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Quatro dias de Wushu

Macau irá acolher um Encontro de Mestres de Wushu, entre 11 a 14 de Agosto, com o intuito de desenvolver a modalidade, captar turistas e atrair o interesse local pela prática. 

É a primeira vez que terá lugar no território, mas os organizadores esperam que se repita anualmente. A decorrer entre 11 e 14 de Agosto no território, o Encontro de Mestres de Wushu deverá atrair nomes como Wang Shiquan, Shi Yanzheng do famoso Templo Shaolin, Eddie Wu, Liu Suibin, Shi Yanjun e Lu Yijie, segundo indicou em conferência de imprensa o secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Alexis Tam.

O objetivo deste evento passa por “promover o wushu tradicional — arte marcial chinesa — e reunir os melhores heróis de wushu ao nível mundial”, conforme refere uma nota de imprensa do Instituto do Desporto (ID). Durante quatro dias, haverá atividades da modalidade nas suas várias vertentes, incluindo o wushu tradicional, demonstrações e instruções, demonstrações e experiências de dança do leão, um fórum, um espetáculo de wushu dos mestres chineses e ocidentais, além de uma competição de taolu. Haverá ainda campeonatos dos mestres chineses e ocidentais de sanda, um campeonato de danças de dragão e leão, e uma parada.

As atividades do evento serão gratuitas e terão lugar em diferentes locais do território, entre os quais se contam a Praça Tap Seac, o Pavilhão Polidesportivo Tap Seac, o Largo do Senado, a Praça da Amizade e o Jardim de Iao Hon.

Salientando que o wushu é um desporto que reflete “uma cultura tradicional do Património da China”, a nota publicada pelo ID refere ainda que “os quatro dias do desporto e turismo temático de wushu tradicional, incluem ainda atividades interativas que permitem a participação dos residentes locais e turistas para intensificar o conhecimento deste desporto tradicional.” Além disso, espera-se que “proporcione uma plataforma para comunicar com diversidade entre os entusiastas de Wushu para estudos e treinos, e, ao mesmo tempo, partilhar as suas experiências”.

Entre as várias delegações de diferentes países que deverão deslocar-se ao território, inclui-se a Portuguesa. Será uma seleção da Escola Shi-Si de Dança do Leão, Wushu Kung Fu e Tai Chi, liderada pelo treinador Diago Sant’Ana e composta pelos atletas Jorge Ramos, Francisco Madeira, Ana Ramos e Nuno Resende.

Em entrevista ao PLATAFORMA, publicada a 22 de Abril, o presidente do ID, Pun Weng Kun, recordou um evento que ocorreu há décadas na Piscina do Estoril, e que juntou dois mestres da modalidade, realçando a grande adesão do público. Tratou-se de um combate épico de kung fu, na Piscina do Estorll, que pôs frente a frente Ng Gong Yee — o mestre de Tai Chi — e Chan Hak Fu — o mestre do estilo Garça Branca —, em Janeiro de 1954. E referiu que a ideia de organização de um Encontro de Mestres de Wushu surgiu em função desse sucesso no passado. Na altura da entrevista, o presidente revelou ainda esperar “vários milhares” entre a audiência, tendo por referência outros eventos semelhantes organizados em diferentes países.

A importância da formação

O Wushu é uma modalidade desportiva de longa história e popular no território, também determinante na formação dos jovens de Macau, dizem dois dos seus mestres ao PLATAFORMA.

Traduzido à letra, wushu significa artes marciais e conta com mais de 300 estilos diferentes catalogados na China Continental. Na sua base, estão noções de respeito mútuo, humildade e espírito de equipa, conformem explicam Leong Chung Ling e Pun Keng Man.

Em vésperas do arranque do Encontro dos Mestres de Wushu, Leong Chung Ling— mestre de Sanda e Taolu e vice-presidente da direção da Associação Geral de Wushu de Macau — diz que espera que este evento venha a “desenvolver o desporto e o turismo, além de promover a modalidade”. Referindo-se ao wushu, Leong Chung Lingesclarece que “dentro deste há várias áreas de desenvolvimento e que já tem uma longa tradição, especialmente as danças do dragão e do leão, que têm uma grande história de implementação junto à população”.

