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Fórum Macau: “A parte política e comercial estão sempre de mãos dadas”

Paulo Rego

O secretário-geral do Fórum Macau assume a relevância estratégica que a China dá à missão de Ho Iat Seng a Portugal. No contexto de uma agenda lusófona na qual “Macau tem um posicionamento muito importante, e único, dentro da China”

Paulo Rego, jornalista e diretor-geral do PLATAFORMA, à conversa com Ji Xianzheng, secretário-geral do Fórum Macau

Ji Xianzheng é o primeiro alto responsável chinês a reagir de viva voz à visita do Chefe do Executivo (CE) a Portugal, notícia avançada na semana passada pelo PLATAFORMA, que nesta edição explica a importância que Portugal lhe está a dar (ver páginas 4 a 6). Em declarações ao nosso jornal, o secretário-geral do Fórum Macau explica que Pequim vê “nesta estrutura multilateral um complemento a estes momentos de cooperação bilateral”, em si mesmos “essenciais”.

Por isso, lembra, “a parte política e comercial estão sempre de mãos dadas”, razão pela qual “o Fórum e o Governo da RAEM têm sempre cooperado numa ótica comum de promoção das relações comerciais e da amizade entre a China e todos os países da família deste Fórum”. Neste contexto, Ji Xianzheng – nomeado pelo Ministério do Comércio – assume o caráter estratégico desta missão da RAEM a Portugal:

“Esta visita, que ainda não é oficial, é muito importante”. Porque “Macau tem um posicionamento muito importante, e único, dentro da China”. Razão pela qual, “desde o primeiro dia, o Fórum apoia a construção desta plataforma; que faz parte do plano de ação da Conferência Ministerial”.

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Nesse contexto, em conversas informais durante o almoço que na quarta-feira o Fórum Macau ofereceu à imprensa de língua portuguesa e inglesa de Macau, o PLATAFORMA percecionou alguma expectativa em torno do regresso da Conferência Ministerial como farol político da cooperação sino-lusófona (prevista para outubro, segundo a Rádio Macau).

Pela circunstância de que se comemora este ano o 20º aniversário do Fórum (criado em 2003), mas também por se sair de uma paralisia a que a crise pandémica tudo sujeitou. Especula-se por isso sobre a presença na RAEM de delegações chefiadas ao mais alto nível.

O secretário-geral do Fórum Macau abordou o maior tema da atualidade de Macau, a visita de Ho Iat Seng a Portugal, referindo que a RAEM “tem um posicionamento muito importante, e único, dentro da China”. “Razão pela a qual, desde o primeiro dia, o Fórum apoia a construção desta plataforma; que faz parte do plano de ação da Conferência Ministerial”, explica o mesmo responsável.

“Provavelmente chefes de governo”, admite um dos delegados lusófonos ao Fórum, garantindo que será dada resposta proporcional ao nível que a China estará a propor. Na conversa com o PLATAFORMA – sem nunca se referir à Conferência Ministerial – Ji Xianzheng foi claro em relação às expectativas alimentadas pela chegada de um novo ciclo, no campo dos contactos bilaterais: “Este período pós-pandémico vai certamente contribuir para uma dinâmica reforçada nesse sentido”, incluindo “o reforço da cooperação entre o Fórum e as autoridades da RAEM, que sempre atribuíram grande importância às relações com Portugal e todos os países da família do Fórum”.

“TIMING IMPORTANTÍSSIMO”

O presidente da Associação dos Macaenses considera a visita do CE a Portugal “extremamente importante”. Até pelo “timing”, que é “importantíssimo!”. Miguel de Senna Fernandes considera a missão “absolutamente oportuna”, com “impacto especial para a comunidade portuguesa em Macau, que ainda vive temores criados durante a pandemia. O que se viveu, com uma certa angústia, espero que seja apaziguado. O Governo [de Macau] sabe quão importante é a presença da comunidade portuguesa, porque a língua e a cultura precisam de substrato humano que suporte isto tudo”.

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Senna Fernandes reconhece que haverá “outros temas na agenda; coisas a ver com a China, Portugal e Macau”. Contudo, insiste, este é “um sinal importantíssimo que tinha de ser dado à comunidade portuguesa em Macau. Como sabemos – e é notório – houve um relativo êxodo para Portugal”, porque a pandemia “veio provocar decisões que noutras circunstâncias não teriam sido tomadas”. É verdade que “enclausurou todas as comunidades, mas para quem tem família fora os efeitos psicológicos foram tremendos, levando as pessoas a reequacionarem a presença em Macau”.

