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Excursões não resolvem falta de turismo em Macau

Viviana ChanViviana Chan

O regresso das visitas de grupo não resolve a crise turística, explicam membros da indústria ao PLATAFORMA. Na sua opinião, as restrições pandémicas continuam a ser o grande entrave à recuperação. Há interesse em explorar o Sudeste Asiático no futuro, mas os guias locais não têm “formação suficiente”. Por outro lado, a língua portuguesa deixou de ser aposta: apenas dois guias turísticos são proficientes e têm mais de 70 anos

As excursões em grupo e a emissão de vistos eletrónicos para visitantes do Continente voltam a Macau no início de novembro, como anunciou o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng. A notícia, porém, não teve grande impacto na indústria, conforme averiguou o PLATAFORMA. As novas medidas entrarão em vigor em Guangdong, Xangai, Jiangsu e Fujian, esperando que a média diária de turistas ronde os 40 mil.

O presidente da Associação da Federação da Indústria e Comercial de Turismo, Leng Sai Wai, afirma que as novas medidas não significam uma recuperação total da indústria.

Segundo o responsável, “devemos estar mais atentos às mudanças nas medidas de prevenção epidémica no Continente”, pois “não se trata apenas da vontade em visitar Macau, mas sim da possibilidade destes turistas o fazerem e se existe isolamento obrigatório”.

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O líder associativo olha para o recente surto em Zhuhai para dar o exemplo, alertando que os próprios residentes de Macau podem não conseguir regressar à RAEM caso estejam num local afetado pela pandemia de Covid-19. Tal também se aplica aos turistas, comenta, ao dizer que a indústria está “pouco otimista” face a este relaxar das restrições.

LONGE DO RESTO DO MUNDO

Leng Sai Wan explica que a recente alteração nas restrições pandémicas em Hong Kong revitalizou a sua indústria de transportes. “Lemos notícias sobre a contratação de novos funcionários por parte da Hong Kong Airlines e concluímos que as mudanças [no controlo epidémico] fazem uma diferença gigantesca para a economia da cidade num curto espaço de tempo. Macau depende largamente do consumo de fora. Não é capaz de sobreviver apenas com a circulação de capital interno. Precisamos de turistas”, defende.

“Quem vem do Interior tem direito a uma oferta de ‘dois pelo preço de um’, reduzindo o preço original para 200/300 patacas – bastante inferior às regiões vizinhas. O problema não é a falta de interesse em Macau, mas sim o facto de a cidade estar cada vez mais isolada pelo combate epidémico”, Leng Sai Wai, presidente da Associação de Federação da Indústria e Comercial de Turismo.
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Analisando o combate pandémico nos últimos três anos, Leng Sai Wai acredita que Macau está “desligada” do resto do mundo. “Já não existem ligações de ferry entre Macau e Hong Kong e a capacidade dos autocarros da ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau foi reduzida significativamente. Não só existem poucos horários como dependem de marcação prévia. Já não contamos com as visitas de Hong Kong”, enfatiza. “A única fonte de visitantes é o Interior. Contudo, de acordo com a política atual, Macau ainda tem um longo caminho a percorrer”, vaticina.

A economia local está em declínio desde o início da pandemia, com o PIB a descer 56,3 por cento em 2020, segundo a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC). Algo que “prova que as atuais medidas de prevenção epidémica são altamente prejudiciais para a nossa economia. Caso Macau mantenha uma atitude cautelosa, acabará numa posição altamente vulnerável”, lamenta.

EXCURSÕES CONTRADIZEM POLÍTICA DE COVID-19

Leng Sai Wai ainda vai mais longe, argumentando que as excursões em grupo contradizem as atuais medidas de controlo epidémico em Macau. O mesmo diz que estas viagens implicam ajuntamento que, só por si, facilitam a propagação do vírus. “A atração por estas excursões é o seu custo reduzido ao juntar 40/50 turistas para alugar um autocarro. Trata-se de uma economia de escala. Mas juntar estas pessoas num autocarro não contradiz o objetivo de prevenção pandémica?”.

