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“O próximo passo será fazer estudos clínicos em Macau”

Fundada pelos portugueses Francisco Nogueira e Frederico Stock, a Glooma foi a grande vencedora do concurso deste ano da 929 Challenge, uma competição que visa fortalecer o intercâmbio comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. A startup desenvolveu uma luva que permite detetar o cancro da mama precocemente. Nogueira acredita que esta solução tem mercado na China. Falta agora realizar mais testes clínicos tanto em Portugal como na China, e possivelmente até num hospital público de Macau

Nelson Moura

– Como começa a Glooma?

Francisco Nogueira – Sou engenheiro biomédico de formação e sou filho de um pai médico e uma mãe enfermeira, portanto já estava ligado à área da saúde. No entanto, isto começou devido a um caso familiar, pois a minha prima Filipa foi diagnosticada com cancro da mama quando tinha 39 anos. Quando ela sentiu algo no peito após fazer a autopalpação não foi logo ao médico, só decorridos três meses quando o nódulo ainda não tinha desaparecido. Entretanto, foi falar com o meu pai, que é médico de clínica geral e que a encaminhou imediatamente para um especialista. Só depois de lhe fazerem um exame clínico mamário foi descoberto um nódulo e percebeu-se que era maligno e ela foi logo enviada para outro especialista. Quando o meu pai me explicou a história, a minha primeira reação foi perguntar porque é que a Filipa não foi mais cedo ao médico, se já tinha detetado alguma coisa três meses antes. Foi naquela conversa que percebi que não havia uma forma de dar mais confiança às mulheres no momento da autopalpação. Após acabar o curso, estava eu a fazer a minha tese de mestrado, e comecei então a fazer uma pesquisa mais a fundo sobre que tecnologia poderia ser utilizada. Comecei a ler alguma investigação, encomendei alguns sensores para fazer testes em casa. Isto tudo quando começou a pandemia, portanto, março de 2020. Depois contei as minhas descobertas ao Frederico Stock, que é um dos meus melhores amigos há mais de 12, 13 anos. Ele estava a terminar o mestrado em Gestão e Inovação Digital e disse-me “olha acho isso uma excelente ideia, se quiseres eu ajudo com toda a parte de negócio e tentamos fazer disto uma coisa mais séria”. Juntámo-nos em finais de maio de 2020 e fundámos a empresa em junho de 2021.

– E de lá até cá como procedeu o desenvolvimento da companhia?

F.N. – Nós começámos inicialmente por fazer uma validação do mercado e da solução, tentámos perceber junto de mulheres e médicos qual é que era o problema que havia e se esta solução podia ou não ser bem aceite. Fomos desenvolvendo diversos protótipos e já tivemos uma grande evolução. Fomos recorrendo a iniciativas como o 929 Challenge, que promovem o empreendedorismo e que promovem a ligação entre os países de língua oficial portuguesa, Macau e China. Nós sempre concorremos a vários programas para validar o projeto junto do mercado e junto dos diversos stakeholders a aceitação do nosso produto. Entretanto, como começámos depois a fazer estudos clínicos, fomos aumentando a nossa equipa e atualmente já estamos a distribuir os primeiros testes pilotos pagos. Já estamos na fase final do desenvolvimento do produto e no início do próximo ano já queremos ter esta parte finalizada. Relativamente a toda a parte da certificação como dispositivo médico, trata-se de uma parte muito regulatória e que, portanto, demora algum tempo. Já estamos a tratar dessa parte, tanto na Europa como nos Estados Unidos. Agora o próximo passo será fazer estudos clínicos em Macau.

Estamos a iniciar uma nova ronda de financiamento e a procurar investidores precisamente para depois
começarmos a expandir tanto para o mercado norte-americano, como para o mercado asiático

– Como ouviram falar do 929 Challenge?

F.N. – Foi via um contacto que nós temos na Building Global Innovators Portugal, com quem já tínhamos ido a Boston. Recomendaram-nos a participação neste programa, pois parecendo que não, apesar de já estarmos há algum tempo nisto, ainda somos uma startup em fase inicial, visto que ainda não temos qualquer venda e ainda estamos na fase de desenvolvimento do produto. Isto demora sempre o seu tempo, como deve calcular.

– E como foi a experiência toda de vir a Macau e participar na competição? Acha que a viagem permitiu explorar o mercado asiático?

F.N. – Foi espetacular. Nós participámos inicialmente com o intuito também de começar a perceber um bocadinho melhor como podíamos desenhar o nosso caminho para o mercado asiático, neste caso para Macau e para a China. Porque realmente não fazíamos qualquer ideia, nunca tínhamos tido qualquer contacto com o mercado asiático e queríamos ter essa validação também, até porque para investidores é muito importante. Nós estamos em Portugal, já tínhamos visto o mercado europeu, já tínhamos estado nos Estados Unidos a perceber o mercado norte-americano, mas no mercado asiático, que é também igualmente gigante, ainda não tínhamos tido qualquer validação. Portanto, fomos com o intuito de perceber como poderíamos entrar de uma forma realista e não cairmos de para-quedas, chegar lá e tentar fazer tudo. Tentámos desenhar então um ‘roadmap’ para o mercado asiático e foi precisamente isso que conseguimos, tanto a nível de propriedade intelectual das patentes, como a nível dos estudos clínicos, e mesmo da própria certificação. Foi espetacular a experiência, aprendemos imenso ao longo das duas semanas. Os mentores foram espetaculares, tivemos duas sessões de mentoria que foram muito, muito positivas.

– O que vos interessou ou impressionou mais no mercado asiático?

F.N. – O que percebemos é que na China há uma grande disparidade entre as zonas mais rurais e as zonas mais industriais. O nosso objetivo é detetar o cancro da mama na sua fase mais precoce e, portanto, de uma forma portátil dar acesso a todas as mulheres de terem uma ferramenta em casa que possa auxiliar na autopalpação e acelerar o seu acesso a exames diagnósticos. Percebemos que o mercado asiático é muito tecnológico, a população chinesa adota ferramentas tecnológicas de forma cada vez mais rápida, mas não existe qualquer ferramenta tecnológica que complemente ou substitua a autopalpação da mama. Nós vimos logo aí uma oportunidade, pois há uma grande disparidade entre essas zonas e o acesso a exames de diagnóstico, mamografias e ecografias mamárias não é uniforme em todo o país. Percebemos que poderia haver aqui uma grande oportunidade para entrarmos no mercado chinês.

– Que fontes de financiamento já tiveram ou estão a negociar?

F.N. – Nós já tivemos uma primeira ronda de investimento de 250 mil euros e agora estamos a iniciar uma nova ronda de financiamento e a procurar investidores precisamente para depois começarmos a expandir tanto para o mercado norte-americano, como para o mercado asiático.

– E estão a pensar voltar a Macau ou à região da Grande Baía para promover a Glooma?

F.N. – Sem dúvida. Até porque, pelo que percebemos, precisamente com as sessões de mentoria, foi que pode haver uma grande receptibilidade. Já estamos a fazer estudos clínicos em Portugal e pode haver receptibilidade em fazer estudos clínicos em Macau. Portanto, esse é o próximo passo, fazer os estudos clínicos em Macau com um hospital público local.

– Quais são as dificuldades que uma companhia tão recente como a vossa enfrenta? Que desafios têm de ultrapassar ?

F.N. – O que precisamos é de mais dados. Precisamos tanto de dados de mulheres portuguesas, como de mulheres asiáticas, como de mulheres norte-americanas. E é por isso que estamos também a tentar fazer estudos clínicos em Portugal, Estados Unidos e Macau.

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