As companhias de portos chinesas devem fazer investimentos criteriosos no âmbito da nova rota marítima da seda. O aviso é da Moody’s naquelas que poderão ser más notícias para as expectativas portuguesas.
A iniciativa das novas rotas da seda chinesas trará cada vez mais oportunidades de investimento para as companhias portuárias do país, mas estas devem ser criteriosas nos planos de expansão internacional numa altura em que apresentam altos níveis de endividamento e poucas oportunidades de aumento de margens e cash-flow num cenário de abrandamento do comércio mundial.
A agência de rating Moodys’s vê riscos numa postura demasiado agressiva e aconselha disciplina numa nota de análise que centra atenções sobre a atividade do grupo Hutchison Port – que gere os portos de Shenzhen e Hong Kong entre outros – do Shanghai International Port (SIPG) e do China Merchants Holding International – o grupo com maior investimento internacional e que, atualmente, enfrenta perspetivas negativas e se vê sob pressão financeira nos negócios aos quais se encontra associado.
“A iniciativa Uma Faixa Uma Rota vai aumentar as despesas de investimento com fusões e aquisições, mas esperamos que os operadores de portos chineses sujeitos a rating se mantenham seletivos nas respetivas decisões de investimento”, aconselha a agência que recentemente emitiu um aviso de potencial abaixamento da notação atribuída ao China Merchants. O grupo tem atualmente um perfil de crédito de risco moderado, com uma notação de Baa1.
O aviso à navegação de transporte surge numa altura em que Portugal reitera esforços para a atração de investimento internacional para o Porto do Sines. No final de Maio, o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, concedeu uma entrevista ao Diário do Povo, jornal oficial do Partido Comunista chinês, no qual manifestava o desejo de ver o país enquanto ponto no itinerário da nova rota marítima da seda promovida pelo Presidente chinês Xi jinping.
O chefe de Estado português destacou as potencialidade de Sines, cujo Porto é operado em concessão pela Port of Singapore Authority (PSA) até 2029, e cujos planos de expansão de capacidade, num investimento de 40 milhões de euros, ficam aquém do inicialmente pretendido. O atual governo português pondera a hipótese de lançar concursos para novos terminais que apoiem a expansão dos dois maiores portos do país, Sines e também Leixões.
Mas o contexto internacional não favorece atualmente grandes investimentos, e não o deverá fazer pelos próximos ano a ano e meio, reflete a Moody’s, sinalizando a situação que se verifica já nos portos chineses. Nos primeiros cinco meses deste ano, o investimento caía 20 por cento face aos valores de 2015, e numa situação que contrastava fortemente com a situação verificada até 2011 – ano que registou um crescimento do investimento em nova capacidade na ordem dos 30 por cento.
O abrandamento económico chinês e a perda de competitividade nas exportações têm restringido o crescimento do movimento de carga no transporte marítimo. O enfraquecimento global das economias – em particular, das economias dos países mais ricos – significa também que as exportações chinesas perdem clientes e que os portos do país gerem menos contentores. Em 2015, as 20 maiores economias do mundo expandiram-se em apenas 2,8 por cento e, este ano, o crescimento destas não deverá também ultrapassar os três por cento, estima a Moody’s.
Em paralelo, o movimento de contentores em portos chineses expandiu-se em apenas 4,2 por cento no ano passado, contra um crescimento de 12 por cento no ano de 2011. Já nos primeiros cinco meses deste ano, o volume de carga transportada não aumentou além de 2,2 por cento, no que é ainda assim um desempenho acima do esperado. No mesmo período, as exportações chinesas caíram 7,3 por cento.
No sentido inverso, as operações das companhias de portos chinesas também se vêem penalizadas pela queda das importações que resulta do abrandamento do investimento no país (cresceu em Maio num mínimo de cinco meses, a uma taxa de 7,4 por cento). A Moody’s antecipa maior abrandamento nas principais matérias-primas importadas pela China, o minério de ferro e o carvão.
Neste cenário, as empresas dos portos enfrentam também dificuldades em negociar aumentos nas taxas portuárias. O sector do transporte marítimo enfrenta atualmente uma situação de excesso de capacidade em relação à procura que deverá manter-se pelos próximos dois anos. As taxas de transporte marítimo têm vindo a cair acentuadamente: na ordem dos 43 por cento na linha marítima Xangai-costa ocidental dos Estados Unidos e de 23 por cento no transporte entre Xangai e a Europa.
A rentabilidade do sector irá manter-se fraca, e este tem vindo a reorganizar-se no sentido de uma maior concentração, exemplificada na recente fusão da Cosco com a China Shipping Container Lines. A Cosco, a maior empresa chinesa de transporte marítimo, poderá contribuir para um aumento da quota dos portos chineses face à concorrência de Taiwan ou Coreia do Sul. Ainda assim, alerta a Moody’s, as companhias portuárias irão assistir a uma maior concentração de riscos com a convergência dos seu clientes, as empresas de transportes marítimos.
Apesar de desaconselhar estratégias de expansão internacional agressivas, a agência de rating admite no entanto vantagens da atividade ligada à iniciativa Uma Faixa Uma Rota. “A expansão internacional irá também estabelecer melhores ligações entre os portos domésticos e internacionais, aumentando assim a rede internacional [das companhias portuárias], melhorando os níveis de serviço e favorecendo a lealdade dos clientes. Quando os projetos internacionais começarem a amadurecer, começarão também a contribuir para as receitas das empresas”, afirma a nota da Moody’s.
Maria Caetano