O Presidente Xi Jinping garante que o povo chinês está disposto a trabalhar com pessoas de todos os países para “salvaguardar a paz mundial e promover o desenvolvimento conjunto”; o comissário dos Negócios Estrangeiros, Liu Xianfa, destaca o “papel insubstituível” de Macau na diplomacia da China; e o candidato único a Chefe do Executivo, Sam Hou Fai, quer reforçar a exportação tecnologias da China para a Lusofonia. No mundo perfeito, nada a dizer… Mas a realidade é bem mais complexa que a narrativa.
Nenhuma grande potência – a começar pelos Estados Unidos – está nesta altura isenta da obrigação de fazer mais e melhor pela paz e pelo desenvolvimento. O constante bloqueio ocidental à China desculpa muita coisa; mas sempre achei – e escrevi – que Pequim estava a cair na armadilha e a perder uma oportunidade única de se afirmar com potência dominante, aceite pela opinião pública mundial. Face aos repetidos e graves erros do eixo atlântico, dominado por Washington, vingou em Pequim a tese de que não vale sequer a pena maior abertura e flexibilidade negocial, porque os Estados Unidos farão sempre tudo para destruir a China. Percebe-se o sentido interno desse discurso, mas não é o melhor caminho para a afirmação internacional da China. O ponto mais positivo da mensagem de Xi Jinping é que a realidade precisa dessa tese; e é essencial que a China mantenha o compromisso com o multilateralismo e a globalização pacífica – “make business, not war”. Esperemos que todos os lados possam dar passos mais seguros e credíveis nesse caminho. A China precisa disso; o resto do mundo também.
Quanto ao papel de Macau na diplomacia chinesa, não posso estar mais de acordo com a estratégia que suporta a narrativa de Liu Xianfa. Faz todo o sentido…. mas não cola com a realidade. É verdade que a plataforma lusófona tem sido essencial para a salvaguarda da diversidade em Macau e, até, para a presença da língua portuguesa e das comunidades lusófonas. Contudo, Macau pouco ou nada fez por essa diplomacia. Sobretudo porque a elite local nunca quis correr o risco de realmente abraçar uma missão para a qual não tem know-how nem autonomia. O princípio foi sempre o medo de pagar em Pequim os erros que Macau pudesse cometer; o fim acabou por ser pouco ou nada fazer, protegendo-se do risco de fazer mal. Se realmente querem Macau no centro da diplomacia lusófona, é preciso toda uma panóplia de condições políticas, económicas, culturais… e práticas.
Sam Hou Fai traz a boa nova de não deixar cair o projeto lusófono; inclusivamente anunciando objetivos económicos concretos. Contudo, se a importância do bilinguismo continuar a minguar; se as comunidades lusófonas não tiverem condições de residência, trabalho, crescimento e afirmação; se as políticas de atração de investimento não forem claras e consequentes; se não houver pontes firmes entre a Grande Baía e a Lusofonia; Macau não tem know-how nem a experiência para aumentar a exportação de tecnologias da China para o mundo lusófono. Quanto à comunicação, outra área referida por Sam Hou Fai – e bem – o PLATAFORMA tem dez anos de experiência sobre tudo o que falta fazer para que isso seja realidade. Cá estaremos nos próximos dez para contribuir o melhor que pudermos – se a cidade quiser.
*Diretor-Geral do PLATAFORMA