O politólogo brasileiro Fábio de Sá e Silva defende que a Presidente brasileira valorize o diálogo com a sociedade civil, que acabe com o financiamento empresarial aos partidos e que taxe as grandes fortunas. Em entrevista ao Plataforma Macau, Sá e Silva, que é também professor de Direito, recusou dar o PT como morto mas defendeu que o partido tem que enviar sinais à sociedade e às suas bases.
Plataforma Macau – Na sua interpretação, partidos históricos, como o PDT e o PSDB estão assumindo posições contra a sua própria identidade. Mas isso não se deve apenas ao facto de se pretenderem demarcar do PT?
Fábio de Sá e Silva – Sim e não. Teoricamente seria possível a esses partidos adotarem discursos e principalmente práticas que se descolassem daquilo que se tornou problemático no PT, como acusações de corrupção e de falta de transparência, sem que abandonassem compromissos substantivos com direitos humanos ou direitos dos trabalhadores.
Mas aí entra outro ingrediente de nossa atual situação política, que é a projeção adquirida por setores mais conservadores e mais radicais, galvazindo as oposições ao PT e trazendo o debate para a direita do espetro político. Isso tudo mostra falta de lideranças alternativas ao PT no centro e na centro-esquerda, além de maior articulação da direita. Tudo é um pouco facilitado pela estrutura do sistema político-eleitoral e da mídia, ambos os quais facilitam a ascensão de grupos à direita.
P.M. – O PT ainda poderá recuperar a “capacidade de liderança dos setores progressistas em torno de um projeto de transformação social”?
F.S.S. – O PT ainda dispõe de boas condições para isso, tais como a liderança de Lula e a firmeza no compromisso com trabalhadores e minorias, na qual só é acompanhado pelo PSOL e pelo PCdoB.
Mas precisa dar novos sinais para a sociedade e até mesmo para as suas bases. Sinais de que está disposto a levar adiante novas práticas políticas, enquanto partido, e a avançar em seu compromisso substantivo com a inclusão, quando governo.
Quando a corrupção na Petrobras foi descoberta, por exemplo, sugeri que o PT devesse abrir mão do financiamento empresarial e cobrar dos demais partidos que fizessem o mesmo. A medida é radical e talvez custasse a viabilidade eleitoral de muitos candidatos petistas nas eleições a prefeito de 2016. “É tudo o que a direita sonha,” disseram alguns de meus amigos petistas. Mas diante de situações limites, entendo que não se pode fazer “business as usual”. Já no governo, ajudaria, por exemplo, que Dilma valorizasse mais o diálogo com grupos e movimentos sociais, por meio dos conselhos e das conferências, ou que incluísse em seu ajuste fiscal a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas. Trata-se, enfim, de mostrar de que lado se está.
P.M. – As manifestações contra Dilma são apenas um fenómeno promovido pela dirteita e pelos media ou há uma base popular na contestação?
F.S.S. – Todas as pesquisas de opinião feitas até agora deixam claro que quem tem comparecido a essas manifestações são eleitores de direita, da elite. Isso não quer dizer que não haja descontentamento e apreensão entre setores populares quanto ao governo Dilma, mas você não verá eleitores de Dilma pedindo impeachment ou vestindo verde-amarelo em número significativo.
Por isso, mais uma vez, cabe a Dilma e seu governo fortalecerem os vínculos com sua base e, respeitando a divergência, afirmarem a autoridade do projeto político que emergiu das urnas.
Há um problema de governabilidade e pode ser necessário negociar com um Congresso mais conservador, porém com iniciativa, clareza de propósitos e maior capacidade de comunicação essa é uma batalha que pode ser travada e ganha pelo governo em muitos aspectos. De todo modo, é uma batalha própria da democracia e muito diferente daquela que Dilma trava hoje frente a forças políticas de inspiração muito mais golpista.
Luís Andrade de Sá