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“Se há coisa que aprendi nesta indústria foi a respeitar o produto”

Guilherme Rego

David Abreu, 28 anos, natural do Ribatejo, Portugal, já conta com um longo percurso na restauração. Há cerca de oito meses, decidiu fazer as malas e sair de Inglaterra, de um prestigiado restaurante com três estrelas Michelin, e continuar a carreira a oriente. Tudo isto coincidiu com o início da pandemia de Covid-19. Numa conversa com o PLATAFORMA, o chef conta-nos as experiências pelo mundo da cozinha, até hoje.

“Nesta vida só dava para ser uma de duas coisas: ou jogador de futebol, ou cozinheiro”, confessa. David ingressou na Escola de Salvaterra de Magos após ter chumbado duas vezes no oitavo ano. Aqui, acabou por ver que a cozinha seria o destino. “O futebol não deu, então a cozinha foi a vertente que vingou. Na escola nunca tive muito sucesso e felizmente os meus pais tiveram muita paciência comigo e perceberam que num curso mais prático, com mais técnica, poderia ter sucesso”, explica.

Com 15 anos, David Abreu preparava-se para o mundo do trabalho. Os verões passavam e a cozinha parecia ser mais a sua “praia”, enquanto os amigos aproveitavam as férias de outra forma. “O meu primeiro estágio em cozinha foi em Peniche (…) e o segundo no Algarve, no Pestana Viking. Curiosamente, no meio disso, fiz umas férias de verão no restaurante Ilha do Arroz, na Comporta. “Os meus amigos todos de férias, na boa vida e eu já a trabalhar no duro. Via a praia, mas raramente lá ia e comecei a perceber o que era esta indústria, em que temos de dar um pouco de nós para termos sucesso, para que as coisas sigam para a frente. Percebi isso com essa experiência”, diz.

Depois de acabar a escola, os poucos anos traduzem-se em várias experiências por Lisboa e Cascais. O que mais marcou David Abreu foi o Grande Real Villa Itália, em Cascais, dado o compromisso duradouro que ali manteve. “Foi o restaurante onde estive mais tempo, onde aprendi mais e também onde apostaram bastante em mim. Viram- me valor apesar de na altura ser muito novo. Queria fazer de tudo um pouco mas eles conseguiram traçar-me um caminho bom e eu segui-o”, lembra. Antes de ir para Inglaterra, onde mais tarde teve a experiência de trabalhar num restaurante com três estrelas Michelin, David Abreu esteve no Ritz Four Seasons de Lisboa que tem muito mediatismo e é considerado um dos melhores de Portugal. Foi esse trabalho que lhe proporcionou a ida para Terras de Sua Majestade. Não tivesse aceitado “uma pequena despromoção”, tudo poderia ter sido diferente…

“O chef Pascal, do Ritz, gostou de mim e fez uma proposta. Curiosamente até desci de posição e passei a receber me- nos. Mas sem medos, parti para esta nova etapa”, recorda. David Abreu vê esse momento como uma lição. “Isto é a vida e tem de se aceitar este tipo de coisas”, afima.

Dar um passo atrás para dar dois em frente resultou para o jovem chef. Aos 25 anos, estava em Inglaterra. Pouco tempo depois, foi trabalhar numa das cozinhas francesas mais prestigiadas da Europa. No entanto, embora confesse que tenha aprendido imenso, não foi por aí que a história de David terminou. “Optei por ir embora porque a vida que estava a levar em Inglaterra era muito intensa. A vida que levamos num restaurante de três estrelas é difícil e acaba- mos por não ter vida pessoal”, assinala. Uma pessoa que precisa de novas aventuras viu a próxima em Macau, ao leme do restaurante António, na Vila da Taipa.

“Surgiu esta proposta de ir para Macau E pensei… Porque não? Vou aprender cozinha asiática. Há muita coisa boa para se extrair desta cozinha”, destaca. O chef chegou em fevereiro deste ano, numa altura em que a pandemia de co- vid-19 já era uma realidade na região mais a oriente. “Toda a gente em Portugal estava receosa de eu vir porque o vírus ainda só estava por aqui (China). Passado um mês a situação inverteu- se. A RAEM reagiu muito bem a esta situação. É incrível como conseguem ser organizados a este ponto”, salienta.

Macau não era totalmente desconhecido para David Abreu. “A história de Portugal é uma coisa que me fascina e já sabia muito sobre este sítio e até me entusiasmava bastante vir cá um dia (…) enfim, cheguei numa altura em que Macau não é propriamente Macau, mas por isso mesmo também consegui ver esta região com outros olhos”, reflete.

A falta do ingrediente especial de Macau, que também alimenta e muito os restaurante – o turismo – não tira o sono a David, que está extremamente empenhado em absorver a sabedoria gastronómica enraízada na cultura macaense. “O que me interessa mais são os produtos que nunca vi, os métodos de confeção diferentes, é muito interessante ver a maneira como se processa a comida aqui. Tem sido espetacular o que tenho vivido”, atira.

No fim da entrevista, o chef fala sobre ter um restaurante amigo do ambiente e sustentável. Entende que a base está em respeitar o produtor, e nunca gastar. “Se há coisa que aprendi nesta indústria foi isto: respeitar o produto. Há pessoas que não têm nada disso, e desde que cheguei tenho tentado incutir essa mentalidade nos funcionários. Passo-me quando vai alguma coisa que não está estragada para o lixo”, conclui.

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