Início » Novo ciclo ou mero ciclo de transição

Novo ciclo ou mero ciclo de transição

Paulo Rego*

Há mais de seis meses, quando assumi que Ho Iat Seng teria sérias dificuldades em renovar o seu mandato, a tese maioritária nos bastidores da política local era a de que o Chefe do Executivo continuaria, desde que aceitasse uma profunda remodelação dos secretários, conduzidos pela mão cada vez mais visível de Pequim. Entretanto, com o chamado novo ciclo, reforçou-se a convicção de que Sam Hou Fai traria uma equipa nova. Manteve-se sempre a dúvida sobre Wong Sio Chak; pelo estatuto que alcançou, pela relação de confiança com o futuro líder; e porque ele próprio dispôs-se a continuar: “Se for convidado, e a China quiser”. Hoje instala-se outra dúvida: sendo Sam Hou Fai inexperiente na governação, precisa – ou não? – do suporte de quem já navega nos meandros da Administração?

Várias fontes insistem que Wong muda para a Procuradoria; contudo, outras já admitem que fica onde está. Na última sexta-feira, o Macau Daily Times assumiu mesmo que, para além do Secretário para a Segurança, André Cheong deve continuar na Administração e Justiça; e Elsie Ao Iong nos Assuntos Sociais e Cultura. Entretanto, até já se fala na hipótese de Lei Wai Nong manter a pasta da Economia – o que seria ainda mais surpreendente.

Em breve se saberá o caminho escolhido perante esta bifurcação: se um naipe de novos secretários, que de facto sinalize uma mudança de ciclo; ou uma passagem suave e mitigada. No fundo, criando um ciclo de transição; e não realmente um novo ciclo

Continua a ser dominante o consenso em torno de uma profunda remodelação. E é nessa que mais acredito. Contudo, em bom rigor, ninguém terá hoje certezas sobre nomes tão bem guardados, até à última hora, como foi o de Sam Hou Fai. Surge agora é um novo racional que explica os nomes avançados pelo Daily Times: a inexperiência governativa de Sam Hou Fai. Ou seja, por melhor que se tenha preparado, do ponto de vista ideológico e dos apoios no Poder Central; não conhece a máquina administrativa; nunca exerceu cargos políticos; nem está habituado à gestão dos interesses locais. Essa é a chamada dúvida crudelis: se Alvis Lo Iek Long, O Lam, Kevin Ho, e outros… são ainda novos – e podem esperar – outros, sendo maduros, e da confiança da Sam Ho Fai – como Ip Sio Kai – não escapam ao problema da falta de experiência governativa. Nesse contexto, surge o medo da instabilidade, e a tentação de a minorar mantendo vários dos atuais secretários.

Sam Hou Fai regressou segunda-feira de Pequim, onde certamente trocou os nomes do seu futuro Governo. Pelo que em breve se saberá o caminho escolhido perante esta bifurcação: se um naipe novo de secretários, que de facto sinalize uma mudança de ciclo; ou uma passagem suave e mitigada. No fundo, montando-se um mandato de transição; e não um real novo ciclo.

Não abundam nomes capazes de desenhar um Executivo, novo e inexperiente, que ao mesmo tempo promova um novo ciclo e uma dinâmica de estabilidade. Por um lado, é muito difícil – quiçá impossível – que tudo mude, mantendo-se quase tudo na mesma; por outro, a manutenção dos secretários seria a confissão de que, afinal, o problema era mesmo o Chefe; o seu perfil e a sua performance. Finalmente, lendo o programa de Sam Hou Fai, em muitos aspetos positivo, percebe-se que não é só de secretários que ele precisa, mas também de muitos diretores novos – com novas ideias – para além de centenas de assessores, consultores, empreendedores e massa crítica de calibre internacional, capazes de executar o que lá está escrito; sob pena de se encalhar mais um mandato numa mera lista de ideias. Parece muito mais fácil – e eficiente – mudar logo a partir de cima. Assim haja quem saiba saltar para o futuro sem abanar o presente.

*Diretor-Geral do PLATAFORMA

Tags:

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!