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Uma ponte em marcha

No âmbito das relações comerciais entre a China e os países de língua portuguesa, há agora um portal, além de três centros — um de distribuição de produtos alimentares dos países de língua portuguesa, um de serviços comerciais para as Pequenas e Médias Empresas da China e dos países de língua portuguesa e um de convenções e exposições para a cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa. Na opinião da vogal executiva do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), Glória Batalha Ung, tal reflete uma vontade mais firme e clara de trabalhar no sentido de favorecer estas trocas e negócios, vincada desde a tomada de posse do secretário para a Economia e Finanças, Lionel Leong. E, quase dois meses depois da inauguração do centro de distribuição de produtos alimentares dos países de língua portuguesa, a representante do IPIM garante que já há contactos que podem dar origem a negócios.

Sobre se Macau tem atuado como um verdadeiro intermediário nestas relações comerciais e de negócio, Glória Batalha Ung afirma, em entrevista ao PLATAFORMA, que há sinais desse trabalho. A vogal executiva afirma ainda que não há sobreposição entre o papel do IPIM e o do Fórum Macau, já que este último atua mais ao nível político.

Plataforma-Que balanço faz até agora do trabalho do centro de exposição dos produtos alimentares dos países de língua portuguesa?

Glória Ung – A inauguração foi a 31 de Março. Desde essa altura, recebemos mais de 2000 visitantes individuais, que vêm de mais de 20 países. Temos visitantes do Japão, Coreia do Sul, Finlândia e Bolívia. Quanto aos que vêm dos países de língua portuguesa e da China Continental, a maioria vem em comitiva. Destes 2000, mais de 100 são [visitantes] profissionais.

O grande objetivo deste centro é promover as relações comerciais entre a China e os países de língua portuguesa?

G.U. – Temos um Portal [Portal para a Cooperação na Área Económica, Comercial e de Recursos Humanos entre a China e os Países de Língua Portuguesa] e três centros [além do centro de distribuição de produtos alimentares dos países de língua portuguesa, um centro de serviços comerciais para as Pequenas e Médias Empresas da China e dos países de língua portuguesa, e do centro de convenções e exposições para a cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa].

Dos três, o centro dos produtos alimentares é especial, porque só expõe produtos lusófonos [e não os da China]. A nossa intenção é fazer com que os produtos lusófonos cheguem ao mercado da China Continental ou de Macau e, no futuro, se houver oportunidade ou se eles quiserem, aos mercados asiáticos. 

Estes 2000 visitantes são um número satisfatório?

G.U. – O que interessa são os resultados. Espero que as pessoas que cá vêm possam concretizar negócios ou ter outras oportunidades. Por exemplo, as delegações da China Continental vêm cá com a esperança de estabelecer contactos com alguns fornecedores. Querem fazer negócios em grandes quantidades e nós podemos também ajudar a abrir a porta da importação à China. 

O resultado é satisfatório?

G.U. – Macau é um porto livre de negociações, as exportações seguem livremente e é difícil  controlar. Queremos, num determinado período, inquirir junto dos fornecedores, compradores e de todos os membros do portal os resultados desses contactos. Estamos a preparar questionários eletrónicos, que serão distribuídos aqui no centro. 

Mas não têm como garantir que os visitantes que cá vêm passam pelo portal?

G.U. – Têm de passar sempre pelo portal. Os fornecedores estão no portal. E se fizerem uma encomenda direta, no regime B para C [empresa para consumidor], têm de mostrar os resultados. 

Já há negócios concretizados?

G.U. – Há, mas não são grandes. 

Entre que países/territórios são estes negócios?

G.U. – De Macau e da China, em princípio. Estabeleceram contactos de B para B [empresa para empresa]. No caso dos negócios B para C [empresa para consumidor], já existe venda de vinhos — os vinhos portugueses — e alguns produtos brasileiros, como os biscoitos e os lacticínios. São empresários de Macau ou indivíduos de Macau e da China Continental. Aliás, na relação B para C, nem sempre são empresários, pode ser uma senhora doméstica que encomenda uma garrafa de vinho ou de azeite. 

