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À volta das nomeações

Analistas avaliam a indicação de ex-altos quadros para o exercício de novas funções. À partida, as escolhas merecem opinião positiva. José Luís Sales Marques e Ron Lam U Tou comentaram ainda os novos secretários e o modelo seguido por Ho Iat Seng na formação do quinto Executivo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).

O presidente do Instituto de Estudos Europeus de Macau (IEEM), José Sales Marques, considerou que a nomeação de Alexis Tam, ex-secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, para dirigir a Delegação Económica e Comercial de Macau em Lisboa e Bruxelas pode potenciar a presença da RAEM em Portugal e junto da União Europeia.

“Alexis Tam tem todas as condições para o papel para o qual foi nomeado. Penso mesmo que é um upgrade. Pela experiência pode potenciar significativamente a presença de Macau em Lisboa e em Bruxelas e defender e projetar os interesses da região”, disse Sales Marques que afirma “conhecer bem” o antigo governante de diversos organismos por onde passaram.

Na opinião de Ron Lam U Tou, da Associação Sinergia de Macau e antigo candidato à Assembleia Legislativa local, a ida de Alexis Tam para Lisboa é vista como “uma mudança normal”. 

“Nos últimos cinco anos, fez coisas boas e outras menos boas. No setor médico, colocou muitos recursos. Vimos algumas mudanças, designadamente avanços na construção do futuro Hospital das Ilhas”, afirmou. Para o analista não há muito a discutir nesta nomeação. “Precisamos de esperar e ver qual é o resultado”.

O lugar da supervisão 

Sales Marques entendeu que Ho Iat Seng ao indicar a ex-secretária para a Administração e Justiça Sónia Chan para o novo Gabinete para o Planeamento da Supervisão dos Ativos Públicos da região – uma unidade de missão – “pretende contar com alguém que passou anteriormente pelo Conselho Executivo e pelo Governo”, podendo “retirar as vantagens de uma forte experiência e de um relacionamento que vem de longe com a Assembleia Legislativa (AL)”.

“Acredito que tanto a AL como Governo queiram um maior controlo dos ativos das empresas públicas, de fundos e dos dinheiros públicos. Este gabinete é um novo dossier e Sónia Chan vai ter seguramente de trabalhar na formulação legislativa, pois trata-se de um área em que será preciso criar e propor legislação”, previu.

Para o economista, está-se perante “uma área que é e será uma mais-valia para Sónia Chan”. 

“Há pouca informação e por isso é necessário um grande diálogo com a AL e ela tem todas as condições para o fazer, olhando para a sua experiência”, concluiu.

Sobre a nomeação de Sónia Chan, Ron Lam U Tou classificou-a como importante, já que o novo gabinete “vai monitorizar 17 fundos autónomos e empresas de capitais públicos acerca dos quais a população [e o próprio, confessou] tem pouco ou nenhum conhecimento” de como funcionam.

“Este tipo de monitorização, ou reforma, é muito importante”, apontou, dando como exemplo da necessidade de fiscalizar estes organismos os acontecimentos de 2016, quando a Fundação Macau doou 100 milhões de yuan à Universidade de Jinan, situação que levou ao pedido de supervisão daquela instituição.

“O problema não era apenas os 100 milhões, mas a falta de transparência”, acentuou, recordando que a Fundação está sob a tutela do Chefe do Executivo.

Para Lam, as nomeações de Sónia Chan e de Alexis Tam, “objetivamente falando, são vistas como uma situação razoável”. 

E justificou: “Nos últimos 20 anos, um dos grandes problemas, foi a manutenção das pessoas nos cargos por dez ou vinte anos”, uma situação que defendeu “é preciso quebrar” para acabar com “essa mentalidade” de se perpetuarem nos cargos.

“Por se mudar de lugar ou para um nível mais baixo da administração, isso não significa que a respetiva carreira política está perdida”, defendeu.

A saída de Lionel Leong de secretário para a Economia e Finanças mereceu também a avaliação dos dois analistas.

Para Sales Marques, Lionel Leong é “um homem com uma experiência riquíssima” que, “além de ter terminado funções como secretário da Economia e Finanças, é um antigo membro da Assembleia Popular Nacional, do Conselho Executivo, e tem também uma carreira empresarial. O anúncio de que vai enveredar nos próximos tempos pela vida académica só pode valorizar todo esse passado”. 

O dirigente da Associação Sinergia de Macau começou por recordar que Lionel Leong chegou a manifestar disponibilidade para se candidatar a líder do Governo.

“Infelizmente, a eleição do Chefe do Executivo deste ano decorreu sem competição e isso não é um bom caminho para o desenvolvimento político de Macau”, enfatizou. 

