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Futuro de olhos na nuca

Paulo RegoPaulo Rego*

A vida começa a desconfinar. Contudo, por detrás da máscara, que se mantém obrigatória, continua o elefante escondido na sala: o medo do futuro – a submissão aos fantasmas do passado.

Cada vez mais gente faz contas à retoma económica. Esfregam-se as mãos de alívio e deitam-se ao ar adivinhas: quem dera ser já no verão; já não era mau lá para setembro… mas até ao fim do ano certamente tudo volta a ser “como era”. E esse dito “normal” é o maior problema que agora enfrentamos. E é difícil vislumbrar solução, quando se nega enfrentar o real.

Não é mais possível olhar para a frente, mantendo os olhos cravados na nuca. É a mais pura ilusão querer cavalgar o horizonte, levando a carroça cheia de tudo aquilo que já era – foi-se.

É a mais pura ilusão querer cavalgar o horizonte, levando a carroça cheia de tudo aquilo que já era – foi-se.

Curiosamente, até está escrito na escola clássica: em todas as reconversões – voluntárias ou obrigatórias – é preciso vencer a barreira da resistência: pessoas, métodos e convicções, que tudo fazem para que tudo mude, desde que tudo fique na mesma. No fundo, essa é a reação natural da cultura humana. A ditadura da maioria organiza-se para preservar posições e benesses, sejam elas grandes ou pequenas. Porque é o que têm, o que sabem – a zona de conforto que os une uns aos outros, sempre em frente, até ao abismo.

O futuro precisa de elites: minorias visionárias, com poder e vontade de conquistar a mudança. Mas também é preciso que sejam ponderados, humanistas, solidários, porque não lhes cabe só salvarem-se a si próprios, mas todos os outros que lhes resistem e os combatem. É um momento muito sensível – até estranho da história das nações, na interculturalidade e da resiliência.

Vai haver dor, conflitos, lutas figadais pelo poder e pelo espaço da razão. Para estarmos certos, não chega ganhar o futuro – porque tem de o fazer entendendo o passado e trazendo-o consigo. É o momento mais difícil da história do pós-guerra. Mas não há volta a dar. A volta tem mesmo de ser dada.

*Diretor-Geral do Plataforma

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