O Ministério dos Negócios Estrangeiros em Portugal disse na sexta-feira à Lusa que está a acompanhar o caso do estudante de Hong Kong com passaporte português detido na China, que estará há 12 dias sem contacto de familiares nem advogado.
“O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), através das suas representações consulares, está a acompanhar o caso do Senhor Kok Tsz Lun, mantendo contactos com o seu advogado e com as autoridades chinesas competentes”, pode ler-se na nota enviada em resposta a questões feitas pela agência Lusa.
A Lusa questionou hoje o MNE sobre a situação do estudante de 19 anos, com dupla nacionalidade portuguesa e chinesa, detido em Shenzhen, na China, por alegada travessia ilegal, após ter sido intercetado na embarcação em que seguia com ativistas pró-democracia pela guarda costeira da província chinesa de Guandgong, em 23 de agosto, quando se dirigiam a Taiwan.
Segundo o advogado do jovem em Hong Kong, onde enfrenta acusações relacionadas com a participação nos protestos pró-democracia no território, no ano passado, a mãe do jovem contratou um advogado chinês em Shenzhen, mas a polícia recusou-lhe esta manhã o acesso.
“A polícia chinesa disse ao advogado que a investigação do caso não está concluída, e que [Kok] não tem o direito de ver um advogado”, contou hoje à Lusa o advogado em Hong Kong, que pediu para não ser identificado. “Já são 12 dias em total isolamento”, acrescentou.
A Lusa questionou o MNE sobre se considera tomar alguma iniciativa em relação à recusa de acesso ao advogado.
Em resposta, o gabinete de Augusto Santos Silva informou que “a China não reconhece a dupla nacionalidade a cidadãos chineses”.
Kok “é residente permanente em Hong Kong e detentor de dupla nacionalidade chinesa e portuguesa […]. O regime jurídico da China não reconhece a dupla nacionalidade a cidadãos chineses. A sua situação continuará a ser seguida nos termos dos Acordos Bilaterais e do Direito Internacional vigente”, pode ler-se na nota, que não presta mais esclarecimentos.
Na segunda-feira, o consulado português em Macau já tinha dito à Lusa que a China só reconhece o passaporte português “enquanto documento de viagem não atributivo da nacionalidade”, o que limita a intervenção das autoridades portuguesas “ao domínio humanitário, procurando assegurar que o detido se encontra bem, que lhe seja dispensado um tratamento digno e que possa ser defendido por um advogado”.
Uma posição criticada hoje pelo advogado em Hong Kong, que defendeu, em declarações à Lusa, que o jovem, cujo pai tem cidadania portuguesa, é “cidadão português” de pleno direito, lamentando que o consulado não tenha informações sobre a sua situação, numa altura em que a família e o advogado na China continuam sem conseguir falar com Kok.
“Não se pode dizer que ele tinha um documento de viagem, ele é legal e tecnicamente um cidadão português”, apontou o advogado.
Tsz Lun Kok tinha sido detido em 18 de novembro, com outras centenas de estudantes, durante o cerco da polícia à Universidade Politécnica de Hong Kong (PolyU), que se prolongou de 17 a 29 desse mês, tendo terminado com a invasão dos agentes ao campus universitário, onde a polícia diz ter encontrado milhares de bombas incendiárias e armas.
O jovem é acusado de motim, por ter participado alegadamente numa manobra para desviar as atenções da polícia que cercou as instalações do campus, com o objetivo de permitir a fuga de estudantes refugiados no seu interior.
Kok, que estudava engenharia noutra universidade, foi detido na área de Mong Kok, perto da PolyU, e enfrenta ainda acusações de posse de “instrumentos passíveis de uso ilegal”, disse o advogado, precisando que, ao contrário do que a polícia de Hong Kong afirmou na quinta-feira à Lusa, não está acusado de posse de armas.
O jovem deveria ser ouvido no tribunal de Tuen Mun, em Hong Kong, em 25 de setembro, mas o advogado desconhece se a polícia da China o vai manter detido por travessia ilegal.
Aprovada em 30 de junho, a lei da segurança nacional, considerada uma resposta de Pequim ao protestos pró-democracia em Hong Kong, sob administração chinesa desde 1997, levou vários ativistas a refugiar-se no Reino Unido e Taiwan, para onde fugiram muitos manifestantes em busca de asilo.
No barco onde seguia o jovem com passaporte português encontravam-se mais 11 pessoas, incluindo Andy Li, ativista pró-democracia detido no mesmo dia da detenção de Jimmy Lai, proprietário do jornal Apple Daily, numa operação da nova unidade policial criada pela lei de segurança, segundo o jornal South China Morning Post, que cita fontes policiais.