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Nem cheques, nem vales

Fernando M. Ferreira

O contexto das próximas Linhas de Ação Governativas não é fácil: o cenário externo continua a deteriorar-se com tensões comerciais renovadas entre os Estados Unidos e a China, e uma economia global no risco real de uma recessão. Internamente, o jogo ainda procura o seu novo equilíbrio e a diversificação económica tarda em sair do plano das intenções para o terreno das realizações.

É neste contexto que se torna fundamental repensar prioridades. E, com urgência, repensar a dependência de medidas como os cheques pecuniários e os vales de consumo.

Há um princípio de justiça social que não pode continuar a ser ignorado: não é aceitável que o modelo atual – igualitário, mas não equitativo – falhe em reconhecer as desigualdades reais da sociedade, distribuindo recursos públicos sem qualquer critério de progressividade; os decisores devem poupar com quem não precisa e dar mais a quem realmente necessita desse apoio.

Mas estas ferramentas tornaram-se práticas recorrentes em momentos de pressão económica ou social – basta lembrar o plano dos vales de consumo durante a pandemia. Aceito que regressem num plano de curto prazo, mas com o passar do tempo perdem o efeito excecional e deixam de ser resposta.

Distribuir dinheiro não é, por si só, uma estratégia de política económica. E muito menos o é numa região com um modelo económico altamente dependente de um único setor. Com a possibilidade de uma recessão global a pairar, é imperativo que o Governo abandone a ilusão de que o consumo interno financiado por cheques resolve os problemas de fundo da economia local.

A alternativa é clara: investimento público com visão e critério. O que Macau precisa — e os residentes esperam — são medidas que reforcem a economia real, que apostem na inovação, que criem oportunidades de emprego qualificado, que diversifiquem as fontes de receita pública e que preparem Macau para resistir aos ciclos externos.

É compreensível que haja pressão por medidas imediatas. O perigo está à espreita e todos querem medidas instantâneas – os cheques e vales de consumo podem ajudar a aliviar o choque e são populares, mas não são estruturais. O que se espera destas LAG é mais ambição: que não se limitem a gerir expectativas, que assumam o investimento público como instrumento de transformação económica e que reforcem a confiança de quem vive, trabalha e investe em Macau. Se Macau quer resistir, não pode continuar a apenas distribuir. É preciso investir.

* Editor-chefe do PLATAFORMA

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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