Início Política Disputa renhida mantém suspense até ao último minuto

Disputa renhida mantém suspense até ao último minuto

Cabo Verde realiza a 20 de março as eleições legislativas mais disputadas de sempre, uma luta renhida entre PAICV, no poder há 15 anos, e MpD, da qual qualquer um dos lados pode sair vencedor

 

O Movimento para a Democracia (MpD), que candidata a primeiro-ministro o gestor e presidente da câmara da Praia até janeiro, Ulisses Correia e Silva, centrou a sua mensagem na necessidade de mudança após 15 anos de maiorias absolutas do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), que, no seu entender, partidarizaram o Estado e prejudicaram o país. E mudança, significa para o líder “ventoinha”, levar para o Governo o modelo aplicado na gestão da câmara da Praia.

 

Ulisses Correia e Silva encabeça a lista no círculo eleitoral de Santiago Sul, o maior de Cabo Verde, onde concorre diretamente com a líder e candidata a primeira-ministra pelo PAICV, Janira Hopffer Almada, advogada e ministra do Emprego, Recursos Humanos e Família até dezembro de 2015.

 

Numas eleições que analistas consideram mais decisivas para o MpD do que para o PAICV, o grande desafio do partido “ventoinha” é tentar quebrar o ciclo de três maiorias absolutas dos “tambarinas” e regressar ao poder. “Se o MpD voltar a fracassar no contexto em que o PAICV está mais enfraquecido em toda a sua história recente ficará muito difícil obter tão boa oportunidade em pouco tempo e será muito mais provável um outro partido se substituir ao MpD como segunda força política”, defendeu,o analista político cabo-verdiano João Alvarenga.

 

João Alvarenga assinalou ainda que, numa eleição em que 56 por cento do eleitorado não se identifica com nenhum partido, a decisão sobre quem vai governar o país nos próximos cinco anos está nãos mãos dos independentes. Estima, por isso, um escrutínio “muito competitivo”, em que terceira força política, União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID), deverá eleger mais do que os atuais dois deputados. “De um lado está um partido com 15 anos no poder (PAICV) que tentará fazer de tudo para se manter no poder e, do outro lado, o outro partido (MpD) que tentará voltar ao poder após 15 anos”, referiu.

 

Janira Hopffer Almada contrapõe ao discurso de mudança do MpD, a mensagem de continuidade e estabilidade do PAICV. Para Janira Hopffer Almada foram os governos do PAICV que lançaram as bases para o desenvolvimento, com a infraestruturação do país, e, por isso, o partido precisa agora de mais tempo no governo para conseguir implementar “uma nova agenda de transformação” económica centrada na criação de emprego.

 

Sustentada nas avaliações internacionais ao desempenho de Cabo Verde, Janira Hopffer Almada, tem feito por diversas vezes comparações com a governação do MpD, de que Ulisses Correia e Silva foi ministro das Finanças, para convencer o eleitorado de que eleger o opositor seria retroceder à década de 90. O combate ao desemprego foi eleito pelos partidos candidatos às legislativas de março como a principal prioridade, com promessas de geração de milhares de postos de trabalho na primeira legislatura.

 

O PAICV garante que, se ganhar as eleições, têm condições de criar entre 15 mil a 25 mil postos de trabalho por ano durante os primeiros cinco anos de Governo. Por seu lado, o líder do MpD, Ulisses Correia e Silva, acredita que será possível criar 45 mil novos postos de trabalho em cinco anos.

 

Janira Hopffer Almada, que foi a primeira mulher eleita presidente de um partido em Cabo Verde e que, em caso de vitória, poderá tornar-se na primeira mulher a liderar o governo do país, tem apelado durante a campanha para voto feminino, prometendo um novo compromisso com as mulheres. Janira, que tem tido nas ações de campanha a presença de várias personalidades do PAICV e membros do atual governo, teve também o apoio do atual primeiro-ministro José Maria Neves, que se juntou à campanha, para pedir um voto que “faça história” ao eleger uma mulher como primeira-ministra.

 

A campanha, animada por promessas para todos os gostos e à medida das necessidades de desejos de cada ilha, tem sido marcada por várias polémicas com a Comissão Nacional de Eleições (CNE) a ser chamada a intervir. Numa das suas intervenções, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) decretou a proibição do sorteio de habitações do programa governamental “Casa para Todos”, na sequência de uma queixa apresentada pelo MpD.

