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UNESCO: Lusofonia em peso

Cabo Verde quer garantir já para a semana o apoio de Portugal, Angola e Guiné-Bissau à candidatura conjunta do campo de concentração do Tarrafal a património da Humanidade. São Tomé e Príncipe, e Timor-Leste estão também a planear apresentar candidaturas junto da UNESCO.

A cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) começa na terça-feira, na ilha do Sal, em Cabo Verde. A candidatura do antigo campo de concentração do Tarrafal a património da Humanidade é uma das prioridades na agenda. Cabo Verde volta a insistir na necessidade de mobilizar a CPLP na classificação do espaço como Património Mundial – o monumento histórico está na lista indicativa da UNESCO desde 2003.

À margem da edição inaugural do “Fórum Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, que decorreu em Macau no fim-de-semana passado, o presidente do Instituto do Património Cultural (IPC) de Cabo Verde disse ao PLATAFORMA que “os outros países já estão sensibilizados” para o assunto. “Há abertura mas é preciso formalizar. Porque não acolher já na cimeira do Sal o apoio dos países que pertencem à CPLP?”, referiu Hamilton Jair Fernandes.

O responsável sublinha que o Tarrafal, na ilha de Santiago, é “um espaço de má memória que acabou por albergar, no mau sentido do termo, prisioneiros de outros países”, vindos mesmo de Espanha e da Polónia. “Isso exige, só por si, uma estratégia global”, sublinhou.

Para Jair Fernandes “trata-se de uma matéria muito sensível, por se tratar de História contemporânea”. O objetivo, ressalva, não é “condenar a História, mas sim tirar lições e tornar o Tarrafal um campo da paz, de partilha e de disseminação de ideias”.

Cabo Verde já está a construir uma equipa nacional para preparar a candidatura, com elementos do IPC, das universidades locais e da Câmara Municipal do Tarrafal, revelou Jair Fernandes. A intenção, acrescenta o académico, é entregar o dossier à UNESCO “pelo menos, em 2021”.

No Tarrafal – inaugurado em outubro de 1936 e construído à imagem dos campos de concentração Nazis – morreram 32 presos políticos portugueses e dezenas de outros das então colónias portuguesas.

Na mira

Também São Tomé e Príncipe tem planos para levar o Txilôli à UNESCO, anunciou durante o Fórum a coordenadora da Comissão Nacional para a Salvaguarda do Património Imaterial e Material do país, Maria Nazaré Ceita. O teatro popular Txilôli recria, a milhares de quilómetros de distância, o romance medieval europeu “Tragédia do Marquês de Mântua e do Imperador Carloto Magno”.

A antropóloga explicou que o país está já a trabalhar com a Secção do Património Cultural Intangível da UNESCO na realização de um inventário dos locais e fenómenos culturais passíveis de proteção, a chamada Lista Indicativa a Património Mundial. Nesse âmbito, as autoridades já estão a realizar um inventário comunitário no bairro da Boa Morte, nos subúrbios da capital São Tomé.

Ainda durante o Fórum, o diretor nacional das Artes, Cultura e Industrias Criativas Culturais de Timor-Leste, Carlos Jesus Freitas, revelou que também o país asiático tem ambições de ver a Tebe-dahur, uma dança tradicional de grupo, reconhecida pela UNESCO como património mundial.

 

Nova de Lisboa ajuda Cabo Verde

A Universidade Nova de Lisboa e o Instituto do Património Cultural (IPC) de Cabo Verde vão começar já este verão trabalhos de prospeção dos mais de três mil navios afundados nas águas do arquipélago, revelou ao PLATAFORMA o presidente do IPC, Hamilton Jair Fernandes.

À margem da edição inaugural do “Fórum Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, o responsável disse que a primeira fase do projecto já começou em abril, em colaboração com escolas e instituições governamentais. Em novembro, quatro técnicos do IPC viajarão para Lisboa para participar em seminários e formações sobre a preservação de património subaquático.

Jair Fernandes defende que o património “prova que Cabo Verde foi um ponto estratégico nas trocas comerciais a partir do século XV, o que exige uma defesa e valorização de um legado que acaba por ser de todo o mundo”. O especialista sublinhou ainda a importância de sensibilizar as comunidades e autoridades locais sobre a importância do património subaquático do país.

Lusofonia: unidos pelo património

O primeiro “Fórum Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa” terminou com um apelo dos dirigentes culturais lusófonos à criação de uma plataforma para a cooperação na proteção do património conjunto, nomeadamente o que se encontra nos países menos desenvolvidos.

Dois dias que souberam a pouco. Foi o que sentiram os dirigentes culturais que estiveram em Macau no fim-de-semana passado para a edição inaugural do “Fórum Cultural entre a China e os Países de Língua Portuguesa”. Emanuel Caboclo, diretor-geral adjunto do Instituto Nacional do Património Cultural de Angola, diz que fica o desejo de que o evento possa ser “um pontapé de saída para um processo de valorização do património histórico comum”.

“O que interessava era mesmo coisas mais concretas”, acrescenta Fernando Pereira Teixeira. O presidente da Ordem dos Arquitetos da Guiné-Bissau realça que é possível “começar a entrosar uma estratégia para que o Fórum seja atuante, pró-ativo e não apenas uma montra cultural”.

Já há trabalho a ser feito, referiu o presidente do Instituto do Património Cultural de Cabo Verde. A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem em mãos um projeto para a criação de um “Atlas do Património da CPLP, o legado que une todos”, recorda Hamilton Jair Fernandes.

Ana Paulo Amendoeira afirma que não chega. Para a vice-presidente do ICOMOS Portugal (International Council on Monuments and Sites, versão inglesa), “a conclusão mais relevante [do Fórum] é a importância de trabalhar em cooperação, assim como com outros países com património ligado ao nosso”. A responsável defendeu a construção de uma plataforma de cooperação com vista ao reconhecimento desta herança como património mundial.

Uma visão partilhada pela presidente do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional do Brasil, país eleito em novembro passado como membro do Comité do Património Mundial da UNESCO. Kátia Santos Bógea acredita que esta é uma oportunidade para criar, “dentro da UNESCO”, um fórum específico para os países lusófonos.

Salvar o que resta

Para Fernando Pereira Teixeira a prioridade para a maioria dos países lusófonos é “proteger e reabilitar o que existe” mais do que sonhar em ser património mundial. O assessor do Ministro das Obras Públicas da Guiné-Bissau fala da experiência do país de onde vem e dá como exemplo os casarões coloniais na ilha de Bolama, antiga capital guineense. “Tenho feito fotos, tenho filmado, porque vai desaparecer e já desapareceu muita coisa”, por causa da instabilidade política que o país atravessa.

Pereira Teixeira defende que o Fórum Cultural deveria ter uma vertente de proteção e conservação do património construído. “Poderia haver intercâmbios, com técnicos vindos de países com mais experiência, como Portugal e o Brasil ou mesmo Macau, que têm muito património”, sugere o arquiteto.

Já o diretor nacional adjunto do Património Cultural de Moçambique, Alexandre António, realça ao PLATAFORMA que só através da valorização e promoção do património construído e imaterial – como a gastronomia e a dança – é que os países lusófonos menos desenvolvidos poderiam passar de um turismo de praia e sol para um turismo cultural de valor acrescentado.

Vítor Quintã 13.07.2018

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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