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O líder associativo indica também que os preços dos hotéis estão em baixa. “O preço de uma noite num hotel de cinco estrelas é de apenas 400/500 patacas. Quem vem do Interior tem direito a uma oferta de ‘dois pelo preço de um’, reduzindo o preço original para 200/300 patacas – bastante inferior às regiões vizinhas”, enfatiza.

“O problema não é a falta de interesse em Macau, mas sim o facto de a cidade estar cada vez mais isolada pelo combate epidémico”.

GUIAS TURÍSTICOS TORNAM-SE ESTAFETAS

A maioria dos guias turísticos acabaram por se tornar taxistas ou estafetas, à medida que a pandemia limitou a atividade turística nos últimos três anos. Vários dos motoristas de excursões migraram para o setor dos táxis e as restrições epidémicas “levaram a um crescimento gigantesco da indústria de entrega de comida ao domicílio”, diz Wai.

“No futuro poderemos abrir algumas excursões para o Sudeste Asiático, mas ainda não temos formação suficiente”, Chong Wai Kit, presidente da Associação de Promoção de Guia Turismo de Macau.

“Escolhas feitas para sobreviver”, conta. No entanto, pensa que a abertura da cidade proporciona condições para regressarem ao percurso profissional pré-pandémico: “Se for possível voltar a trabalhar como guia turístico (…) acredito que o seu regresso não será um problema”.

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Sobre a dimensão da retoma das excursões, considera que a revitalização da indústria “não será possível de uma vez só”, já que antes havia 100 excursões por dia.

“Deve ser criado um plano para uma reabertura gradual”, propõe.

O presidente da Associação de Promoção de Guia Turismo de Macau, Chong Wai Kit, partilha com o jornal uma visão mais otimista. O responsável salienta que Macau contava com mais de mil guias turísticos antes da pandemia, número que entretanto desceu para 400.

“Se não fosse a retoma das excursões, o número não ia mudar. É melhor do que nada. Durante a Semana Dourada de 1 de outubro sentimos mais movimento. Apesar da média diária de entradas não sair das poucas dezenas de milhares, incomparável às 100 mil entradas antes da pandemia, o mercado sente alguma recuperação. As pequenas e médias empresas estão mais motivadas”, indica.

Chong Wai Kit diz ainda que a polémica lei de extradição em Hong Kong afetou gravemente as excursões nas regiões administrativas especiais. Ou seja, a seu ver, a indústria entrou em crise antes da pandemia.

Durante a pandemia, “o emprego de muitos guias turísticos foi garantido graças ao plano ‘Passeios, gastronomia e estadia para residentes de Macau’.

Muitos inclusive escolheram aprofundar os seus estudos e tirar partido deste contexto para melhorarem as suas qualificações. Lembro-me que durante a pandemia, para cursos de guias turísticos e formação especializada em património cultural no Instituto de Formação Turística foi preciso recorrer ao um sorteio para selecionar os alunos”.

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Chong Wai Kit afirma que itinerários focados em gastronomia, alojamento e turismo para locais tem um efeito positivo sobre a indústria.

“Antes recebíamos turistas maioritariamente do Interior, e visitávamos locais como as ruínas de São Paulo, o Templo de A-Má, a Praça do Lótus e resorts de casinos. Nem havia grande conhecimento sobre atrações locais populares entre a comunidade. [Neste novo modelo] podemos desenvolver rotas especializadas e mais tarde recomendá-las a visitantes”.

SÓ DOIS GUIAS TURÍSTICOS FALAM PORTUGUÊS

Embora se mantenha como uma das línguas oficiais de Macau, apenas dois guias turísticos falam português e ambos passam dos 70 anos de idade. Chong Wai Kit critica as autoridades de turismo locais, dizendo que não é dado o devido valor à formação de guias turísticos em várias línguas.

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“Entrei em contacto com os dois e ambos estão preocupados com a falta de talentos capazes de os substituir.” Reconhecendo que o mercado turístico em Macau continuará dominado por turistas individuais, é bastante provável que estas excursões tenham de ser alargadas a turistas estrangeiros.

“No futuro poderemos abrir algumas excursões para o Sudeste Asiático, mas ainda não temos formação suficiente”.

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