Quando nos referimos a uma terapia pensamos num processo mediado por um profissional de saúde, baseado no conhecimento científico atual e tendo como objetivo melhorar o estado de saúde de uma pessoa.
O Relatório das Nações Unidas, de Maio de 2020, define as chamadas “terapias de conversão” como “intervenções de natureza ampla, que têm em comum a crença de que a orientação sexual ou identidade de género de uma pessoa pode e deve ser alterada. Tais práticas visam a mudança de pessoas de gays, lésbicas ou bissexuais para heterossexuais e de transexual para cisgénero.” Refere ainda que esta prática “acontece atualmente numa infinidade de países em todas as regiões do mundo. Os agressores incluem prestadores privados e públicos de saúde mental, organizações baseadas na fé, curandeiros tradicionais e agentes do Estado.”
A 17 de maio de 1990 a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da “Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde”, dando origem à celebração do Dia Internacional de Luta contra a Homofobia e Transfobia (IDAHOT). Desde então, esta data é assinalada mundialmente, nomeadamente na Europa, que acolhe anualmente o Fórum IDAHOT, reunindo membros dos Governos, autoridades públicas nacionais e/ou locais e representantes das organizações da sociedade civil na discussão sobre o progresso das políticas LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexo). Em 2018 a disforia de género foi também retirada da lista de doenças da OMS.
Logo as erradamente denominadas “terapias de conversão” não são terapias, pelo simples facto de que a orientação sexual, identidade de género ou expressão de género não são doenças. São caraterísticas pessoais próprias de cada individuo essenciais ao seu equilíbrio, saúde e vivência social. Não há nada que curar.
Pretender que alguém deixe de ser lésbica ou trans, é como pretender que alguém deixe de ser do grupo sanguíneo AB. Primeiro, não há nada de errado em ter esse grupo sanguíneo, ainda que ele seja menos frequente a nível mundial. Ter o grupo sanguíneo AB não é uma doença, nem acarreta qualquer problema social ou de saúde. Segundo é impossível mudar o grupo sanguíneo de alguém. Todas as tentativas para o conseguir só poderão, essas sim, acarretar consequências negativas, tanto físicas, como psicológicas, para quem for alvo dessas “tera-poias”.
O relatório de Victor Madrigal-Borloz ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, lança o apelo à proibição global da prática de “terapias de conversão”, defendendo que, ao interferir na integridade e autonomia pessoais, são “intrinsecamente discriminatórias” e “podem equivaler à tortura, dependendo das circunstâncias, nomeadamente a gravidade da dor e sofrimento físico e mental infligidos.”. São apontadas como consequências ”dor e sofrimento severo e que resultam em danos físicos e psicológicos duradouros”, nomeadamente “perdas significativas de auto-estima, ansiedade, depressão, isolamento social, dificuldade de intimidade, ódio a si próprio, vergonha e culpa, disfunção sexual, ideias ou tentativas de suicídio e sintomas de stress pós-traumático.”
Apesar do amplo consenso científico, a nível internacional e nacional, e dos avanços legislativos em vários países, como Malta e na Alemanha que os proibiram, os esforços de mudança de orientação sexual (SOCE em inglês) continuam a ser levados a cabo em Portugal, sem legislação específica que os proíba.
O Bloco de Esquerda está a preparar uma proposta legislativa que contribua para proteger as pessoas LGBTI, e a sociedade portuguesa no seu todo, destas práticas nocivas e ineficazes que atentam contra a Saúde, a Liberdade e os Direitos Humanos. O preconceito bafiento de alguns não pode sobrepor-se ao conhecimento científico e à legalidade Constitucional, plasmada no seu artigo 13º.
Os esforços de mudança da orientação sexual, identidade e expressão de género têm de deixar de ser uma ameaça que paira sobre as vidas dos jovens, pelo que apelo à assinatura da petição “Pela Ilegalização das ‘Terapias de Conversão’ em Portugal”, que já recolheu mais de 5.000 assinaturas, ou da versão internacional, que conta atualmente com quase 7500 assinaturas.
Portugal preside atualmente ao Conselho da União Europeia e apoia a Resolução do Parlamento Europeu, que proclama a UE como uma zona de liberdade para as pessoas LGBTIQ. Esta resolução destaca que o Parlamento já solicitou aos Estados-Membros que criminalizassem as denominadas práticas de «terapia de conversão».
Juntamos a nossa a outras vozes para eliminar estas práticas perigosas para a saúde e defender a democrática liberdade de ser e amar.
*Deputada do Bloco de Esquerda