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Mudar de rumo

Os bastidores da crise em Hong Kong continuam envoltos num nevoeiro denso.  Em todo o caso, a gravação tornada pública esta semana de um encontro privado de Carrie Lam com um grupo de empresários trouxe alguma luz à questão. Não surpreendendo, ilustra a curta margem de manobra da situação em que Chefe do Executivo se encontra ou se colocou.  O “elevado grau de autonomia” ficou relegado para segundo plano em face daquilo que passou a ser enquadrado com um assunto do foro da “segurança nacional”. A divulgação da gravação poderá não estar dissociada da decisão anunciada esta semana por parte de Carrie Lam de formalmente retirar a controversa proposta de lei de extradição. Trata-se de um passo absolutamente necessário que devia ter sido dado logo após a primeira grande manifestação que juntou várias centenas de milhares de pessoas no dia 9 de junho. Encontrando-se entre a espada e a parede, Lam tem sobre si uma Espada de Dâmocles. A decisão de quarta-feira constitui uma condição necessária mas ainda insuficiente para que a crise profunda em que Hong Kong se encontra seja resolvida. É, no entanto, um gesto que, acompanhado de outros passos, pode abrir caminho para que este nó górdio possa começar finalmente a ser desatado. Urge colocar um ponto final a este ciclo vicioso de violência e abusos, sendo que todas as partes devem dar passos nesse sentido. A paz, o bom senso e a civilidade têm de regressar rapidamente às ruas e às estações de metro de Hong Kong.

As restantes medidas anunciadas por Lam são positivas, mas será importante ir ao encontro de uma outra exigência que,  segundo estudos de opinião, goza da amplo apoio da população: a criação de um comité independente de investigação dos incidentes e violência em que estiveram envolvidos polícia e manifestantes.

Todavia, além da urgência em agir no curto-prazo, será importante criar as condições para um caminho que, no médio-prazo, se traduza numa nova proposta de sufrágio universal (diferente da que foi rejeitada em 2014) e num pacote robusto de políticas sociais, com enfoque no acesso à habitação. 

Há ainda que ter em conta que a crise que vivemos não está apenas relacionada com questões económicas (desigualdades sociais), deficiências na governação local, a história colonial de Hong Kong, ou o contexto geopolítico (rivalidade China-Estados Unidos) associado ao aproveitamento por parte de forças externas.

A forma como tem sido implementado, nos anos mais recentes, o princípio Um País Dois Sistemas e a erosão do alto grau de autonomia são questões centrais. Algo correu mal na gestão política das questões de Hong Kong por parte do Governo Central e dos seus representantes na cidade vizinha, ao longo dos últimos seis anos. É preciso mudar de rumo.  

José Carlos Matias 06.09.2019

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