Início Lusofonia Angola na ordem

Angola na ordem

Em pouco mais de um mês, e apenas em sete das 18 províncias, Angola repatriou, oficialmente de “forma voluntária”, mais de 400 mil estrangeiros ilegais. As autoridades apreenderam mais de um milhão de dólares norte-americanos, 17 mil quilates de diamantes e 51 armas de fogo. Encerrou quase 300 casas de compra e venda de diamantes,  e mais de 90 cooperativas garimpeiras.

As autoridades angolanas falam em saldo positivo. A “Operação Transparência”, levada a cabo pelas forças de segurança, começou a 25 de setembro e abrangeu, na primeira fase, as províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico, Bié, Cuando Cubango, Malanje e Uíje, com o intuito de combater a imigração ilegal e a exploração indevida de diamantes.

Não há uma estimativa segura sobre qual o montante global que Angola – que continua a atravessar uma crise económica só comparável com a do início da independência, em 1975, e aos anos da guerra civil, terminada em 2002 – perde anualmente com o comércio ilegal de diamantes.

O certo é que, para Luanda, a “Operação Transparência” está a ter resultados de tal forma positivos que a iniciativa vai ser estendida a mais quatro províncias – Moxico, Bengo, Zaire e Luanda -, onde se concentra uma elevada população de cidadãos estrangeiros e que, segundo o comandante e coordenador da iniciativa estão a “prejudicar a economia angolana”.

“Naqueles lugares onde o foco do garimpo era intenso, esses locais estão, hoje, sob o controlo da Polícia Nacional e das forças integrantes do sistema de defesa nacional”, garantiu António Bernardo, lembrando que a operação não tem por fim acabar definitivamente com a atividade de exploração e extração de diamantes.

“Visa, tão somente, repor a ordem constitucional, funcional e estrutural de todos os agentes públicos ou privados que queiram desenvolver a atividade, pelo que pedimos um pouco de paciência”, sublinhou. O responsável admitiu que as décadas e décadas de desleixo permitiram chegar a uma situação de caos, e que os garimpeiros e respetivos “ajudantes” vivem e operam em condições miseráveis.

ONU obrigada a apoiar

Se a operação acaba por ter “lógica”, tal como assumiu o coordenador do Sistema das Nações Unidas (SNU) em Angola, Paolo Balladelli, o reverso da medalha coloca-se do outro lado da fronteira, sobretudo com a República Democrática do Congo (RDC), para onde tem ido a grande maioria dos ilegais.

A saída dos mais de 400 mil estrangeiros é um indicador de que é necessário trabalhar na política de migrações em Angola, afirmam as autoridades de Luanda. Agola tem deixado nas mãos da RDC e das diferentes agências das Nações Unidas a resolução de um outro problema que entretanto surgiu: o dos milhares de congoleses que estão agora “no lado de lá”. A ONU fala da necessidade de apoio financeiro para poder ajudar “cerca de 300 mil refugiados no seu próprio país”.

Na operação, registaram-se alguns incidentes, como o incendiar de bandeiras angolanas na RDC, intensamente divulgada nas redes sociais e prontamente desdramatizados pela polícia angolana. As autoridades dizem tratar-se de “situações pontuais”, que não deixa de estar certo tendo em conta a ausência de protestos veementes das autoridades de Kinshasa. A capital do Congo só se tem limitado a insistir na necessidade de se proceder a um inquérito e promete que não haverá retaliação.

Cerca de duas semanas após o início da operação, o Governo angolano informou o embaixador da RDC em Luanda, Didier Kazadi Nyembwa, sobre os procedimentos em curso nas sete províncias. O diplomata congolês agradeceu o esclarecimento e prometeu reportá-lo “fielmente” ao Governo de Kinshasa, acrescentando ainda que as relações entre os dois países “continuam saudáveis” e que “não haverá retaliação contra os angolanos” que residem no país.

Logo após o início da operação, cujos pormenores só começaram a ser conhecidos publicamente cerca de duas semanas depois, e após as agressões a comerciantes congoleses registadas num mercado de Saurimo, capital da província diamantífera da Lunda Sul, as autoridades angolanas ordenaram uma espécie de “tolerância zero” contra eventuais atos de xenofobia em relação aos ilegais, avisando que qualquer incidente será “duramente punido”.

“Angola não é um país xenófobo e não é um país fechado à comunidade internacional. Antes pelo contrário, o que queremos é ter um país organizado onde todos se pautam pelo primado da lei e da concórdia”, referiu António Bernardo.

Operação Resgate

A “Operação Transparência” é mais uma das medidas do Presidente angolano, João Lourenço, para mudar a imagem de Angola junto da comunidade internacional, mas também para pôr cobro aos sucessivos atos de corrupção e de caos na economia do país. Não por acaso, a iniciativa será levada a cabo paralelamente, já em novembro e em todo o território, com a “Operação Resgate”, destinada a dar continuidade ao combate à imigração ilegal, mas também à crescente criminalidade.

E se estes dois objetivos são o “título da notícia”, a forma como será realizada e o que pretende atingir é muito mais vasto, pois abarca também a venda desordenada, a insalubridade pública e o resgate da ética e postura administrativas, pois o destino final é repor a autoridade do Estado em todo o país, pelo que será “repressiva, mas pedagógica”.

“A operação visará desde a venda desordenada, à ambulante não organizada, às travessias fora das pedonais, à venda ilegal de aparelhos de comunicação nas ruas ou mercados e reparação desses equipamentos fora dos locais indicados”, entre outros objetivos. O Governo já disse que estarão mobilizados todos os agentes da sociedade.

“A operação visa repor valores que fomos perdendo ao longo dos tempos e será feita para que não choquemos com a integridade das pessoas, mas é fundamental que elas também colaborem. O grande objetivo inicial é sensibilizar e mobilizar os cidadãos porque a operação vai começar em breve”, frisou António Bernardo.

A intenção de moralização da sociedade angolana abrange a própria polícia nacional. O comandante geral da Polícia angolana, Paulo de Almeida, já assumiu que vários agentes policiais praticam “burlas, falsificações e extorsões a cidadãos”, prometendo combater as “batatas podres” no seio da corporação.

Lembrando que a “Operação Resgate” visa essencialmente o “resgate do civismo, da ordem, da conduta sã e da dignidade”, Paulo de Almeida avisou que a ordem “deve começar no seio da polícia”, reconhecendo que vários agentes praticam “burlas, falsificações e extorsões a cidadãos”, que necessitam de ser neutralizados.

O responsável criticou ainda a postura de agentes da corporação, sobretudo pelo “uso desordenado da farda” e por alguns ostentarem “barrigas avantajadas”, alertando que tais presenças em público “ofuscam a autoridade policial”.

“Às vezes, vejo que alguns camaradas parecem uns ‘Trinitás’, com as calças em cima. O atavio tem regras. A autoridade do polícia também vem na forma como nos vestimos e na nossa postura. O polícia deve cuidar do seu corpo, porque isso também traz autoridade”, sublinhou. 

José Sousa Dias 09.11.2018

Exclusivo Lusa/Plataforma Macau

Contate-nos

Meio de comunicação social generalista, com foco na relação entre os Países de Língua Portuguesa e a China

Plataforma Studio

Newsletter

Subscreva a Newsletter Plataforma para se manter a par de tudo!