Ainda assim, espera que o Encontro de Mestres de Wushu resulte “numa participação mais ativa e que abranja os diferentes escalões etários”, ao mesmo tempo em que venha a “captar também mais pessoas para praticar”, especialmente jovens. “Não é que haja falta, mas querem incrementar para atingir um patamar mais elevado”, garante.

O wushu goza de particular popularidade no território, sobretudo quando comparado com as outras modalidades desportivas. Realçando que Macau tem obtido boas classificações  internacionais, o mestre justifica que a associação, desde a sua criação nos anos 80, tem “começado de uma forma sistemática e organizada a desenvolver a área da competição”, garantindo que “as coisas começam a ter mais estrutura, em vez de ser informal, com a participação em campeonatos asiáticos e internacionais”.

Além disso, a criação da Escola de Wushu Juvenil de Macau, em 2007, veio também ajudar a conquistar mais praticantes. “É um canal que proporcionou uma grande divulgação junto dos jovens e conseguiu captar mais pessoas e mais jovens para poder ter essa possibilidade de contactar com esta modalidade”, diz.

Acresce a isso que o wushu abrange várias correntes, conseguindo, por isso, atrair diferentes camadas das população. “O Tai Chi é popular para as famílias”, diz, a título de exemplo.

E o wushu — nas suas diferentes correntes — tem chegado mais longe, sendo praticado amplamente também fora da República Popular da China, ainda que intrinsecamente ligado à sua cultura. “A República Popular da China tem feito grandes esforços pela divulgação internacional — vai fora do seu país, vai aos diferentes continentes e países, daí a sua adesão pelo mundo”, refere.

A festa dos dragões

A dança do dragão e do leão é uma das correntes mais populares. “Capta a atenção da população, muitas vezes porque há apresentações na rua. Os tambores, os leões têm cores bonitas e o ambiente é de festa”, justifica o mestre de danças do leão e do dragão e vice-presidente da direção da Associação Geral de Wushu de Macau, Pun Keng Man.

Os seus praticantes são, sobretudo, jovens. “É preciso força para aguentar as apresentações”, diz, acrescentando: “A Associação [Geral de Wushu de Macau] tem feito muita divulgação. Depois, as escolas primárias [algumas] incluem esta modalidade nas suas atividades extra-curriculares, chegando, assim, aos jovens.” Além disso, o próprio Instituto do Desporto organiza atividades durante as férias escolares com essa modalidade.  

E, tratando-se de uma atividade com uma história centenária, Pun Keng Man refere é “bastante solicitada quando há festas em Macau”. Assim, seja na abertura de estabelecimentos ou noutro tipo de cerimónias, a dança do dragão e do leão acaba por ser bastante requisitada. 

Sobre os princípios-base que norteiam o wushu, Pun Keng Man refere-se ao espírito de equipa. “É fundamental, por exemplo, nas danças de dragão, porque são assentes no grupo, estão várias pessoas envolvidas e isso desenvolve-se através do treino”, diz. 

Além disso, na base estão “outros princípios de respeito mútuo, tratar bem o próximo, atender ao bem estar comum”, e que se materializam na prática da atividade. Além disso, aprendendo-se uma certa competência, o wushu defende a “humildade”. “Poderia ter-se uma certa vantagem de combate com o próximo, mas, desde o início, ensinam aos seus discípulos de que esta prática não é para agredir os outros. Há que se ser humilde e tolerante perante o próximo, não aplicando as competências para se pôr numa situação de agressão para com o próximo”, declara. 

