O Presidente chinês, Xi Jinping, deslocou-se a Macau no contexto das celebrações dos 25 anos do regresso de Macau à pátria e tomada de posse do novo Executivo, liderado por Sam Hou Fai. Aos olhos de Pequim, a responsabilidade da RAEM para com o Estado foi cumprida à risca: lei de segurança nacional, revisão das leis eleitorais. Sobretudo, um compromisso político com a defesa da pátria, patente na composição dos governos e orgãos legislativos. Desse ponto de vista, Macau é visto como o exemplo perfeito da execução do princípio “Um País, Dois Sistemas”. Porém, também deixou bem claro que é preciso mais do que isso.
Na sua passagem, fez questão de sublinhar a “singularidade” de Macau, como “o único local do mundo que tem como línguas oficiais o português e o chinês”. Alertou para a necessidade de “uma atitude mais tolerante e mais aberta”, de forma a “estabelecer mais laços de cooperação com o exterior”. Em suma, “projetar a imagem” de Macau lá fora, de modo a conquistar “o seu lugar no palco internacional”. Nesse sentido, deu também o guião: “Otimizar o ambiente de negócios”, “renovar as leis que têm a ver com o comércio” de forma a “atrair mais recursos e investidores internacionais” e, por último, numa ótica focada nas trocas culturais, apelou ao “alargamento da rede de amigos” e “fomento do intercâmbio entre os chineses e os estrangeiros”.
Foi com alguma surpresa que se ouviram estas afirmações de Xi Jinping, na dúvida e receio que os elementos-chaves do seu discurso tivessem como foco a segurança. Certo é que Xi quer, tanto quanto nós, que Macau continue a ser diferente – e mais ainda. As suas afirmações revelam também que essa estratégia não pode estar pendente do turismo, pois a diversificação económica tem como um dos alicerces a entrada de novos investimentos e talentos externos.
Por um lado, é ainda pouco conhecido o potencial e vantagens da cidade para e nos Países de Língua Portuguesa. Tem de haver mais promoção e coragem para criar novos canais de comunicação. Ao mesmo tempo, fazer bom uso da autonomia conferida e agora encorajada para, de facto, criar um ambiente social e de negócios propício à entrada de empresas e talentos estrangeiros – venham de onde vierem, inclusive do Continente. Tal como a politóloga Cátia Miriam Costa refere nesta edição, é preciso também negociar com o Governo Central quais são os limites impostos às relações com o exterior. Utilizo o verbo propositadamente, pois Macau tem de saber comunicar as pedras que encontra pelo caminho, criando com Pequim as condições necessárias ao cumprimento do seu desígnio, fazendo bom uso de instituições como o Fórum Macau.
A verdade é que desde o fim da pandemia a Administração tem realizado inúmeras atividades visando esse objetivo, mas o receio de abrir as portas da cidade e afundar o emprego local tem-se traduzido na ineficácia da tarefa.
Há medo de perder o controlo da cidade. A nível local, quer-se reforçar os princípios de “Macau governado pelas suas gentes” e “prioridade dada ao emprego local”. Nada disso tem de ser colocado em causa: a entrada de novas empresas traz mais oportunidades de emprego (e diversificadas); a entrada de novos talentos vem qualificar os quadros locais, posteriormente mais capazes de assumir posições de liderança em Macau, ou mesmo fora. Trata-se de ir ao encontro do desejo de Sam Hou Fai, que quer ver os jovens de Macau com mais saídas além do turismo e do jogo.
Só cumprindo o seu papel, Macau cria argumentos para prolongar o ‘status quo’ além de 2049. Por outras palavras, ao mostrar resultados, a RAEM defende o propósito de haver “Dois Sistemas”. Como Xi disse, Macau pertence ao mundo. Cabe à RAEM mostrar que quer.
*Diretor-Executivo do PLATAFORMA