O crédito malparado atingiu os 5,5 por cento em novembro do ano passado: 55 mil milhões de patacas; record das duas últimas décadas. Dados divulgados pela Autoridade Monetária de Macau (AMCM) mostram que o montante da dívida sobe há 21 meses consecutivos.
A situação é de tal forma relevante que uma das primeiras iniciativas do novo secretário para a Economia e Finanças foi uma reunião com os dirigentes da AMCM e a Associação de Bancos de Macau, durante a qual Tai Kin Ip afirmou que os bancos, seguimento as suas próprias políticas de crédito, podem continuar a oferecer aos clientes planos flexíveis de reembolso de empréstimos, de modo a aliviar a pressão financeira das PME.
Crédito malparado traz nuvens cinzentas para o ambiente económico
António Félix Pontes, economista
O professor Markus Leibrecht, da Faculdade de Finanças da Universidade da Cidade de Macau, lança o aviso: o volume atual de crédito malparado é “relativamente alto”; e é “notável” o seu rápido aumento, desde 2019. “O nível e extensão [da dívida]; bem como a velocidade das mudanças na taxa de juro, indicam uma exposição relativamente alta ao risco”. Leibrecht alerta para “desafios significativos no futuro próximo”.
António Félix Pontes, economista e antigo presidente da AMCM, considera também “preocupante” a evolução do crédito malparado; reflexo da “periclitante situação económica das PME; e algumas entidades de maior dimensão”. Sublinha que o nível atual constitui um risco sistémico para o setor bancário, porque “introduz um fator de incerteza, com impacto potencial negativo na confiança de depositantes e investidores”, com efeitos adversos no crescimento económico. “Ao mesmo tempo, diminui a capacidade de concessão de crédito, afetando o ritmo de desenvolvimento e aumentando o custo – taxa de juro – dos empréstimos, para particulares e empresas”. Em resumo, o crédito malparado traz nuvens cinzentas para o ambiente económico […] É uma grande dor de cabeça para bancos e regulador”, conclui Pontes.
A longo prazo, tanto os bancos como o Governo precisam de repensar a sua abordagem às análises da qualidade dos ativos e à gestão do risco de crédito
Markus Leibrecht, Faculdade de Finanças da Universidade da Cidade de Macau
Pior para não-residentes
Até 30 de Setembro de 2024, 13 dos 30 bancos com contas publicadas na RAEM registaram prejuízos; 20 dos quais com resultados de exploração inferiores aos do ano anterior. A concessão de crédito imobiliário no Continente – em alguns deles – contribuiu decisivamente para o “panorama sombrio” de crédito malparado, explica Pontes. O rácio do crédito não produtivo ou vencido continua a ser mais elevado nos clientes não-residentes (7 por cento) que nos residentes (4 por cento). O valor dos empréstimos com mais de 90 dias de atraso aumentou 2,9 pontos em termos anuais; e 5,2 pontos desde o final de 2019.
No final de novembro de 2024, o rácio das dívidas em empréstimos hipotecários para habitação registou um crescimento dos 2,6 pontos percentuais relativamente ao período homólogo transato, atingindo 3,4 por cento. Entretanto, o rácio das dívidas não pagas aos empréstimos comerciais para atividades imobiliárias atingiu 4,8 por cento, mais 2,4 pontos que no ano anterior. Para aliviar a pressão, Pontes sugere aos bancos “análise rigorosa da situação financeira dos beneficiários dos empréstimos”; incluindo a capacidade historial na amortização de empréstimos. “Antes dos empréstimos, devem-se obter garantias adequadas e; posteriormente, monitoriza-los continuamente, prestando particular atenção aos primeiros indicadores de alerta e atuando, em conformidade, de forma efetiva”.
Leibrecht defende medidas políticas de curto e longo prazo para mitigar riscos potenciais, exortando os bancos a “considerarem a reestruturação de empréstimos como uma forma de ajudar as empresas com problemas de liquidez. Significa que os bancos dão mais tempo para resolver as dívidas”, explica, destacando opções como a extensão dos prazos, ajustes nas taxas de juros, ou até perdão de dívida”. Além disso, sugere Leibrecht, o Governo deve implementar políticas que fortaleçam financeiramente os bancos; essencial para garantir “capital suficiente para absorver perdas e continuar a emprestar”; e vital para manter um “mercado interbancário estável”.