Por isso, indicam que há “toda uma formação” por detrás dos ensinamentos do wushu, e que vai além da mera prática física. “Há este espírito que querem formar — de personalidade positiva e de respeito pelo outro”, diz, acrescentando: “Para os praticantes, o mais forte e o mais respeitado não é aquele que tem uma técnica em termos de prestação motora, mas aquele que sabe respeitar o outro, que tem uma formação saudável em termos mentais.” 

Referindo que são estas as bases que pretendem passar aos jovens praticantes de wushu,  o mestre realça “o saber ser humilde e respeitar o outro”. E defende que estes são valores que querem, desde o início, incutir nos jovens. 

Leong Chung Ling acrescenta: “Esta filosofia/moral faz parte da cultura tradicional chinesa.” E é também, por isso, que os próprios pais incentivam os seus filhos à prática do wushu. “Os pais sabem que os seus filhos não vão aprender ensinamentos que os levem a ser fortes e a agredir o outro. Mas, pelo contrário, a formar a pessoa, de forma a que a pessoa tenha esta personalidade sublime de respeito pelo outro.”

A Associação Geral de Wushu é o organismo encarregue do desenvolvimento das artes marciais no território e foi criada em 1988 por Ho Yin, pai do anterior Chefe do Executivo, Edmund Ho. “Atualmente, há mais de 80 associações debaixo da alçada desta, com mais de 7000 membros e 20 árbitros de nível mundial reconhecidos pela Federação Internacional de Wushu, além de 20 árbitros locais”, conforme se lê na página da associação. “A associação organiza competições anuais, incluindo o Campeonato Junior de Wushu e a Competição Tai Ji.”

Ao longo de 20 anos, diferentes eventos de larga escala têm decorrido em Macau, incluindo o Campeonato Mundial de Wushu e o Campeonato Asiático de Wushu. A associação garante ainda “formação ao nível de Taolu e Sanda, bem como formações intensivas para amadores, de formar a melhorar as competências técnicas dos atletas”. Ao longo dos anos, as equipas da associação já ganharam mais de 151 medalhas. “O melhor resultado foi o segundo lugar no Campeonato Mundial de Wushu”, lê-se ainda. 

Nos eventos de larga escala organizados anualmente internacionalmente, as equipas da associação têm obtido “bons resultados”, além de ajudar “a promover Macau e a expandir a rede de contactos”. 

Da iniciativa do ID e da Associação Geral de Wushub de Macau, o Encontro de Mestres de Wushu é coorganizado pela Direção dos Serviços de Turismo, Instituto Cultural e Fundo das Indústrias Culturais, com o apoio da Federação Internacional de Wushu, Federação Asiática de Wushu e da Associação de Wushu da China. 

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Um evento “ambicioso”

Turismo, desporto e cultura. O Encontro de Mestres de Wushu, que terá lugar entre 11 e 14 de Agosto, é “ambicioso”, porque procura alcançar diferentes objetivos ao mesmo tempo, garante Lei Si Leng, responsável no Instituto do Desporto pela organização dos grandes eventos.

Haverá uma parada com um dragão movido por 200 pessoas, demonstrações ao ar livre, desafios para iniciados, competições para avançados e, até, expositores de produtos locais. O Encontro de Mestres de Wushu pretende atrair pessoas de fora, locais, fazendo crescer um outro tipo de turismo no território, ao mesmo tempo em que promove uma prática saudável. 

“Somos ambiciosos, por organizarmos eventos desta dimensão”, começa por dizer Lei Si Leng. “O nosso público-alvo não é só a população de Macau, mas também os turistas e o pessoal de fora do território”, assegura a responsável do Instituto do Desporto pela organização dos grandes eventos. 

Realçando que não se trata apenas de um evento desportivo, a responsável diz que, em torno do Encontro de Mestres de Wushu, incluem-se “atividades e promoção”, de forma a mobilizar mais população e visitantes. “Queremos fazer uma coisa que possa atrair pessoas de fora. Não temos só casinos e monumentos, temos também outras atividades”, diz, acrescentando: “Escolhemos organizar este evento nas férias, por ser uma altura em que os pais levam os filhos a viajar.” E, assim, esperam conquistar mais público. “Se gostam de wushu e sabem que há mestres internacionais a vir a Macau, as pessoas podem pensar em deslocar-se a Macau só por causa deste Encontro”, revela. Além disso, espera que seja “uma oportunidade” para os turistas — pais ou jovens — que sabem o que é o wushu, mas que nunca praticaram, vir em busca de conhecimento para saciar a sua curiosidade.

