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Desperdício alimentar: um problema global de resolução local

Bebiana CunhaBebiana Cunha*

Volta e meia surgem fotografias que mostram o desperdício alimentar em maior escala do que aquele que se vê nos pratos, nos centros comerciais. Àqueles que têm maiores preocupações sociais e ambientais, esta realidade não deixa de chocar nunca. Vivemos a um ritmo alucinante, onde tudo se produz e consome de forma bastante superior ao necessário e cada vez mais desadequada à preservação do nosso planeta. Impera uma visão generalizada e irresponsável de que os recursos do planeta são infinitos, o que tem custos ambientais, económicos e sociais.

Segundo a FAO cada quilo de produtos alimentares desperdiçado corresponde a 4,5 quilos de CO2. Segundo um estudo da FUSIONS (Food Use for Social Innovation by Optimising Waste Prevention Strategies) na UE a produção e destino final dos 88 milhões de toneladas de alimentos desperdiçados anualmente leva à emissão de 170 milhões de toneladas de CO2 e tem um custo estimado de 143 mil milhões de euros. Ao mesmo tempo, a cada dois dias na União Europeia, 55 milhões de pessoas não têm capacidade económica para fazer uma refeição de qualidade. 

O consumo exagerado correlaciona-se positivamente com uma distribuição desequilibrada e uma produção intensiva. Este consumo é muitas vezes desinformado e inconsciente.  E se as políticas da economia circular podem ajudar ao aproveitamento e melhor distribuição de bens materiais como roupa, mobiliário ou brinquedos, quando falamos de produtos alimentares a reflexão sobre a produção, o consumo e a distribuição deveria já estar resolvida, assegurando o caminho para o não desperdício.

Há um outro aspecto sobre o qual parece ser necessário legislar: estabelecer que tudo o que não se vende em superfícies comerciais superiores a 400m2, e que esteja em condições de ser consumido, possa ser doado

Poderia escrever sobre uma maior eficiência de uma alimentação de base vegetal na alimentação humana, mas vou antes alertar para a necessidade urgente de aprofundar a legislação para que se imponha a responsabilidade social e política nesta matéria, contribuindo para um consumo e distribuição de bens mais consciente.

A ONU na sua agenda para um desenvolvimento sustentável indica que até 2030 é fundamental reduzir para metade o desperdício alimentar per capita a nível mundial, de retalho e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e de abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita, e estabelece uma meta indicativa de redução dos resíduos alimentares desperdiçados a nível da União Europeia de 30% até 2025 e de 50% até 2030.

Mas podemos fazer mais em Portugal, no imediato. Podemos legislar no sentido de garantir cadeias de produção mais curtas e de menos km. As atuais regras do mercado fazem com que de manhã vamos ao supermercado e compremos tomates de Múrcia enquanto um habitante de Valência compra tomates do Ribatejo. E este exemplo não é demasiado flagrante ao nível das distâncias mas mostra que ao apostar na produção local e de proximidade no que aos frescos diz respeito, garante-se maior qualidade dos produtos, melhor ganhos sociais e ambientais. E, por isso, as políticas municipais no combate ao desperdício também podem ter um papel fundamental.

Mas há um outro aspecto sobre o qual parece ser necessário legislar: estabelecer que tudo o que não se vende em superfícies comerciais superiores a 400m2, e que esteja em condições de ser consumido, possa ser doado e não desperdiçado. Neste sentido, há que garantir reforços positivos às empresas que adotem medidas com vista à redução do desperdício. Já o propusemos, em 2016, infelizmente foi chumbado, mas insistiremos. 

*Deputada do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) – Portugal

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