A decisão do governo da RAEM de Macau de adiar a emissão de licenças de táxi adicionais devido à pandemia criou uma situação de escassez de táxis disponíveis nas ruas da cidade. A qualidade do serviço continua abaixo do necessário, com representantes da indústria hoteleira e de táxis a apontarem que à medida que mais viajantes individuais regressam a Macau, as autoridades não só deviam emitir mais licenças, mas também desenvolver uma plataforma online que torne o serviço mais acessível
A pobre qualidade do serviço dos táxis locais foi durante muitos anos uma queixa recorrente entre residentes e turistas da cidade. Com a escassez de clientes a gerar uma mudança na atitude dos motoristas locais durante a pandemia, a reabertura da cidade parece ter reatado algumas das más práticas dos táxis locais.
Ao mesmo tempo, o número de táxis disponíveis na RAEM neste momento parece ser também insuficiente para responder à maior procura por parte de residentes e visitantes.
O presidente do Conselho da Indústria de Viagens de Macau, Andy Wu Keng Kuong, indica ao PLATAFORMA que cada vez mais turistas em Macau são viajantes individuais, com a procura de táxis na cidade por este grupo de visitantes agora maior do que a de turistas em excursões.
A procura por táxis também é alta por participantes em eventos MICE, que Macau pretende desenvolver, com este setor de transportes muito importante para a indústria local de turismo.
De acordo com o Instituto de Estatística de Macau, no primeiro trimestre de 2023, o número de visitantes que entraram na cidade atingiu 4.948.400, um aumento de 163 por cento em relação ao ano anterior.
No primeiro dia da Semana Dourada do Dia do Trabalho deste ano, o número de visitantes em Macau ultrapassou 100.000 num único dia. A Direcção dos Serviços de Turismo (DST) informou na terça-feira que as chegadas diárias médias de visitantes em Macau estabilizaram em 60.000.
Até ao fim do primeiro trimestre de 2023, cerca de 1.391 táxis regulares e 300 táxis especiais, que fornecem serviço de táxi sob chamada, estavam em serviço. De acordo com os números oficiais mais recentes, no fim de 2021 existiam 23.160 detentores de uma licença profissional válida de motorista de táxi.
Ao PLATAFORMA, Tai Kam Leong, Vice-Presidente Executivo da Associação dos Taxistas de Macau, aponta que muitos motoristas de táxi qualificados têm tido dificuldade em encontrar um táxi para alugar e dirigir.
Ao mesmo tempo, Tai aponta que o número atual de táxis não é suficiente para atender à procura.
Relatos de experiências negativas espalham-se sempre para longe e rápido, portanto devemos realmente tentar resolver o problema dos táxis na cidade
Rutger Verschuren, Vice Chairman da Associação de Hotéis de Macau
No pico de 2019, existiam cerca de 1.900 em operação, um número que já mal conseguia corresponder às necessidades de viagem nos feriados, mas nos dias úteis veem-se mais táxis vazios.
O Vice-Presidente da Associação de Hotéis de Macau, Rutger Verschuren, considera que de momento, os turistas são “vítimas do sistema de táxis em Macau”.
Verschuren considera que a situação atual está a prejudicar o turismo e a indústria MICE na cidade, ressalvando que muitos hóspedes queixam-se de ser muito difícil arranjar um táxi para o transporte de um determinado hotel para outro, e que às vezes até perdem conexões para voos ou outros compromissos.
“Isto não é bom e é um problema que precisa de ser olhado com muita seriedade. Relatos de experiências negativas espalham-se sempre para longe e rápido, portanto devemos realmente tentar resolver o problema dos táxis na cidade.”
Uma plataforma móvel de táxis o caminho a seguir?
O professor Jianhua Xu da Universidade de Macau sugere que os táxis por chamada e os tradicionais poderiam complementar-se e desempenhar um melhor papel em corresponder à atual procura do mercado.
“Os serviços de táxi online são mais flexíveis e podem haver muitos motoristas que não trabalham a tempo inteiro, mas aceitam pedidos de acordo com os seus empregos e a procura do mercado,” descreve.
