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Dificuldades de financiamento para grandes conglomerados

A atenção dos reguladores sobre grupos como Fosun e HNA faz prever menor disponibilidade de capital e uma redução da atividade internacional.

Os grandes conglomerados da China com ativos internacionais deverão encontrar maiores dificuldades em obter financiamento, e é provável uma redução da participação chinesa em empresas no exterior – em 2016, um valor de investimento direto externo total estimado em 94,2 mil milhões de dólares, segundo a consultora Baker McKenzie. Mas é cedo para antever o impacto do reforço da supervisão sobre estes grupos nas empresas por estes participadas.

Na última semana, foi conhecida uma investigação de iniciativa do regulador bancário chinês citando preocupações com “riscos sistémicos” decorrentes da atividade internacional de grupos como a Fosun, com investimento na banca, seguros e saúde em Portugal, ou HNA, investidora na transportadora portuguesa TAP.

A Comissão Reguladora dos Bancos Chineses (CBRC) diz-se preocupada com “grandes empresas” – que não nomeou – e com níveis de uma excessiva alavancagem, com reflexo no conjunto dos bancos nacionais e um possível impacto negativo, sobretudo, para as mais pequenas instituições financeiras. 

A imprensa internacional conheceu comunicações internas dos bancos e divulgou-as. Os bancos chineses são chamados pela supervisão a averiguar da exposição a quatro entidades: Fosun, HNA, Anbang e Rossonori Sport Investment Lux – um veículo financeiro envolvido na compra do clube de futebol AC Milan –, segundo conteúdo de emails acedido pelo Financial Times.

“A investigação da CBRC a um grupo de grandes empresas, incluindo HNA e Anbang, tem o propósito de reduzir os meios de financiamento de maior risco por via do mercado bancário paralelo da China. Poderá também estar ligada a lutas entre fações nas lideranças [políticas], embora seja difícil dizê-lo sem que haja um quadro mais claro”, diz ao PLATAFORMA Andrew Collier, antigo presidente do braço de investimento do Banco da China nos Estados Unidos e autor do livro “Shadow Banking and the Rise of Capitalism in China”, lançado no início deste ano.

O analista, proprietário da consultora Orient Capital Research, tem vindo a analisar a explosão dos mecanismos de crédito que sustentaram investimento público e privado da última década de alto crescimento na China, algumas vezes para projetos de infraestruturas gorados, e em grande parte dos casos assentes em operações financeiras não contabilizadas para efeitos de cálculo de endividamento. A chamada banca clandestina, ou paralela, inclui desde o microcrédito por instituições não-financeiras a produtos convencionais dos mercados, como obrigações e, cada vez mais, títulos de investimento estruturados a partir de dívida. Estima-se que a maioria dos últimos assente hoje nas carteiras dos bancos chineses.

A investigação em curso na banca, com medidas de diligência bancária que afetam empresas específicas e de forte atividade internacional, tem também vindo a ser associada por analistas e comentadores a divisões no alto aparelho comunista e também à vontade de algumas dessas fações de refrear operações internacionais para conter a saída de capitais do país e fazer estacar o percurso de depreciação do renminbi. Independentemente da motivação, Andrew Collier entende que o resultado será que os grupos apontados como possíveis factores de risco acabarão com menos dinheiro, ou dinheiro obtido de forma mais cara, para investir.

“É provável que qualquer destas empresas atualmente sob os holofotes encontre maiores dificuldades em obter capital, através de empréstimos bancários, mercados de ações ou de obrigações, ou através de financiamento paralelo com a venda de produtos de investimento estruturados a indivíduos e investidores institucionais”, afirma.

 Andrew Collier admite inclusivamente um cenário em que as empresas em causa, campeãs no mercado internacional de fusões e aquisições, venham a abdicar de parte do império que construíram nos últimos anos, sobretudo, na Europa e nos Estados Unidos.

“É possível, ainda que não seja certo, que sejam forçados a alienar alguns dos seus ativos internacionais, que poderão incluir participações em bancos. No entanto, não me parece provável que tal aconteça a curto prazo uma vez que se tratam de investimentos bastante públicos e valorizados, que [estas empresas] não quererão vender”, diz o analista.

Apesar da atenção do regulador sobre os riscos ao sistema financeiro colocados pela atividade internacional dos grupos identificados, Collier nota que “estas empresas não representam responsabilidades significativas no sistema bancário chinês”. “Contudo, são um símbolo da alavancagem excessiva que permitiu que muitas grandes empresas privadas e estatais se tornassem compradoras agressivas de ativos internacionais”, diz.

O analista entende também que a forte dinâmica de atividade internacional por grupos chineses “poderá esmorecer à medida que o capital se torne mais escasso, o que prevemos que que aconteça com um maior impacto dos custos de alavancagem”.

A China foi um dos países que mais contribuiu para o endividamento global recente, indicou quarta-feira o think-tank financeiro Instituto Financeiro Internacional, estimando o valor da dívida nominal chinesa, pública e privada, em 33 biliões de dólares no final do primeiro trimestre deste ano. Os níveis globais de endividamento atingem valores recorde de 217 biliões de dólar. 

Maria Caetano

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