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Resultados das eleições distritais convencem Pequim

As primeiras eleições distritais de Hong Kong “só para patriotas” registaram a taxa de participação mais baixa desde a transferência de soberania. Politólogos dizem que a campanha das autoridades para incentivar o voto teve pouco impacto, e que a baixa participação “afeta a legitimidade” dos conselhos distritais. Pequim parabenizou a “realização bem-sucedida” das eleições, dizendo que foram “justas, imparciais, entusiasmadas e ordenadas”

Guilherme Rego

As primeiras eleições distritais de Hong Kong depois da implementação do princípio “patriotas a governar Hong Kong” registaram uma taxa de participação de 27,5 por cento, a mais baixa desde a transferência de soberania para a China. Anteriormente, a participação mais baixa tinha sido em 1999 (35,8 por cento).

O website oficial do Governo informou que apenas 1.2 milhões dos 4.3 milhões de eleitores registados foram às urnas. O Chefe do Executivo de Hong Kong, John Lee, agradeceu a participação nas eleições e afirmou que esta foi “a última peça do puzzle para implementar o princípio de patriotas a governar Hong Kong”.

“A partir de agora, os conselhos distritais deixarão de ser o que eram no passado – uma plataforma para destruir e rejeitar a administração do Governo, para promover a independência de Hong Kong e para pôr em perigo a segurança nacional”, disse Lee depois de ter votado no domingo.

As eleições anteriores foram realizadas no auge dos enormes e muitas vezes violentos protestos contra o Governo, em 2019, registando um máximo histórico de 71 por cento de participação, com uma vitória esmagadora do campo da oposição.

As autoridades da RAE vizinha reformularam a composição dos conselhos no início deste ano. De acordo com as novas regras anunciadas em maio, os lugares para eleição direta foram reduzidos de 462 para 88, sendo os restantes 382 lugares compostos por membros de três comissões nomeadas pelo Governo, membros nomeados e ex officio.

Nenhum candidato de grupos ligados à oposição obteve luz verde para concorrer e mais de 70 por cento dos candidatos diretamente eleitos são membros das comissões.

Participação foi suficiente?

Políticos pró-Pequim disseram ao South China Morning Post que a taxa de participação não desapontou Pequim, uma vez que foi semelhante à das eleições para o Conselho Legislativo de 2021 (30,2 por cento) – a primeira depois da reforma eleitoral conduzida por Pequim e com a ausência do campo de oposição.

Lau Siu-kai, consultor da Associação Chinesa de Estudos de Hong Kong e Macau, um grupo de reflexão semi-oficial de Pequim, disse ao Post que a afluência às urnas não é um indicador importante para determinar o sucesso da votação. “Pequim já estava à espera que o facto de impedir as figuras da oposição de concorrer às eleições pudesse levar a um boicote por parte de alguns apoiantes desse campo”, comentou. Mesmo assim, está confiante de que se os conselhos distritais apresentarem bons resultados, “a afluência às urnas em futuras eleições irá melhorar”.

Segundo o Post, os 180.000 funcionários públicos de Hong Kong foram fortemente incitados a votar, com pelo menos três funcionários de diferentes departamentos a dizerem ao jornal que tiveram de informar as chefias sobre se o tinham feito.

Ma Chi-sing, presidente da Associação dos Funcionários do Governo, refutou esse cenário no domingo, afirmando que não houve qualquer pressão e que estes não foram obrigados a dizer nada às chefias.

Pela primeira vez, o Governo realizou uma série de atividades para incentivar a participação nas urnas. Nas vésperas das eleições houve vários concertos e eventos para encorajar as pessoas a permanecerem na cidade para votar, oferecendo financiamento a lares de idosos para organizarem o transporte dos residentes e distribuindo cartões de agradecimento aos eleitores.

O segundo máximo responsável da cidade, o secretário-chefe para a Administração, Eric Chan Kwok-ki, disse que os eventos pré-eleitorais foram organizados para “fazer os residentes felizes” e fazê-los compreender a importância do voto, e não para aumentar a afluência às urnas.

Sobre os custos dos eventos, disse que as autoridades ainda não fizeram o cálculo, insistindo que se tratava de dinheiro bem gasto, uma vez que as eleições eram importantes tanto para os residentes como para a sociedade.

O presidente da Comissão de Assuntos Eleitorais afirmou que todas as disposições eleitorais conseguiram refletir plenamente os princípios de transparência, honestidade e equidade.

O Departamento para os Assuntos de Hong Kong e Macau, através de um comunicado oficial, parabenizou as eleições “bem-sucedidas” e reiterou que foram “justas, imparciais, entusiasmadas e ordenadas”. “O novo sistema impede efetivamente a entrada de desordeiros anti-China nos conselhos distritais, acabando completamente com os esquemas dos desordeiros anti-China e das forças externas que os apoiam para assumir o controlo da RAEHK por meio de eleições”, cita a Xinhua.

Disse ainda que as eleições foram consensuais, que a sociedade de Hong Kong “percebeu ainda mais que as armadilhas da turbulência de 2019 não devem ser revisitadas” e que “a democracia em Hong Kong deve ser desenvolvida de acordo com a sua realidade”.

Problemas de legitimidade e de futuro harmonioso

“A baixa participação tem impacto na legitimidade dos conselhos”, disse John Burns, especialista em administração pública da Universidade de Hong Kong, ao Post. Na sua opinião, a campanha de mobilização do Governo “sem precedentes” pode ter tido resultados distintos: “Encorajou alguns a votar, mas desincentivou outros”, acrescentando que “esta participação mobilizada tem relativamente pouco valor para aumentar a legitimidade” dos conselhos distritais.

Sonny Lo disse ao Post que os esforços do Governo foram condicionados por uma mensagem promocional que parecia ser demasiado monótona – apenas para lembrar as pessoas de votar no domingo. Por outro lado, diz que os eleitores não tiveram a informação necessária sobre os candidatos para decidir, “mesmo que sejam apoiantes da fação pró-Pequim”.

Para o politólogo, os vencedores terão de aprender a se destacar, já que agora a competição é interna – com candidatos do mesmo campo político, sem oposição. Esta é uma questão que o preocupa, pois prevê que a luta interna possa prejudicar a harmonia social, lembrando que as próximas eleições para o Conselho Legislativo terão lugar em 2025.

Um dos candidatos vencedores, Chris Ip Ngo-tung, da Aliança Democrática para a Melhoria e o Progresso de Hong Kong (DAB), atribuiu a reação morna dos eleitores à revisão das regras eleitorais. “Os nossos eleitores poderão ter de aprender as novas regras, pelo que poderá ser difícil obter uma percentagem muito elevada”, citou o Post.

Detenções de véspera

A polícia deteve pelo menos seis pessoas no domingo. Três delas eram ativistas da Liga dos Sociais-Democratas – um dos últimos grupos de oposição da cidade – que tinham planeado organizar um protesto.

A polícia começou por acusar o trio de “tentar incitar outras pessoas a perturbar as eleições para os conselhos distritais” e, mais tarde, apresentou-os à Comissão Independente Contra a Corrupção (ICAC) por suspeita de “incitar outras pessoas a não votar”.

Na sexta-feira, a polícia de segurança nacional deteve um homem de 77 anos por “tentativa de cometer atos sediciosos”. Na semana passada, um homem de 38 anos foi acusado incitar o boicote das eleições, por ter publicado um vídeo de um comentador estrangeiro que, alegadamente, tinha esse objetivo.
Os membros recém-eleitos do CD iniciarão o seu mandato de quatro anos a 1 de janeiro de 2024.

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