Alfred Wong é mais cautelosos e avisa que se um sistema de uso de carros particulares para transporte, ao estilo da Uber ou Didi, for introduzido em Macau, poderão ocorrer problemas devido aos diferentes requisitos regulamentares para táxi e carro particular de Macau.
“A indústria de táxis está vinculada a regulamentações do setor. Agora as condições económicas estão melhores, mas se carros particulares forem introduzidos isto afetará seriamente a indústria de táxis.”
O representante do setor nota também que atualmente já é possível chamar um táxi especial através da aplicação da Macau Rádio Taxi.
Como representante da indústria de táxis, Tai Kam Leong acredita que o uso de plataformas de chamada é uma tendência geral.
Tai lembra como a associação há alguns anos atrás uma plataforma de chamada de táxis foi criada, mas que a capacidade limitada da indústria e a falta de divulgação levaram a um baixo uso. Agora espera que o Governo possa ajudar a promover essa plataforma.
O presidente da Associação dos Hoteleiros de Macau, Lou Chi Leong, diz ao PLATAFORMA que cidades vizinhas como Zhuhai possuem já várias aplicações móveis para reserva de táxis, como a Ruqi, Ucar e 58tongcheng, o que resolveu o problema de encontrar táxis, e espera que o Governo de Macau possa implementar algo semelhante.
Rutger Verschuren destaca também que deveriam existir mais métodos de pagamento móvel disponíveis nos carros.
“De momento apenas os rádio-táxi possuem uma aplicação mas deveria haver uma plataforma unificada para todos os táxis, que torne o processo menos complicado.”
Outra solução para corresponder à atual procura, poderia claro, passar por permitir um sistema de transporte como a Uber.
“Em alguns países europeus os motoristas do Uber obtêm uma matricula de táxi, e antes de se tornarem motoristas têm que passar por um período de treino. Esta poderia ser uma solução que o governo possa considerar para acompanhar um os tempos. Já passaram muitos anos desde que a Uber entrou e saiu de Macau. Com as novas tecnologias que existem nesta nova era, podemos tentar coisas novas.”
Refira-se que a Uber anunciou a suspensão da atividade em Macau em 2017, ao cabo de dois anos em que acumulou mais de dez milhões de patacas em multas aplicada pelas autoridades locais.
Na altura o serviço da Uber foi considerado ilegal pelas autoridades de Macau, com várias multas de 30 000 patacas aplicadas em casos em que veículos utilizados em serviço remunerado com finalidade diferente da autorizada ou da constante da sua matrícula.
Menos 500 táxis
Em Macau, é necessário obter uma licença de táxi e uma carteira de motorista para dirigir um táxi. Antes da entrega de Macau, foram concedidas 650 licenças permanentes de táxi, e desde 2005, as licenças foram emitidas por um período de 10 e 8 anos por meio de licitação aberta.
O Presidente da Associação Geral dos Taxistas de Macau, Kuok Leong Son, indicou num fórum da Ou Mun Tin Toi que 100 licenças de táxi devem expirar em 2024, deixando apenas cerca de 1.300 táxis disponíveis.
Rutger Verschuren sugere que o Governo aumente o período de validade das mesmas ou considere aumentar as tarifas iniciais de curta distância para aumentar o número de táxis disponíveis.
“Isso não significa que uma viagem da Península a Coloane deva ser mais cara, mas as viagens curtas serão mais”, sugere.
Em julho de 2019, 10 associações de táxis propuseram um aumento da tarifa de MOP19 para MOP22 e uma redução do salto do metro de 240 metros para MOP2 para 220 metros.
Se o Governo aceitar a proposta, o preço inicial da tarifa de transporte aumentará 15,8 por cento.
Se o planeamento da indústria de táxis em Macau não seguir na direção de resolver os problemas de viagem das pessoas, mesmo que mais licenças de táxi sejam emitidas, o problema não será resolvido
Leng Sai Vai, Presidente da Associação Geral dos Comerciantes de Trânsito e de Transporte de Macau
Por outro lado, o Presidente da Associação Geral dos Comerciantes de Trânsito e Transporte de Macau, Leng Sai Vai, aponta que os 400 táxis removidos são todos “táxis pretos”, mas que o número de táxis especiais em Macau aumentou para 300.
