Merdan Ghapar, 31 anos, membro da minoria chinesa muçulmana uiguir, era um modelo de sucesso até ter sido preso. Enfiado numa cela com 60 prisioneiros, devolveram-lhe por engano o telemóvel no meio dos pertences e ele filmou e descreveu durante alguns dias os abusos e torturas em Xinjiang
Em janeiro, Merdan Ghapar, um modelo de sucesso na plataforma de comércio eletrónica de sucesso Taobao, foi preso e levado para Xinjiang sem uma acusação formal, depois de ter cumprido uma pena superior a um ano por posse de drogas (que contestou sempre).
Enviado para uma cela com outros 50 a 60 prisioneiros, Merdan enviou através do telemóvel que lhe foi devolvido por engano, no meio de outros bens, relatos do horror que viu na cadeia em Xinjiang. Abusos e torturas cometidos pelos guardas prisionais chineses contra os presos da minoria muçulmana uiguir, a que ele também pertence, e a que assistiu como testemunha direta.
Segundo o jornal britânico The Guardian, nada de sabe de Merdan Ghapar desde março. Há cinco meses sem escrever ou enviar nada e sem se saber se está vivo ou morto.
O seu telemóvel foi-lhe devolvido por engano no meio de outros pertences quando teve de ser levado ao hospital por causa de uma gripe. Durante dias Merdan Ghapar enviou relatos e vídeos do que viu. Nomeadamente, adolescentes encapuzados a serem espancados com violência e o uso generalizado pelos presos uiguires do “fato de quatro peças”. “Este chamado fato de quatro peças era um saco de plástico preto na cabeça, algemas de mãos e pés e um a corrente de aço entre as algemas”, descreveu num dos seus relatos.
A alegada perseguição dos guardas chineses aos adolescentes uiguires com 12 a 13 anos era constante. Supostamente, forçavam as crianças a assinar um documento de “arrependimento e rendição”.
“Um terço do espaço no hall entre as celas estava ocupado com cadeiras para os guardas de serviço. De resto era homens ara a direita, mulheres para a esquerda, separados e fechados em jaulas. E da cabeça aos pés todos os presos usavam o fato de quatro peças”, escreveu Ghapar.
A BBC fez um trabalho especial sobre o caso de Merdan Ghapar e tentou obter uma reação oficial ao desaparecimento do modelo há cinco meses mas não conseguiu qualquer resposta.
O seu tio contou à BBC que Merdan teria sido detido porque a sua família fora da China é politicamente ativa. O foco internacional em Xinjiang tem aumentado nos últimos meses, muito por parte de organizações dos direitos humanos que pedem a entrada de investigadores independentes em Xinjiang. Recentemente, os Estados Unidos impuseram novas sanções à China por causa do tratamento dado à minoria uiguir e a outras minorias.