No portal estão identificados todos os produtos alimentares, daí que não seja estritamente necessário a um potencial interessado deslocar-se ao centro. O portal é mais eficaz do que o centro propriamente dito?

G.U. – São coisas diferentes. Se o interessado se deslocar a Macau, pode provar e experimentar — de vez em quando, até temos provas de vinhos. Além disso, na China Continental começamos a instalar este tipo de centros. O próprio IPIM tem gabinetes de ligação nas diferentes províncias da China, em Hangzhou, Chengdu, Shenyang, Fuzhou e terá em Guangdong. Nestes gabinetes de ligação, cada um terá um expositor de produtos alimentares dos países de língua portuguesa. Estamos a pensar ter 100 até 200 produtos em cada gabinete. 

Além disso, já fizemos acordos com algumas associações. Assim, além dos gabinetes do IPIM, ainda temos mais centros em Jiangmen, Xangai e Tianjin.

Esses centros são todos de produtos alimentares?

G.U. – Sim, mas geridos por associações da China Continental. Jiangmen e Xangai já têm um centro. Estamos a negociar com Tianjin — o espaço vai ser alugado pelo governo daquele sítio, temos de negociar com a associação, qual é a área que vamos ocupar. Estamos a tentar fazer mais centros offline [centros com exposição dos produtos], mesmo que sejam pequenos, na China Continental.

O centro de serviços comerciais para as Pequenas e Médias Empresas (PMEs) da China e dos países de língua portuguesa e o centro de convenções e exposições para a cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa também têm uma expressão física?

G.U. – Sim. O centro das PMEs da China e dos países de língua portuguesa situa-se no 19º andar do China Civil Plaza. O serviço já está lá — os nossos colegas estão lá para ajudar as PMEs não só de Macau, mas também da China Continental. Agora pomos este serviço em ligação com o portal. O centro de convenções e exposições da China e dos países de língua portuguesa encontra-se no escritório do IPIM. 

Gloria Ung, Administradora do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM)

No caso dos produtos alimentares, há analistas que dizem ser desnecessário que esteja expostos num espaço físico. Vale mesmo a pena?

G.U. – Dos contactos que temos mantido com empresários, dizem-nos sempre que não sabem o que são os produtos. Não conseguem provar nem tocar. O centro é complementar em relação ao portal — se for tudo eletrónico, parece que é uma coisa muito abstrata. Aliás, no futuro vamos ter um prédio inteiro, um complexo, para esta nossa missão de cooperação económica e comercial entre a China e os países de língua portuguesa. 

No fim deste ano, vamos ter a V Conferencia ministerial do Fórum para a cooperação economica e comercial entre a China e os países de lingua portuguesa e gostaríamos que nessa altura se desse o lançamento da primeira pedra do edifício. Agora estamos em fase de planeamento.

Quando esse edifício estiver concluído, o que vai acontecer a este centro, na Praça do Tap Seac?

G.U. – Vamos ver. Se calhar, como este se encontra no centro da cidade, talvez se possa manter. 

A maioria dos produtos que aqui se encontram são de Portugal?

G.U. – Sim, mas também temos muitos produtos do Brasil. 

Aliás, fomos [recentemente] à Feira APAS — exposição anual dos produtos alimentares do Brasil — e lá, os brasileiros mostraram que têm vontade de expandir o mercado para a China, fomos falar com os expositores e a resposta foi muito positiva. Conseguimos trazer 200 produtos. Fomos com uma delegação de 20 empresários de Macau e da China Continental, e eles foram falar com os fornecedores. Trouxemos mais de 200 produtos, nomeadamente frutos secos, lacticínios, sumos, ingredientes para sobremesa, melaço.  Além disso, surgiram outras oportunidades de negócio, incluindo a possibilidade de instalação de um restaurante brasileiro aqui. Fala-se ainda em importação de água de coco e uvas orgânicas. 