Lena acredita que a chave para resolver as atuais dificuldades passam por aumentar o número de táxis especiais.
“Se o planeamento da indústria de táxis em Macau não seguir na direção de resolver os problemas de viagem das pessoas, mesmo que mais licenças de táxi sejam emitidas, o problema não será resolvido.”
Dinheiro rápido
Como um dos meios de transporte público mais importantes de Macau, a indústria de táxis tem sido alvo de críticas devido a vários problemas, desde atendimento mau, cobranças excessivas, recusa em levar passageiros e outras irregularidades.
Durante muito tempo a situação caótica dos táxis de Macau afetou seriamente a imagem da cidade como centro turístico e causou muita insatisfação entre os moradores locais e turistas.
Jianhua Xu, professor associado do Departamento de Sociologia da Universidade de Macau, realizou um estudo sobre esse fenómeno social, onde aponta que a sociedade de Macau como um todo desenvolveu uma “cultura de jogo” e uma “forte cultura de dinheiro rápido”.
“Alguns dos motoristas de táxi podem ter vindo das salas VIP e estão acostumados a ganhar dinheiro rápido. O seu objetivo principal não é fornecer um bom serviço mas ganhar dinheiro,” indica.
Janice, uma residente local, descreve ao PLATAFORMA como foi ignorada quando acenou para um táxi desocupado na beira da estrada perto do Nova Mall na Taipa na semana passada, enquanto chovia intensamente.
“Depois de o táxi recusar-se a levar nossa família de quatro pessoas, o motorista parou a dois ou três metros de mim e deixou um estrangeiro entrar. Fiquei muito irritada,” disse.
Janice ligou para a central de reclamações, mas desistiu porque o operador indicou que teria que esperar que a polícia de trânsito chegasse ao local antes de poder lidar com a reclamação.
Jianhua Xu descreve que com a introdução da lei do Regime Jurídico do Transporte de Passageiros em Automóveis Ligeiros de Aluguer em 2019, que fortaleceu a regulamentação dos motoristas de táxi, a cobrança ilegal de tarifas excessivas foi reduzida, mas a mentalidade de obter dinheiro rápido não mudou.
“[Os motoristas de táxis] cometem menos infrações, mas sua atitude de serviço não mudou e ainda é muito má,” avisa Xu.
Alguns dos motoristas de táxi podem ter vindo das salas VIP e estão acostumados a ganhar dinheiro rápido. O seu objetivo principal não é fornecer um bom serviço mas ganhar dinheiro
Jianhua Xu,Professor associado do Departamento de Sociologia da Universidade de Macau
O ex-vice-presidente do Conselho Consultivo do Trânsito, Alfred Wong, acredita que a nova lei melhorou muito o problema do serviço de táxis em Macau, especialmente porque violações graves repetidas podem levar à revogação das licenças, o que tem um efeito dissuasor mais forte.
No entanto, avisa que com o regresso dos turistas a Macau o caos no serviço de táxis parece estar outra vez a aumentar.
“Embora a nova lei que regulamenta o setor tenha possibilitado a monitorização efetiva do problema de abordagem e cobrança excessiva de táxis, um amigo contou-me que situações de cobrança excessiva de tarifas são difíceis de capturar pelos atuais equipamentos de vigilância,” indica.
Tai Kam Leong, representante da indústria de táxis, aponta que se houver motoristas individuais que tenham violado as regras, as autoridades podem enviar mais inspetores para monitorar os motoristas.
Alfred Wong concorda que com a recuperação da indústria do turismo de Macau muitas pessoas estão a entrar na indústria com o propósito de “ganhar dinheiro rápido”.
“O Governo deve fortalecer as patrulhas nos pontos negros onde os táxis cobram tarifas excessivas e se recusam a apanhar passageiros”.
