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Bolsa de Futuros…humanos

Arsénio Reis*

Há duas indústrias no mundo que chamam aos seus clientes utilizadores (users): a do tráfico de droga e a indústria dos produtores de software. Esta é uma ideias que integra um dos mais recentes documentários da Netflix, que se chama “O dilema das Redes Sociais” (“The Social Dilemma”).

Baseado no depoimento de várias figuras que tiveram diferentes tipos de responsabilidades em empresas como a Google, o Facebook, o Instagram e outras redes sociais, o documentário acaba por aproximar as duas indústrias que mencionei.

Perpassa – ao longo de uma hora e meia – a tese de que redes sociais são uma espécie de droga, muitas vezes a primeira que consumimos mal abrimos os olhos pela manhã e a última que utilizamos antes de fechar os olhos no final do dia.

Mas estes 90 minutos não nos deixam descansar explicando como ao longo dos nossos dias vamos alimentando essa dependência digital. Uma dependência que é induzida de forma estudada e testada por empresas que têm meios poderosos e que são hoje as mais valiosas no mundo. Foi em algumas dessas que os protagonistas do documentário trabalharam.

A batalha é pouco justa. Frente a frente um hardware com milhares de anos (ainda que tenha evoluído), o nosso cérebro, do outro milhares de supercomputadores geridos por alguns dos melhores engenheiros e especialistas do mundo nessa área. É possível imaginar quem pode vir a ganhar…

Um mágico – ainda que seja inculto – desde que bom profissional consegue enganar o maior especialista em qualquer área científica que exista à face da terra.

Por isso é que este é um negócio de “futuros”. O que está em causa é o futuro dos humanos. Um negócio que se baseia em previsões, na antecipação do que podemos desejar e assenta na necessidade de recolher tanta informação quanto possível para que as previsões sejam cada vez mais acertadas.

Cada uma das atitudes que assumimos online é registada, analisada, estudada e usada para nos servirem aquilo que nos levará a continuar a fazer likes, publicar comentários, enviar fotografias e descrever tudo o que gostamos e não gostamos na vida. Aquilo que lhes alimenta o negócio ao longo de várias horas por dia. Todos os dias.

Claro que muitas coisas boas acontecerem nas redes sociais. Só para dar alguns exemplos: foi possível encontrar amigos e familiares que de outra forma teríamos perdido, foi possível encontrar muita rapidamente dadores de órgãos compatíveis permitindo salvar as pessoas que deles necessitavam.

Mas há um lado B que não estamos – na opinião de muitos dos que foram ouvidos no documentário – a conseguir gerir. Não estamos porque a regulação dos gigantes em que se transformaram estas empresas tem muitas falhas e está longe de ser eficaz. E porque este é um modelo de negócio muito difícil de combater.

Eles exploram zonas do cérebro semelhantes às que sempre foram exploradas pela magia. Um mágico – ainda que seja inculto – desde que bom profissional consegue enganar o maior especialista em qualquer área científica que exista à face da terra.

E parece que é mais fácil enganar o cérebro com mentiras ou desinformação. A verdade é muitas vezes mais chata e difícil de entender.

*Diretor do PLATAFORMA

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Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

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