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Mundo lusófono reforça apoio a Pequim

Paulo RegoPaulo Rego

A demonização da China tem menos espaço nos Países de Língua Portuguesa do que tem hoje no mundo anglo-saxónico. Em África, nota-se mesmo proximidade ideológica ao PC Chinês; como no Brasil, se Lula da Silva – à frente nas sondagens – voltar à Presidência. Mas há sobretudo uma coligação de interesses: o investimento chinês e as trocas comerciais fazem todo o sentido. O que mete medo é a guerra económica

“Make business, not war”, dispara Marco Galinha, empresário português que assume fortes ligações aos Estados Unidos; mas quer tê-las também na China.

“Há problemas sérios em todo o mundo. Veja-se as dificuldades que a Europa está a atravessar. E, apesar da valorização do dólar, teme-se a recessão nos Estados Unidos. Os problemas da China têm de ser enfrentados ao nível da economia interna. Mas é óbvio, como diz Xi Jinping, que a globalização, as trocas comerciais e o investimento externo são fundamentais para a recuperação económica. A pior coisa que nos podia acontecer a todos seria os Estados Unidos e a China entrarem juntos numa profunda crise económica. As elites políticas e económicas percebem isso em ambos os lados”, remata, em declarações ao PLATAFORMA.

“Para nós, com sede em Portugal – e boas relações atlânticas – Macau é naturalmente a nossa porta preferencial para a Grande Baía e a China continental”, Marco Galinha, CEO do Grupo BEL e do Global Media Group.

O primeiro-ministro de Timor Leste, Taur Matan Ruak aplaude o povo chinês pelas “grandes conquistas de desenvolvimento”. Numa entrevista à CRI, Rádio Internacional Chinesa, o líder timorense considera que o rápido desenvolvimento económico e a eliminação da pobreza na China, nos últimos 30 anos, consistem num “milagre notável”, atribuindo o mérito “à visão estratégica do desenvolvimento e à gestão de alto nível do Partido Comunista da China”, e manifestando a intenção de reforçar a cooperação entre os dois países.

“A China está em boas mãos”, continua Matan Ruak, num rasgado elogio a Xi Jinping, assumindo a relevância da China para o desenvolvimento da Humanidade. Que o futuro da China seja “ainda melhor sob a liderança do PCC”, termina o governante.

CONTRASTE COM NARRATIVA AMERICANA

O contraste lusófono é óbvio, por exemplo, com a visão de Richard McGregor, membro destacado do Lowy Institute, na Austrália: “Xi Jinping está no topo do partido, o partido está no topo da China e a China está no topo do mundo. Esse é basicamente o programa”, resume o analista político australiano, que de alguma forma espelha o “novo consenso” entre democratas e republicanos nos Estados Unidos, que fazem da pressão ideológica e do controlo das liberdades na China o principal argumento para justificar o bloqueio do sua influência global.

“Os objetivos atingidos atribuem-se à visão estratégica do desenvolvimento e à gestão de alto nível do Partido Comunista da China” ,
Taur Matan Ruak, primeiro-ministro de Timor-Leste

Angola é outro país lusófono que assume a parceria chinesa. Apesar do esforço norte-americano, que tem com João Lourenço mais espaço do que tinha com José Eduardo dos Santos, o ministro dos Transportes, Ricardo Viegas de Abreu, elogia o modelo de desenvolvimento “bem-sucedido” chinês. “Para mim, o PCC é a chave dos êxitos de hoje alcançados pela China”. Posição semelhante, por exemplo, à do ex-presidente de Cabo Verde, Pedro Pires:

“Espero que a China continue a avançar no seu caminho, contribuindo ainda mais para resolver importantes questões globais, assim como para criar um mundo mais seguro, mais justo e mais confortável”.

“Espero que a China continue a desempenhar este papel de equilíbrio, para um mundo melhor”, Pedro Pires, ex-presidente de Cabo-Verde

As declarações de Pedro Pires foram feitas à Rádio Internacional Chinesa, que levou a cabo uma série de entrevistas com vozes relevantes em África que apoiam a China. E não só na Lusofonia, como se vê, por exemplo, nas declarações ao mesmo órgão de comunicação prestadas pelo ex-presidente da Nigéria. Olesegun Obasanjo destaca os êxitos do PCC, em especial “na erradicação da pobreza, que foi um milagre (…) Não podemos copiar o modelo chinês, mas podemos aprender com as suas experiências”, conclui.

Em Moçambique, a ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação projetou a posição oficial:

A China é um país amigo que tem estado ao lado de Moçambique, dando a sua contribuição nos esforços rumo ao desenvolvimento sustentável do nosso país”.