 

A CNE mandou a Imobiliária Fundiária e Habitat (IFH) suspender a pré-seleção dos beneficiários do programa de habitações sociais “Casa Para Todos”, prevista para durante a campanha eleitoral. A decisão é fundamentada com o facto de se estar a 10 dias das eleições e o Instituto de Fomento da Habitação (IFH), como empresa pública, tem “deveres da neutralidade e imparcialidade perante as diversas candidaturas”.

 

Também em plena campanha eleitoral, o primeiro-ministro José Maria Neves veio deixar a garantia de que não assinaria nenhum contrato de concessão de empresas públicas ou tomaria nenhuma medida estratégica no período eleitoral.

 

José Maria Neves falava à imprensa horas depois de o vice-presidente do principal MpD, Olavo Correia, se ter posicionado contra a alegada intenção do Governo em avançar com a concessão dos portos do país em pleno período eleitoral, defendendo que o contrato seja assinado pelo executivo saído das eleições de 20 de março.

 

A situação da companhia Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV), que enfrenta problemas financeiros – tem um avião arrestado na Holanda e prevê despedir funcionários foi outro dos temas da campanha -, com Ulisses Correia e Silva a exigir do Governo e do PAICV respostas sobre a situação da empresa.

 

Janira Hopffer Almada considerou, por seu lado, que os problemas da TACV são “complexos e estruturais” e lamentou que estejam a ser usados “para fins eleitoralistas”. A candidata da primeira-ministra garantiu que é possível encontrar uma solução para salvar a companhia, adiantando que a várias vezes anunciada privatização da companhia não tem sido fácil. “Se fosse fácil privatizar, quando o MpD foi governo e vendeu todo o país teria vendido também a TACV”, atirou Janira.

 

De um outro debate, entre Janira Hopffer Almada e António Monteiro, da União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID), sobraram também polémicas, por causa dos comentários da líder do PAICV sobre o trabalho e o salário do cabeça de lista daquele partido pelo círculo de Santiago Sul, Péricles Lopes, deixando entender que teria havido favorecimento na sua contratação.

 

O comentário que não foi bem recebido pelo visado, que convocou a imprensa para prestar todos os esclarecimentos sobre o salário e sobre a forma como foi contratado. Péricles Lopes disse que trabalha no Millennium Challenge Account desde 2012 e que chegou ao posto através de um concurso público. Na conferência de imprensa, o candidato não poupou nas palavras sobre Janira Hopffer Almada que acusou de não acreditar “que um cidadão normal, que não é militante de um partido, que não precisa da política para viver, pode estar num partido sem estar à procura de tacho”.

 

“Não sabe o que é um concurso público por desconhecimento do conceito, porque ela e o PAICV não praticam tal coisa”, prosseguiu. “Se a senhora Janira Hopffer Almada praticasse tal coisa não teria tentado nomear o seu próprio marido para membro do conselho de administração do Instituto Nacional de Proteção Social (INPS), instituição que tutelava na época”, acrescentou. “Caso estivéssemos numa sociedade mais exigente, a líder do PAICV estaria presa ou impossibilitada de exercer cargos públicos”, rematou.

 

António Monteiro, que no debate televisivo com Janira Hopffer Almada, viu a sua preparação para liderar um eventual Governo posta em causa, diz que “nada deve em competência” aos candidatos dos outros dois partidos.

 

“Não fazem melhor política, nem colocam mais coração na política”, disse Monteiro, para quem, no dia 20 de março, “não há outra escolha que não seja a UCID”. A UCID, que tem a sua sede nacional e maior base de apoio em São Vicente, acredita conseguir eleger 4 deputados neste círculo, duplicando assim o número de assentos que tem atualmente no parlamento.

 

O partido tem também alertado para a “compra de votos” e criticado o que considera elevados investimentos financeiros dos outros partidos na campanha eleitoral. “Na hora de votar é só você e Deus”, diz Monteiro aos eleitores, nas várias ações de campanha.

 

Também a Igreja Católica de Cabo Verde veio exortar os cabo-verdianos a “não venderem, nem trocarem o seu voto”, apelando para a denúncia de qualquer tentativa de “compra de consciência” dos eleitores. “Apelamos a que denuncie vigorosamente às autoridades competentes toda a tentativa de manipular ou desvirtuar o seu voto, a troco de favores e outros meios ilícitos e antidemocráticos”, adiantam os bispos de Santiago, o cardeal Arlindo Furtado, e do Mindelo, Ildo Fortes. As eleições em Cabo Verde decorrem a 20 de março com seis partidos na corrida aos 72 lugares na Assembleia Nacional.

 

Cristina Ferreira
Exclusivo Lusa/PM

 

 

 

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