenças crónicas -, cujos rendimentos correspondam aos requisitos do Instituto de Ação Social (IAS). O académico Leung Kai Yin elogia a medida do Executivo, mas defende que a chave está em garantir que as crianças têm acesso às mesmas oportunidades que as que estão numa situação económica mais benéfica. Só assim, insiste, é possível quebrar o ciclo de pobreza que normalmente afeta as famílias geração após geração.

Leung alerta que, de acordo com as análises sociológicas, as famílias pobres não enfrentam só o problema da falta de dinheiro, mas também de um ciclo de pobreza. “Mesmo que as crianças tenham acesso às mesmas escolas, as famílias não conseguem suportar os custos de atividades extracurriculares, como tocar piano, aulas de futebol, viagens ao estrangeiro, entre outras coisas. Academicamente, dizemos que têm falta de oportunidades de vida”, realça. 

A teoria, desenvolvida pelo sociólogo alemão Max Weber, explica como as oportunidades que cada indivíduo tem – normalmente relacionadas com a condição económica – podem determinar e contribuir para melhorar a qualidade de vida. “As oportunidades, neste caso, têm que ver com a possibilidade que cada um tem no acesso aos recursos tangíveis – como a alimentação, roupa e casa – e intangíveis – tais como educação e saúde”, explica o académico.

É por isso que o professor de Serviço Social, do Instituto Politécnico de Macau, elogia o regime criado pelo Governo, mas ressalva que é insuficiente para tirar as crianças da pobreza. “O Governo devia ter novas ideias. Podemos arranjar formas de ajudar as famílias desfavorecidas a poupar dinheiro e a investir depois. Esse dinheiro permitiria às crianças ter acesso a atividades extracurriculares e aprenderem no estrangeiro”, sugere. 

Segundo o IAS, Macau tem 54 creches. As 37 que são subsidiadas pelo Executivo já procuravam dar prioridade às crianças desfavorecidas. Mas, a partir deste ano, essa prioridade passa a ser obrigatória no caso dos estabelecimentos de financiamento público. Em resposta ao PLATAFORMA, o IAS avança que, só em janeiro deste ano, o Governo gastou cerca de 18 milhões de patacas em subsídios para creches.

Os encarregados de educação tiveram até 9 de fevereiro para inscrever os educandos. O Instituto de Ação Social recebeu 55 pedidos, e irá divulgar os resultados até dia 10 de abril. 

“Em relação aos pedidos avaliados como qualificados, o IAS irá proceder ao encaminhamento das crianças no sentido de atender, na medida do possível, à preferência manifestada pelos encarregados de educação quanto às opções de creches”, lê-se no comunicado do IAS. 

O instituto realça que os encarregados de educação “devem estar atentos” às informações divulgadas pelas creches para inscreverem as crianças nos prazos indicados. “O não cumprimento das formalidades necessárias à matrícula será considerado como desistência da vaga”, avisam. Quanto às restantes crianças, lê-se no mesmo comunicado, os encarregados de educação vão poder matriculá-las nas creches subsidiadas durante o período normal de inscrições, que decorre em abril e maio.  

Em resposta ao PLATAFORMA, o IAS diz desconhecer quantas crianças estão em condições precárias. “Aquando da inscrição, os encarregados de educação não necessitam de declarar a sua situação pessoal e familiar, por isso, não é possível ao IAS saber o número das crianças em situação vulnerável”, lê-se na resposta enviada ao jornal.

Dados do mesmo departamento a pedido do PLATAFORMA, mostram que, em 2017, 4.118 famílias receberam subsídios regulares, designadamente 593 eram monoparentais, 502 tinham membros com deficiências e 1.565 tinham familiares com doentes crónicos. 

Para que possam ter acesso ao regime especial lançado este ano pelo Governo, as famílias têm de obedecer a alguns requisitos. Entre os quais está o rendimento mensal do agregado familiar que varia em função do tamanho. No caso de uma família com três membros, por exemplo, não pode exceder as 25.625 patacas mensais. 

As 37 creches subsidias pelo IAS vão reservar cerca de cinco por cento das vagas disponíveis às crianças em situação precária, o que corresponde a 388 vagas, muito acima dos 55 pedidos recebidos pelo instituto. 

O organismo do Governo explica como funcionaria caso o número das candidaturas qualificadas fosse superior às vagas de admissão prioritária. “Seriam admitidas, em primeiro lugar, as crianças provenientes dos três tipos de famílias em situação vulnerável que vivem apenas com os seus pais e, em segundo lugar, as crianças sorteadas entre as restantes. Em relação às não selecionadas por sorteio, serão classificadas numa posição de prioridade na lista de espera da inscrição”, esclarece.

O instituto refere ainda que, até dezembro do ano passado, havia mais de dez mil vagas nas creches locais. Destas, cerca de 8200 eram asseguradas pelas instituições subsidiadas pelo Executivo. Ainda sem dados relativos a 2017, o IAS refere que, em 2016, perto de cinco mil crianças estavam em lista de espera para creches. 

O instituto reitera que, com base nas candidaturas apresentadas pelos encarregados de educação nos últimos anos, “é previsível” que seja necessário aumentar o número de vagas nas creches entre mil a 1500, até 2022, sendo que o número concreto dependerá da população nascida a cada ano. O IAS estima que, até 2022, o número de vagas disponibilizadas pelas creches representará 55 por cento do número das crianças com idade inferior a três anos.

Este ano, está prevista a abertura de quatro creches que deverão garantir perto de mil vagas. 

Catarina Brites Soares  23.02.2018 

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