Segundo disse, “terá sido uma escolha pessoal de Lionel Leong não se candidatar e não permanecer como secretário”.“Espero que no futuro haja mais pessoas que queiram servir a sociedade apesar de pensarem e terem uma atitude política diferente da administração. Neste momento, o sistema político de Macau não se encaixa numa situação em que pessoas com ideias diferentes possam trabalhar juntas. Lionel Leong é um desses exemplos”, atirou. 

A pista de O Lam 

A nomeação da até agora chefe de Gabinete de Chui Sai On, O Lam, para vice-presidente do Instituto para os Assuntos Municipais (IAM), segundo Sales Marques, dever ser olhada “como a de alguém que vai ocupar um cargo de grande relevância”. E justificou essa importância com a recém nomeação do antigo titular do cargo, Lei Wai Nong, para para secretário da Economia e Finanças.

“O cargo permite uma visão da sociedade de Macau como mais nenhum outro. Trabalha-se diretamente com as pessoas, as associações, a chamada sociedade civil”, disse o também antigo presidente do Leal Senado e da Câmara Municipal Provisória de Macau, organismos que antecederam o atual instituto.

E prosseguiu: “O topo do IAM é um espaço privilegiado para observar a sociedade, é um lugar de carater executivo, de ligação à população”.

Os dois observadores deixaram ainda as respetivas avaliações às escolhas de Ho Iat Seng para o quinto Governo da RAEM, com Sales Marques a lembrar que, por serem da competência do Chefe do Executivo este “não tem de dizer publicamente quais as razões que o levaram à decisão”.

“Montou a equipa olhando para os perfis mais adequados para a ideia do que quer para o Governo de Macau. Todos têm uma experiência bastante rica. Dois deles, os que continuam [Wong Sio Chak, Segurança, e Raimundo do Rosário, Transportes e Obras Públicas], são claramente competentes. Já o mostraram e neste âmbito, os estilos pessoais são secundarizados. O importante é dominarem os assuntos que tutelam”, continuou.

Os restantes três – André Cheong (Administração e Justiça), Lei Wai Nong (Economia e Finanças) e Ao Ieong U (Assuntos Sociais e Cultura) – representam, para o analista, “a renovação”, e devem ser lidas como correspondendo “a uma certa ideia que o Chefe do Executivo tem vindo a revelar para Macau”.

“No Caso de André Cheong, é alguém muito experiente e com um perfil conhecido do público. Chega do Comissariado Contra a Corrupção, tendo passado pela direção dos Assuntos dos Serviços de Justiça. Tem uma bagagem imensa. Entende as grandes questões e os desafios que se colocam à Administração de Macau e também à Justiça. Tem todas as condições para fazer um bom trabalho, um upgrade nestas áreas. Já terá dado a entender que a prioridade da ação passa pela reforma da administração pública”, acrescentou.

Escolas com novas regras

Dos restantes novos membros do Executivo – Lei Wai Nong (Economia e Finanças) e Ao Ieong U (Assuntos Sociais e Cultura) – Sales reconheceu que “não há tanto conhecimento público” dos respetivos perfis. 

“Mas, seguramente, vão exercer os cargos com competência. Chegaram, vão avaliar, estudar e lá para março/abril do próximo ano vão ter oportunidade de defender as respetivas damas durante o debate das Linhas de Ação Governativa (LAG), na Assembleia Legislativa”, concluiu.

Ron Lam U Tou entendeu que a atitude do novo chefe do Governo ao nomear os secretários “mostra que há uma quebra da inércia relacionada com a regra dessa escolha”.

“No passado, se não houvesse motivos, o mandato era renovado. Neste momento, o pensamento sobre a nomeação para cargos governativos foi alterado. Agora, a questão não é poderem permanecer nas funções. O importante é saber se são as pessoas adequadas para a posição”, avaliou. 

Para Ron Lam U Tou, “esta mudança voltou-se para a direção certa”. 

“Nos últimos 20 anos, existia uma cultura que não era boa, que se pode definir assim: ‘se fizer pouco, cometo poucos erros, se não fizer nada, nunca me engano´”, ironizou.

“Ora – prosseguiu – um funcionário pode pensar que, sob uma liderança assim pode manter a respetiva posição no futuro. Isso causará baixa eficiência administrativa e más condições da cooperação entre diferentes departamentos, mantendo o índice de popularidade em baixo”. 

Todavia, o analista interrogou-se se Macau está “mesmo perante um novo estilo de nomeação de secretários ou até de diretores de serviço”, deixando de imediato a resposta: “Ainda é preciso esperar para ver. O importante é que o governante ou funcionário, se não apresentarem resultados, precisam de ser trocados. É uma boa direção a seguir”. 

António Bilrero, Johnson Chao 27.12.2019

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