Verónica Macamo comentava o facto de a China ter doado 13,9 milhões de euros, perdoando outros 7 milhões à dívida moçambicana: “Este gesto é mais um símbolo inequívoco da nossa profunda amizade, solidariedade e cooperação forjados desde os tempos da luta de libertação nacional”, comentou a governante.

COM LULA OU BOLSONARO

No Brasil o apoio é ainda mais relevante, pela importância geoestratégica que tem, pela sua dimensão económica, e pelo feroz combate eleitoral em curso. Bolsonaro, longe de Pequim ideologicamente, foi um dos poucos líderes ocidentais a comprar a vacina chinesa contra a Covid-19, em 2021.

“Parceria essencial para a gestão adequada da pandemia no Brasil”, disse na altura. Já em setembro deste ano, não apoiou nas Nações Unidas a resolução proposta pelos Estados Unidos e aliados europeus para abrir um debate sobre as acusações de violações de direitos humanos na China.

“A China é um país amigo que tem estado ao lado de Moçambique, dando a sua contribuição nos esforços rumo ao desenvolvimento sustentável”, Verónica Macamo, ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique
Leia mais sobre o assunto: Com Bolsonaro ou Lula, China tem de continuar a ser a aposta

Mas é Lula da Silva quem vai mais longe no apoio a Pequim: “A China é um exemplo de desenvolvimento para o mundo. Espero que outros países aprendam a lição para que a gente possa ser mais rico, mais forte e ter mais distribuição de riqueza. Eu trabalhei muito com Hu Jintao a necessidade de uma relação Sul-Sul, de não ficarmos dependentes do Norte como somos dependentes”. Estas declarações, prestadas ao portal chinês Guancha, lançaram um extenso debate nas redes sociais brasileiras, onde se acusava o candidato presidencial de se preparar para “implantar o comunismo chinês já em 2023”.

O jornal Estadão sentiu necessidade de dissecar a entrevista, demonstrando que essa interpretação era feita com base em frases “tiradas do contexto”.

“Para mim, o PCC é a chave dos êxitos de hoje alcançados pela China”,
Ricardo Viegas de Abreu, Ministro dos Transportes em Angola

Mas é um facto que Lula assume nessa mesma entrevista uma visão estratégica: “A gente deveria ter construído uma parceria estratégica também com a Rússia, Índia e África do Sul”.

A questão percebe-se também em números. O Brasil ameaça ultrapassar com a China o valor das trocas comerciais com os Estados Unidos. Só as exportações agrícolas para a China representam dois terços do superavit da sua balança comercial; e 26 por cento das exportações que aliás, em setembro último cresceram 13 por cento em relação a período homólogo.

TAIWAN E A IMPORTÂNCIA DE MACAU

A tensão no estreito de Taiwan é vista a ocidente como uma espécie de farol das intenções de Pequim. Marco Galinha, empresário português que confessa ter boas relações com os americanos, e interesses no mundo lusófono, olha com atenção para os sinais que chegam da China.

“O facto de Xi Jinping ter deixado claro que a reunificação com Taiwan será feita pela via do diálogo tem muita relevância neste momento tenso entre as duas superpotências. É importante que haja discursos conciliadores, quer no Mar do Sul da China, quer em todo o mundo.

Conheço bem o pensamento americano em diversos setores políticos e empresariais. Ninguém quer a guerra, nem essa hipótese faz qualquer sentido”, comenta em declarações ao PLATAFORMA.

“A China é um exemplo
de desenvolvimento para o mundo”, Lula Da Silva, candidato presidencial no Brasil
Leia também: Taiwan diz que China busca “normalizar” atividades militares perto da ilha

Já no que toca a Macau, quer pelo seu enquadramento histórico, quer no contexto da integração na Grande Baía, considera a Região “cada vez mais importante para promover pontes entre culturas e mercados”.

Marco Galinha recorre à História: “Em tempos de crise, tendem a crescer sentimentos nacionalistas e protecionistas. Mas é também a História que nos prova que esse caminho leva a mais problemas e menos soluções. O Grupo BEL, que lidero, tem todo o interesse e está disponível para apostar no mercado chinês. Para nós, com sede em Portugal – e boas relações atlânticas – Macau é naturalmente a nossa porta preferencial para a Grande Baía e a China continental”.

Visão essa reforçada pelo facto de ter “uma relação pessoal e profissional já cimentada com o Kevin Ho, por via dos investimentos que temos no Global Media Group”, conclui.

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