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Hong Kong e Cabo Verde no caso Isabel dos Santos

O procurador-geral da República (PGR) de Angola incluiu China e Cabo Verde como locais onde Angola poderá pedir apoio de cooperação judiciária para sustentar os processos contra a empresária Isabel dos Santos, suspeita de má gestão na petrolífera estatal Sonangol. 

“Vamos pedir ajuda onde existirem indícios de crime”, explicou Helder Pitta Grós, à margem de uma visita a Portugal, onde se reuniu com a homóloga, Lucília Gago. “Sim, Cabo Verde vamos ver”, disse o procurador, que admitiu incluir também pedidos a locais com legislação financeira opaca, como “Malta ou Hong Kong”.

“Quando há necessidade de recorrer à cooperação internacional temos de usar todos os instrumentos legais que existem e, portanto, Interpol, Europol e tudo o que for necessário iremos utilizar”, sublinhou Helder Pitta Grós. Até agora, garantiu que não recorreu a essas autoridades policiais: “Neste momento, ainda não o fizemos”, mas “quando for necessário faremos isso”.

Para o PGR angolano, Angola “está numa fase inicial de investigação aos factos que foram revelados recentemente”, referindo-se às suspeitas de desvios de dinheiro por parte da empresária angolana Isabel dos Santos. Por isso, “ainda não houve tempo suficiente para podermos explorar tudo”, referiu.

Em Cabo Verde, está em causa o uso de um banco de Isabel dos Santos, o Eurobic Cabo Verde, como recetor de 124 milhões de euros referentes a dividendos da petrolífera portuguesa Galp pela companhia Esperaza (15 por cento), propriedade da empresária e da Sonangol. A petrolífera angolana várias vezes insistiu na entrega da respetiva parte dos dividendos, mas Isabel dos Santos, só ordenou a transferência de Cabo Verde para Luanda, quando estava à frente da Sonangol. 

No caso de Hong Kong, o território chinês está indicado como um dos locais onde estão sedeadas parte das 94 sociedades criadas por Isabel dos Santos para iludir a origem do dinheiro que serviu para investir em empresas fora de Angola.

A PGR portuguesa anunciou na terça-feira ter aceitado um pedido de cooperação judiciária internacional por parte de Luanda, seguindo-se a abertura de processos contra dois dos arguidos portugueses no caso de má gestão da Sonangol, os ex-administradores da Nos Mário Leite da Silva e Paula Oliveira. Agora seguir-se-á o envio de novas cartas rogatórias por Luanda para pedir a abertura dos processos em Portugal e outras diligências, entre as quais o arresto dos bens da empresária. 

Nos últimos dias, Isabel dos Santos tem anunciado a alienação de todas as participações ou saída da gestão nas empresas portuguesas, desde a companhia de engenharia Efacec à operadora Nos, passando pelo Eurobic.

Na visita a Portugal, o PGR angolano admitiu que a justiça angolana não teria podido investigar a empresária Isabel dos Santos durante a liderança do pai, o ex-Presidente José Eduardo dos Santos, por pressão do poder político.

Antes e depois

Antigo vice-procurador-geral da República durante os últimos anos de mandato de José Eduardo dos Santos, substituído em 2017 por João Lourenço, Hélder Pitta Grós reconheceu que o sistema judicial mudou, com a nomeação de novos protagonistas que asseguram a independência da justiça em relação ao poder executivo.

Questionado se seria possível uma investigação criminal a Isabel dos Santos como agora sucede, visando entre outras matérias a alegada má gestão da petrolífera estatal Sonangol, Hélder Pitta Grós foi taxativo: “Não acredito. Porque nunca aconteceu nada e estes factos foram cometidos antes de 2017”. Para o PGR angolano, nomeado já por João Lourenço, o que mudou foi que “o poder político ficou mais aberto”.

A ação judicial contra Isabel dos Santos, na sequência de uma auditoria da consultora KPMG à gestão na Sonangol e após os resultados de uma grande investigação de um consórcio internacional de jornalistas, que incluem o Expresso e a SIC, teve início porque a empresária se recusou a esclarecer as dúvidas levantadas pela administração que lhe sucedeu em novembro de 2017.  O inquérito que foi agora convertido em processo-crime “não foi instaurado no sentido do simbolismo” de luta contra a corrupção, admitiu o procurador-geral.

“Aconteceu em parte provocado por ela, porque se tem aparecido quando houve esse inquérito talvez pudesse justificar algumas coisas que agora estão no processo-crime”, afirmou Pitta Grós.

Em resposta às acusações, Isabel dos Santos reafirmou a inocência e recordou que as consultoras contratadas quando estava à frente da Sonangol resultaram da necessidade de reorganizar o grupo petrolífero estatal, que, segundo a empresária, apresentava dívidas na ordem de 18 mil milhões de euros. 

No que respeita aos investimentos em Portugal, a empresária insistiu que “nenhum investimento realizado teve fundos de origem ilícita”, tendo “sido respeitados os procedimentos do Banco Nacional de Angola (BNA) no que se refere ao licenciamento de exportação de capitais”. 

“As empresas com as quais opero são legítimas, pagam impostos, e nenhuma empresa foi jamais condenada por atividade criminal”, escreve a empresária. Por isso, no seu entender, a “lei do repatriamento de capitais em Angola aplica-se a capital ilícito, ou seja, a fundos de proveniência criminal, e não se aplica a fundos lícitos, devidamente licenciados pelas autoridades”. 

Paulo Agostinho 31.01.2020

Exclusivo Lusa/Plataforma Macau

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