Assim, diz Lei Si Leng, há um duplo objetivo: “Por um lado, queremos atrair pessoas que gostam de wushu; por outro lado, fornecemos uma plataforma para este Encontro.” E, havendo adesão, a responsável espera que se transforme num evento anual. 

A responsável tem também esperança que se consiga captar um público internacional, que não fala chinês, mas se interessa pela modalidade, e que vem a Macau por conseguir comunicar mais facilmente e, assim, saber mais sobre o wushu. “Sabemos que há muitos fãs de outros países, mas que, se calhar, por causa da língua — não falam chinês — não sabem onde encontrar estes mestres; assim, nós fornecemos esta plataforma”, diz.

Paralelamente, espera que haja uma promoção da própria modalidade. “O nosso papel [Instituto do Desporto] é tentar promover e deixar a população saber a importância de praticar um desporto,” declara. 

Sem referir as suas expetativas no que toca ao número de visitantes esperados, a responsável afirma que este evento combina esforços de vários departamentos governamentais, sobretudo do Instituto do Desporto, da Direção dos Serviços de Turismo (DST) e do Instituto Cultural. E realça que a DST teve um papel muito importante na promoção do evento fora do território.

A modalidade no território

Conforme salienta Lei Si Leng, o wushu está bastante desenvolvido em Macau, daí que também se justifique a promoção da modalidade no território e o seu crescimento. “Não há muitos atletas profissionais em Macau. Toda a gente tem um trabalho de manhã e depois lá vai praticando. Antigamente achava-se que se praticam desporto, não conseguem ganhar dinheiro. É por isso que têm medo de seguir a carreira”, revela. Porém, já se notam mudanças de mentalidade, sobretudo em modalidades como o wushu. “Um atleta profissional pode ter um futuro brilhante. E o atleta pode aprender. Os pais já começam a aperceber-se da importância de praticar algum desporto, ao mesmo tempo em que vão à escola,” diz.

Assim, na definição do programa do Encontro de Mestres de Wushu teve-se em conta a necessidade de organizar demonstrações nas praças do território. “São sítios por onde as pessoas passam, não precisam de bilhete”, declara, esclarecendo que pretendem, assim, atrair também os que estão apenas de passagem. 

O evento é co-organizado com a Associação Geral de Wushu de Macau, mas, sendo diferente das competições tradicionais, exigiu algum diálogo com o Instituto do Desporto. “Para a associação, este evento é uma coisa nova, porque o objetivo era o de promoção e associação está habituada aos campeonatos tradicionais”, revela Lei Si Leng. Porém, chegou-se a um acordo, integrando-se no programa campeonatos de alto nível e para iniciados, permitindo acolher pessoas menos experientes na modalidade. “Consegue-se atrair fãs, mas também toda a população.” 

Entre os principais pontos do programa, a responsável destaca, além das demonstrações de rua e as competições para iniciados e avançados, a parada, que implica a dança de um dragão, com mais de 200 pessoas. “É uma grande coisa, que se inicia nas Ruínas de São Paulo”, diz.

Além disso, nos quatro dias do evento, representantes de oito empresas de design local, vão estar na Praça do Tap Seac, vendendo e exibindo produtos feitos no território, de forma a mostrar também “algo do que é feito” em Macau.

Garantindo que o objetivo é passar a organizar este evento anualmente, Lei Si Leng afirma que Macau tem condições para isso. “No wushu, podemos dizer que temos uma base boa no território para atrair outros a vir cá ver ou aprender”. 

Luciana Leitão

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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