“O que se viveu, com uma certa angústia, espero que seja apaziguado. O Governo sabe quão importante é a presença da comunidade portuguesa, porque a língua e a cultura precisam de substrato humano que suporte isto tudo”, Miguel de Senna Fernandes, presidente da Associação dos Macaenses.

A reflexão sobre a viagem de Ho Iat Seng é ainda “especulativa”, pois “não sabemos o que leva na manga para falar com as autoridades em Lisboa”. Contudo, “em termos simbólicos, não passa despercebido a um português que viva em Macau – e logo na sequência da abertura das fronteiras a ocidente”.

Senna Fernandes descreve o que sentiu ao ler a notícia do PLATAFORMA: “A primeira impressão que tive foi a reafirmação da importância da comunidade portuguesa. Isto é bom, se vier ao encontro do que especulo, e reata o diálogo, bem como tudo o resto entretanto interrompido. O CE, de várias maneiras, reafirmou a importância da língua portuguesa, naturalmente o prato forte da agenda que vai levar. E quem é falante da língua sabe como isso é muito bom”.

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Questionado sobre o que espera das autoridades portuguesas, Senna Fernandes responde com menos entusiasmo: “O que sempre esperei – abertura formal para o diálogo”. Mas isso já lhe parece pouco: “Só por si, não interessa a ninguém em Macau. O que interessa é o que vem depois. Afinal, o que tem Portugal a oferecer? No fundo, tem de investir nisto; não pode ficar pela boa vontade e discurso bonito. É preciso maior correspondência e fomentar o investimento em Macau, já a pensar na Grande Baía. Que tipo de abertura Macau terá para o investimento português? Que atrativos poderá oferecer? É isto que aguardo saber, com muita expectativa. Julgo que o CE tem isso em mente, neste contexto e neste timing. Oxalá corresponda ao que estou à espera”.

“NOVA OPORTUNIDADE”

A presidente da Casa de Portugal, Amélia António, uma das vozes que denunciou as dificuldades que a crise pandémica impôs à comunidade portuguesa, reage com otimismo à deslocação de Ho Iat Seng: “Acho ótimo que a primeira visita fora de Macau se faça a Portugal”.

Primeiro, “dadas as relações existentes”; mas “sobretudo se entendermos que é o espelho do entendimento que Pequim tem sobre a colaboração entre Macau e Portugal”. Aliás, reconhece a advogada, “o momento em que se dá – logo a seguir à abertura – torna esta visita ainda mais importante”. Mesmo desconhecendo a agenda do CE, Amélia António espera que esta visita, “extremamente importante, reative e reforce os canais de colaboração mútua”.

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Nomeadamente ao nível da “cultura, da saúde, do ensino… e até na área jurídica”. Porque “havendo acordos feitos, que às vezes parecem um bocadinho esquecidos… se aquilo que se afirma relativamente ao entendimento de Pequim corresponde à realidade, inevitavelmente há coisas que têm de se reativar e de se fazer”.

“Acho ótimo que esta primeira visita para fora de Macau se faça a Portugal. Por um lado, dadas as relações existentes; por outro, sobretudo se entendermos que é o espelho do entendimento que Pequim tem da colaboração entre Macau e Portugal”, Amélia António, presidente da Casa de Portugal.

Se, do lado de Macau, esta visita “vem de certa maneira dar-nos alguma confiança e fazer-nos acreditar que aquilo que é dito não são meras palavras”, também do lado de Portugal se espera a consciência de que se abre uma “nova oportunidade” estratégica. Amélia António recorda a chegada de “um novo cônsul, um novo representante do AICEP, um novo delegado ao Fórum Macau…” mas também que “há já cá instaladas associações [como a Casa de Portugal] e Portugal pode ajudar essas pedras todas a posicionarem-se melhor no tabuleiro”.

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Ou seja, “deve ter uma posição mais dinâmica de apoio nas áreas onde pode haver reforço de colaboração e ajudar-nos a ter um papel mais ativo nessas áreas, que são determinantes para manter parte da identidade de Macau. Há estruturas no terreno que Portugal pode utilizar para desenvolver esse reforço”.

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