Tendo em conta que a maior parte dos produtos aqui expostos são de Portugal — e estes encontram-se facilmente nos supermercados do território —, qual é a vantagem para um potencial interessado em negócio em vir aqui?

G.U. – Se eu for ao supermercado, compro logo o produto, mas se quiser fazer negócios em quantidade, o supermercado nunca vai ajudar. Nem o dono do supermercado quer ajudar. 

Não será mais vantajoso mostrar aqui produtos que não são de fácil acesso, oriundos de sítios como a Guiné, Angola ou Moçambique?

G.U. – Um ou dois empresários foram ver um determinado produto português a um supermercado, mas pediram-nos para arranjar o contacto do fornecedor. Assim ajudamos. 

Mais uma coisa, como aqui não há venda, os fornecedores locais — temos 70 e tal fornecedores, no total —, que são 20, pedem para vender aqui. Estudámos a proposta e a, a partir de fim deste mês, vamos fazer vendas a retalho destes fornecedores. 

Entre 19 Maio e 27 de Agosto, todas as quintas, sextas e sábados, vamos ter um fornecedor — um diferente cada semana — a expor no centro os produtos que quer vender. Alguns fornecedores ainda sugerem organizar prova de vinhos e fiambre. Este espaço é para si. Podem [efectuar vendas], eles têm licença de venda, nós não vendemos, eles vão ter mais negócios e nós mais entradas. Depois, queremos falar também com agências de viagem e tentar trazer grupos de turistas ao centro. 

Volto a insistir: vão tentar trazer mais produtos de outros países que não Portugal e Brasil?

G.U. – Sim. Fui à Guiné-Bissau no mês passado e trouxe cajus, que posso promover no portal. Através deste tipo de promoção, podemos ajudar a encontrar parceiros. Países como a Guiné-Bissau e Timor Leste, são ricos em recursos naturais, mas não sabem exportar. Através do portal, podemos ajudar. Se o empresário tiver interesse, contacta connosco. 

Quais são os objetivos a médio prazo?

G.U. – Vamos tentar angariar mais projetos com os países de língua portuguesa. Temos de ir a Portugal, Angola e Moçambique, talvez até Timor. No caso de Portugal, queremos ir com a China Continental explorar o mercado. 

Nos próximos dois ou três meses, vamos recolher mais produtos alimentares para aumentar o nosso portal. Além disso, notamos que a China tem grande vontade de explorar o mercado. Tem materiais de construção e tecnologia que pode usar nos outros países, que poderiam ser aproveitados para infra-estruturas nos países lusófonos em desenvolvimento. Nesses casos, podemos ajudar, temos capacidade de ajudar na interpretação, além de termos os contactos.

Esse não seria o papel do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa?

G.U. – Nós [IPIM] atuamos mais do lado dos negócios, enquanto o Fórum atua mais mais ao nível governamental e político.

Por exemplo, no caso do fundo de cooperação e desenvolvimento para a China e os Países de Língua Portuguesa [no valor de mil milhões de dólares norte-americanos], podemos ajudar os empresários a candidatarem-se. Trabalhamos no sentido de apoiar gradualmente o sucesso do investimento chinês lá, ao mesmo tempo em que procuramos mais oportunidades de colaboração com os chineses. 

Até agora, Macau tem servido como uma plataforma real, tendo em conta que a maior parte dos países não precisa do território para proceder às trocas comerciais?

G.U. – Brasil é o segundo maior exportador para a China, não precisa de Macau. Mas os outros [países] precisam. Além disso, as pequenas e médias empresas brasileiras, por exemplo, também precisam — não têm capacidade de exportação, nem sabem como proceder.

Nestes últimos dois anos, com o novo secretário para a Economia e Finanças [Lionel Leong], esta vontade é mais notável — temos muito trabalho, mas acho que estamos a fazer o que podemos para que essa plataforma seja o mais perfeita possível. 

Luciana Leitão

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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