O DIFÍCIL CAMINHO DA INTEGRAÇÃO

Desde a transferência de soberania de Macau e de Hong Kong que a integração económica regional tem estado no topo da agenda política. Assinaram-se acordos, multiplicaram-se conferências, desenharam-se pontes e estudaram-se fronteiras. Mas o caminho não tem sido sempre fácil. Especialistas dizem que não houve resultados significativos.
ZhangDejiang teve um sonho. Tornar o sul da China numa potência económica regional. Foi assim que em 2003, o então secretário do Partido Comunista da Província de Guangdong criou o conceito `9+2´: nove províncias do centro e sul do país e as duas regiões administrativas especiais de Hong Kong e Macau formavam a Região do Grande Delta do Rio das Pérolas (GDRP).
Não havia nada semelhante nem com tamanha dimensão. Só a região representava uma área global de dois milhões de quilómetros quadrados, equivalente a 21 por cento do território da China. O número de habitantes – 474 milhões de pessoas – compunha 36 por cento da população do país.
E o Produto Interno Bruto deste bloco totalizava 40 por cento do PIB nacional.
Macau surgia nesta fórmula como um centro de turismo e de lazer e Hong Kong como um polo financeiro. Dois potenciais e importantes investidores, com experiência internacional.
ZhangDejiang acreditava que o futuro de Guangdong não podia ser visto sem Macau e Hong Kong. E que o desenvolvimento destas duas regiões estava associado à próspera província de Guangdong.
“A ideia original deste projeto era interessante porque havia províncias com menos recursos, com problemas básicos, como falta de infraestruturas ou rede de transportes. Macau podia ser uma peça importante para ajudar estas zonas mais remotas”, explica KwanFung, Professor de Economia da Universidade de Macau.
POUCOS RESULTADOS
Passaram-se cinco anos. O visionário deste projeto deixou a região e rumou a Pequim. ZhangDejiang é agora o presidente da Assembleia Nacional Popular e o número três da hierarquia comunista.
As reuniões anuais do Grande Delta do Rio das Pérolas continuaram a acontecer e a construção da ponte que vai ligar Hong Kong, Macau e Zhuhai começou em 2009 (ver texto nestas páginas).
Mas no terreno permaneceram dúvidas sobre a eficácia da aplicação do conceito do GDRP.
O especialista KwanFung acredita que “não houve resultados significativos”. As prioridades agora são outras: “Quando o Grande Delta do Rio das Pérolas foi criado, a economia chinesa estava num estágio muito diferente. Hoje enfrenta outros desafios e o governo está focado na forma como vai promover a economia nacional.”
Falta também definir uma estratégia: “Todos os anos temos uma conferência sobre esta região. Mas não se percebe o que tem sido feito ou quais são os resultados deste projeto. Parece que não foram definidas obrigações nem metas.”
Kwan acredita que a ideia tinha pernas para andar, mas com problemas difíceis de resolver: “As nove províncias tinham um nível de desenvolvimento muito diferente, o que tornava a cooperação muito difícil.”
Para apoiar a integração económica e comercial foram assinados, em 2003, acordos de estreitamento das relações económicas e comerciais (CEPA) quer entre a China continental e Macau quer entre a China continental e Hong Kong. O acordo pretendia isentar ou reduzir as taxas aduaneiras para as mercadorias que circulavam entre os dois lados da fronteira, facilitando a entrada de serviços no mercado doméstico chinês. Era, no fundo, mais um instrumento para facilitar a cooperação. Com objetivos bem definidos, estes acordos estabeleceram uma lista de mercadorias e serviços, atualizada anualmente. E os governos traçaram uma meta para 2015: a liberalização total do comércio de produtos.
À SOMBRA DE HONG KONG
“O CEPA tem tido resultados na área económica, especialmente com o boom do número de turistas que chega do Continente. Mas por que razão não está a gerar a influência desejada nas trocas comerciais?” A pergunta parte do Presidente da Associação dos Exportadores e Importadores de Macau, Sio Chi Wai.
E Hong Kong pode ser a resposta. “Os acordos deveria beneficiar as duas regiões administrativas especiais, mas, como Hong Kong tem uma escala económica maior, o debate tem sido feito primeiramente com aquela região. As empresas de Macau acabam por ficar dependentes da influência de Hong Kong”, nota Sio Chi Wai.
Mas as dificuldades não se ficaram por aqui. Os problemas surgiram logo desde o início, quando os empresários entenderam que os termos deste acordo não serviam as suas necessidades. A entrada no China continental era dificultada por “problemas a nível operacional” como o tempo que as empresas necessitavam para estabelecer-se do outro lado e os “regulamentos muito rigorosos” no que diz respeito à inspeção e rotulagem dos produtos alimentares.
“Por exemplo, a China continental exige que os rótulos das bebidas contenham a data de validade, o que é normal para produtos básicos, mas não para produtos como, por exemplo, o vinho que chega de Portugal. Existe algum sítio do mundo onde seja obrigatória a data de validade no rótulo do vinho tinto?”, pergunta o também deputado à Assembleia Legislativa de Macau.
Numa segunda fase do CEPA, continua Sio Chi Wai, “foi tida em consideração apenas a indústria e a manufatura. No entanto, existe um grande número de empresas de Macau que se dedica ao turismo e ao comércio a retalho. Temos de discutir como dar prioridade às pequenas e médias empresas do território no sentido de beneficiarem ainda de menores taxas alfandegárias”.
Catarina Domingues
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