Aumentar a produção agrícola e reduzir os custos de proteção ambiental na América do Sul, usando tecnologias sustentáveis, é o objetivo de um novo centro sino-brasileiro criado esta semana, no âmbito de uma aliança que já inclui seis universidades e empresas brasileiras
A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no estado brasileiro do Rio Grande do Sul, e a Universidade Agrícola do Sul da China (SCAU, na sigla inglesa) assinaram na passada terça-feira, 18 de maio, um acordo para a criação do Centro de Pesquisa e Inovação Brasil-China sobre Agrotecnologias Sustentáveis.
O centro vai promover agrotecnologias sustentáveis que possam aumentar a produção agrícola e, ao mesmo tempo, reduzir os custos de produção e de conservação ambiental, disse ao PLATAFORMA Érico Flores, secretário de Apoio Internacional da UFSM.
A instituição será “muito abrangente”, diz o investigador, apostando em áreas como a mecanização e agricultura inteligentes, a produção e proteção de cultivos, ciência e tecnologia de alimentos e a bioinformática e biomateriais.
Érico Flores sublinha que o centro quer cobrir não apenas a região sul do Brasil, mas também todo o Cone Sul da América do Sul, que abrange ainda o Chile, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai.
“A ideia é que seja um polo em expansão e que outras universidades latino-americanas e chinesas ou mesmo empresas e start-ups privadas se possam juntar a este grupo atual”, sublinhou o dirigente.
Segundo Érico Flores, o centro quer tornar-se uma plataforma de cooperação em pesquisas conjuntas, intercâmbio de estudantes e investigadores, formação de técnicos agrícolas e transferência de tecnologia.
“A gente espera que ainda este ano tenhamos o centro em atividade”, com sede na UFSM, acrescenta o investigador.
O centro nasceu no âmbito da Aliança Sino-Latino Americana de Inovação, Investigação e Educação Agrícola, criada oficialmente em dezembro passado por 46 instituições de 13 países, incluindo a UFSM.
A universidade está a apontar “para a Ásia, em especial com a China”, admite Érico Flores. “A China é hoje o país que mais tem publicado artigos científicos em diversas áreas do conhecimento, além de ser uma potência comercial e tecnológica”, acrescenta.
A UFSM já tinha acordos de cooperação com a Universidade Médica de Fujian, no sudeste da China, e com a Universidade Normal de Hebei, na província que circunda a capital chinesa, Pequim.
Na última terça-feira, foi a vez de mais 10 instituições, incluindo quatro de ensino superior brasileiras, juntarem-se à aliança, diz ao PLATAFORMA Sherry Yuan Juhua, diretora-adjunta do Gabinete de Relações Internacionais da SCAU.
A Universidade Federal de Mato Grosso, a Universidade do Estado de Mato Grosso, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso e a Universidade Federal de Rondonópolis tinham participado, já este mês, numa videoconferência com a SCAU.
“Todas demonstraram interesse em juntar-se à aliança”, sublinha Sherry Yuan.
A videoconferência contou ainda com a presença da Secretaria de Desenvolvimento Económico do Estado de Mato Grosso, da incubadora de start-ups agrícolas Agrihub Space Cuiabá e da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso.
A SCAU e os representantes brasileiros identificaram “potenciais colaborações em áreas específicas”, diz Sherry Yuan, principalmente no âmbito da plantação de soja, milho, frutas e vegetais e na reprodução e criação de animais.
“Estamos muito confiantes sobre esta aliança e acredito que este projeto pode ser útil para os dois lados”, acrescenta.
A iniciativa quer apoiar a América Latina na formação de talentos e na transferência de tecnologia agrícola, sublinha a dirigente chinesa.
“Parte da missão vai passar por cursos de formação tecnológica em que iremos partilhar alguma da tecnologia que já dominamos e está bem madura”, indica Sherry Yuan.
Por essa razão, a aliança integrou, também na passada terça-feira, três empresas, incluindo a primeira brasileira, a subsidiária local do grupo estatal chinês Yuan LongPing High-Tech Agriculture Co Ltd (ver caixa).
A integração de empresas permite à iniciativa alargar o respetivo âmbito a campos como a aquacultura, a maquinaria agrícola e o processamento de produtos alimentares, sublinha Sherry Yuan.
Outro objetivo é a promoção de projetos de investigação conjunta, nomeadamente no combate a pragas e doenças que afetam as plantações agrícolas e a pecuária.
“Se unirmos esforços, creio que nos tornamos mais fortes na procura de uma solução para problemas mútuos que enfrentemos”, diz Sherry Yuan.
“Há alguns dias”, conta a dirigente da SCAU, “recebi um e-mail da Universidade Federal de Santa Maria a pedir ajuda para controlar uma doença que detetaram em plantações locais de arroz”.
Os peritos da universidade chinesa “muito rapidamente” identificaram a causa da doença: uma espécie de mosca, muito comum na China, mas que só agora foi detetada no Brasil, explica Sherry Yuan.
Como o principal parceiro comercial do Brasil, a China “tem interesse em desenvolver tecnologias que permitam uma produção qualificada e sustentável de alimentos” no Brasil, diz Érico Flores.
Mas, acrescenta o investigador, o enorme aumento de produtividade da agricultura brasileira nas últimas duas décadas “só foi possível com a adoção de agrotecnologias que o próprio Brasil desenvolveu”.
“O Brasil tem muito a aprender com as técnicas chinesas, mas tem muito a ensinar também”, defende Érico Flores.
Base chinesa vai investigar variedades de soja no Brasil
A SCAU e o grupo estatal chinês Yuan LongPing High-Tech Agriculture Co Ltd criaram, também passada na terça-feira, uma base para investigar novas variedades de soja no Brasil.
A base situa-se na sede da subsidiária brasileira da Longping, em Jardinópolis, no estado de São Paulo, no sul do Brasil, adianta ainda Sherry Yuan Juhua.
A universidade chinesa tem “uma equipa de investigadores na área da soja que já testou mais de 100 variedades de soja no Brasil, com resultados muito positivos”, explica a responsável.
A Longping é controlada pelo CITIC Group Corp, um conglomerado estatal chinês que no final de 2017 comprou as operações de produção de sementes de milho no Brasil da norte-americana DowDuPont Inc por 1,1 mil milhões de dólares (904 milhões de euros).
O negócio ficou nas mãos da Longping, que, poucos meses depois, numa nota à imprensa informou que o passo seguinte seria entrar no negócio das sementes de soja, através da abertura de centros de investigação para desenvolver novas variedades.
O grupo chinês tem também projetos de plantação de arroz híbrido em Timor-Leste desde 2008, incluindo na Zona de Desenvolvimento da Indústria Agrícola em Natarbora, no sul do país. Em 2016, a Longping, com sede em Hunan, no sul da China, criou ainda um projeto de reprodução de peixe e camarão em águas marinhas costeiras em Timor-Leste.
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