José Eduardo dos Santos volta, em agosto, a ser candidato único à liderança do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder no país desde 1975, mas é a sua sucessão que alimenta os dias que antecedem o congresso de Luanda.
Entre vários membros do atual Governo e sobretudo os filhos, Isabel dos Santos e José Filomeno dos Santos, a imprensa local tem vindo a atirar nomes para cima da mesa da linha de sucessão de José Eduardo dos Santos, mas tão pouco o modelo de transição do poder é conhecido, tendo em conta as eleições gerais agendadas para agosto de 2017 no país.
Contactadas pela Lusa, fontes do partido em Luanda não arriscam qualquer cenário, sendo certo que tudo estará dependente da opção a tomar pelo próprio José Eduardo dos Santos, sobre o seu sucessor: diretamente da carreira política do partido ou de fora, do empresariado, como os filhos.
No poder há praticamente 37 anos, após a morte, em setembro de 1979, do primeiro Presidente angolano, António Agostinho Neto, o líder do MPLA e chefe de Estado fez em março o anúncio que desde logo condicionou o partido: “Em 2012, em eleições gerais, fui eleito Presidente da República e empossado para cumprir um mandato que nos termos da Constituição da República termina em 2017. Assim, eu tomei a decisão de deixar a vida política ativa em 2018”.
Contudo, o que José Eduardo dos Santos estrategicamente não clarificou até agora foram os moldes em que será feita a sua saída da vida política e sequer se ainda estará disponível para concorrer às eleições gerais de 2017, antes da sua retirada.
Apesar do anúncio, feito na 11.ª reunião ordinária do Comité Central do MPLA, já então convocada para preparar o VII congresso ordinário do partido agendado para 17 a 20 agosto, em Luanda, no mesmo dia acabou por ser aprovada a recandidatura de José Eduardo dos Santos ao cargo, formalizada quase quatro meses depois. Até 14 de julho, nenhuma outra candidatura apareceu e volta a concorrer sozinho, pelo que a grande dúvida do congresso passa pela escolha dos nomes para o Comité Central do partido – depois de o presidente ter anunciado uma renovação de quase metade dos dirigentes – e sobretudo quem concorre às eleições de 2017.
A esta questão, que em Luanda ninguém arrisca responder com certezas, coloca-se ainda saber se José Eduardo dos Santos pretende voltar a encabeçar a lista, independentemente da sua anunciada saída em 2018, e nesse cenário também o número dois, face à aparentemente fragilizada posição de Manuel Vicente.
É que o atual vice-Presidente de República liderou antes a petrolífera estatal Sonangol, que se encontra uma profunda crise financeira, e as investigações da Justiça portuguesa à sua atividade tiveram eco igualmente em Angola. Ao ponto de ter emitido um comunicado, a 2 de março: “Sou completamente alheio, nomeadamente, à contratação de um magistrado do Ministério Público português para funções no setor privado, bem como a qualquer pagamento de que se diz ter beneficiado, conforme relatos da comunicação social, alegadamente por uma sociedade com a qual eu não tinha nenhuma espécie de relação, e que não era nem nunca foi subsidiária da Sonangol”.
O atual vice-Presidente de Angola reagia às notícias sobre o seu suposto envolvimentos em factos relacionados com a investigação da “operação Fizz”, conduzida pelas autoridades judiciárias portugueses, e que levou à detenção e prisão preventiva de Orlando Figueira, antigo procurador do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).
Já o anúncio da saída em 2018 do Presidente José Eduardo dos Santos não deixou de constituir uma “surpresa” admitida em março pelo secretário-geral do MPLA, Julião Paulo “Dino Matrosse”, mas que afirmou que o “partido está preparado para todas as circunstâncias”.
“Ainda é só um anúncio, ainda não temos que fazer comentário sobre isso. O camarada Presidente como pessoa, como estadista, ele é angolano, tem a idade que tem, está há algum tempo no poder e acha que há um determinado prazo, que deverá sair da gestão ativa do país”, disse o secretário-geral do MPLA, num dos poucos comentários da cúpula do partido.
Os filhos e hipotéticos fortes candidatos à sucessão do pai
A nomeação de José Filomeno dos Santos pelo pai, José Eduardo dos Santos, para presidente do conselho de administração do Fundo Soberano de Angola – que gere uma carteira de investimentos de cinco mil milhões de dólares proveniente das receitas fiscais da venda de petróleo -, coloca-o, desde 2013, na possível linha de sucessão.
Com 38 anos, José Filomeno dos Santos fundou um banco em Angola, em 2008, depois de fazer a formação académica na Europa, e já em 2015 foi reconduzido à frente do Fundo Soberano de Angola pelo pai e chefe de Estado. Era apontado, até ao início deste ano, como um forte candidato à sucessão de José Eduardo dos Santos.
Do outro lado está agora, aparentemente, a meia-irmã Isabel dos Santos, filha mais velha de José Eduardo dos Santos, com 44 anos, e a única nascida ainda durante o período da luta anticolonial em Angola. Tornou-se numa conhecida empresária com interesses e participações sobretudo em bancos e telecomunicações em Portugal e Angola, sendo considerada hoje como a mulher mais rica de África.
Aparentemente fez uma pausa na gestão dos seus negócios quando, em junho último, aceitou a nomeação do pai para liderar a reforma da Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol), como presidente do conselho de administração e administradora não executiva da maior empresa (pública) do país, responsável por mais de metade das receitas do Orçamento Geral do Estado angolano.
Desde essa nomeação que é apontada como possível sucessora de José Eduardo dos Santos, também na sequência de vários investimentos que fez em Angola nos últimos meses, enquanto empresária, o último dos quais em maio quando lançou a primeira de 10 lojas da nova marca de hipermercados “Candando”.
Contudo, em ocasiões diferentes, os dois irmãos já negaram publicamente qualquer ambição política em Angola, apesar de serem militantes ativos nas estruturas locais do MPLA.
Quase 2.600 delegados vão escolher presidente e Comité Central do MPLA
O congresso ordinário do MPLA, que decorre na capital angolana entre 17 e 20 de agosto, envolverá 2.591 delegados, de acordo com uma informação enviada à Lusa pelo Bureau Político do Comité Central do MPLA.
Entre outras questões, os delegados eleitos desde abril em todas as 18 províncias juntamente com os secretários provinciais do partido vão escolher o presidente do MPLA – cujo único candidato é José Eduardo dos Santos – e os mais de 300 membros Comité Central, além de preparar as eleições gerais de 2017.
Contudo, de acordo com fonte do partido, o programa do congresso só será divulgado, previsivelmente, a partir de 15 de agosto, dois dias antes do seu início.
Paulo Julião-Exclusivo Lusa/Plataforma