Cerca de 20 milhões de eleitores em Taiwan vão eleger um novo líder e parlamento a 13 de janeiro, numa das eleições mais disputadas dos últimos anos na ilha.
Após oito anos de governação de Tsai Ing-wen e do Partido Democrático (DPP, na sua sigla em inglês), as sondagens apontam que o partido deve manter-se no poder, com o atual vice-líder da ilha, William Lai Ching-te à frente das eleições com três candidatos de peso.
Hou You-yi, candidato do histórico Partido Nacionalista (KMT), procura trazer o partido que governou a República da China durante a maioria da sua história de volta aos corredores do poder em Taipei.
No entanto, as contas das eleições afiguram-se mais complicadas, com um terceiro candidato, Ko Wen-je, fundador do Partido Popular de Taiwan (TPP, na sua sigla inglesa), a tentar capitalizar descontentamento do eleitorado para com os dois partidos que governaram a ilha desde as primeiras eleições por sufrágio universal em 1996.
Segundo as últimas sondagens da Fundação de Opinião Pública de Taiwan, Lai recebe 32,4 por cento das intenções de voto, seguido de Hou com 28,2 por cento, e Ko Wen-je com 24,6 por cento.
O DPP e Lai rejeitam qualquer negociação que ponha em causa a soberania da ilha, com os candidatos KMT e o TPP a defenderem maiores contactos económicos, turísticos e sociais entre os dois lados.
“Não deve haver um aumento de tensões a curto prazo, pois ambos os lados querem paz e até mesmo o DPP nesta campanha eleitoral argumenta que trará estabilidade e paz se estiver no poder”, diz o politólogo Sonny Lo ao PLATAFORMA.
Durante a campanha, Lai tem mantido que DPP quer preservar a soberania de Taiwan sem endossar uma reunificação, mas sublinhou querer manter a paz na região e retomar o “diálogo” com a China.
Hou e Ko, entretanto, argumentam que o reforço do diálogo e do envolvimento dos dois lados do estreito a nível comercial e institucional é a melhor maneira de salvaguardar autonomia de facto de Taiwan e a paz no estreito.
Os eleitores taiwaneses serão também chamados a votar para os 113 membros do parlamento este sábado, e mesmo que o DPP mantenha a liderança de Taiwan, prevê-se que perca o controlo da legislatura, com o KMT e o TPP a garantir uma possível coligação que bloqueie muitas das iniciativas do partido nos próximos quatro anos.
Mais economia que China
Apesar do peso que as relações entre Pequim e Taipei possam pesar nas mentes dos quase 20 milhões de eleitores na ilha, é esperado que temas mais próximos do quotidiano dos residentes influenciem a sua decisão.
“A relação com a China é provavelmente mais visível nesta campanha do que em 2016, mas menos do que em 2020. Isso não quer dizer que a China não seja importante, pois esta foi uma das questões que diferenciou claramente as partes nos debates. Mas as questões internas receberam uma atenção significativa nesta campanha”, diz Dafydd Fell, diretor do Centro de Estudos de Taiwan de Londres.
O DPP enfrenta o desgaste natural de uma governação de oito anos, e um desempenho económico estagnado, com um crescimento de 1,61 por cento em 2023, o mais lento dos últimos oito anos.
Com um milhão de jovens taiwaneses que completaram 20 anos a votar pela primeira vez nas eleições presidenciais deste sábado, conquistar esta faixa do eleitorado será uma tarefa crucial para os três candidatos.
Para muitos desses eleitores, as maiores preocupações são os baixos salários praticados na ilha, que não conseguem acompanhar o custo de vida crescente, e um mercado imobiliário cada vez mais inacessível.
“O TPP colocou muita ênfase em questões como a justiça habitacional, os baixos salários na sua campanha e o KMT juntou-se ao ataque ao Governo no desempenho económico e fez uma série de acusações de corrupção política”, assinala Fell.
O investigador considera também que a campanha eleitoral foi “relativamente calma” e não espera números de participação tão elevados como em 2016 e 2020, considerando o menor entusiasmo dos eleitores pelos principais partidos na corrida.
‘Um País, Dois Sistemas’
As eleições de 2024 têm a peculiaridade de ter três candidatos que, apesar de se diferenciarem na disponibilidade para falar e negociar com o Governo chinês, não apoiam o princípio ‘Um País, Dois Sistemas’ na sua forma atual como modelo viável para Taiwan.
As regiões especiais administrativas sempre tiveram um papel relevante nos assuntos políticos da Formosa, com Pequim repetidamente a apontar o modelo ‘Um País, Dois Sistemas’ como um dos possíveis modelos de uma possível reunificação.
Para Sonny Lo, os cenários quanto ao princípio são simples, se o DPP vencer este será certamente rejeitado, se o KMT chegar ao poder uma versão “mais liberal” poderia ser aceite.
“No entanto, o princípio necessitará de mais refinamentos e ajustes para torná-lo aceitável e atraente para os residentes de Taiwan”, diz ao PLATAFORMA.
O antigo líder chinês, Deng Xiaoping, que impulsionou a criação do princípio nos anos 1980, propôs inequivocamente que Taiwan poderia manter o seu sistema capitalista da mesma maneira que foi aplicado em Hong Kong e Macau após o retorno das cidades à administração chinesa, em 1997 e 1999, respetivamente.
Os protestos de 2019 em Hong Kong viriam também a influenciar as eleições da ilha no ano seguinte, com o DPP e Tsai Ing-wen a capitalizar na desconfiança do eleitorado para com a aplicação da nova Lei de Segurança Nacional e intervenção de Pequim na RAEHK.
Pouco antes dos protestos em 2019, Han Kuo-yu, na altura presidente da câmara de Kaohsiung, tornou-se o primeiro líder de uma cidade na ilha a visitar as duas RAEs, sendo visto na altura como um sério candidato a retirar o DPP e trazer o KMT ao poder pela primeira vez desde 2016.
No entanto, Tsai viria a ganhar as eleições com um número recorde de 8.1 milhões de votos a favor, com Han a conseguir 5.5 milhões de votos.