Modelos de fiscalização alfandegária não agrada aos homens de negócios de Moçambique
Para controlar e facilitar o comércio internacional, Moçambique adoptou em 2006 o sistema de Inspecção Não Intrusiva (INI) de mercadorias. A introdução desta tecnologia no controlo aduaneiro visava também conferir maior segurança nas transações comerciais internacionais, com a consequente redução de tempo no desembaraço aduaneiro.
Contudo, apesar de os agentes económicos referirem que o processo trouxe vantagens no controlo de mercadorias, continuam a lamentar os elevados custos derivados da operação. Os scanners são geridos pela Kudumba, uma firma detida em 35% pela SPI – o braço financeiro da Frelimo – numa sociedade que era também controlada por Ghassan Ali Ahmad, que em vida tinha interesses na Home Center, com o general João Américo Mpfumo.
Com recurso a um estudo encomendado pela Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) e elaborado pela firma de auditoria e consultoria Sal & Caldeira – advogados, os empresários apelam ao Governo para isentar as taxas de inspeção para o caso das exportações. Em relação às importações e trânsito, defendem o ajustamento das taxas, de modo a não incidirem sobre a totalidade dos bens ou mercadorias, mas, sim, sobre os bens e mercadorias que efetivamente passem por uma ou pelas duas etapas de INI.
Denominada “Estudo de revisão legal e análise comparativa da inspeção não intrusiva de mercadorias em Moçambique”, a avaliação faz notar que atualmente, quando um agente importa mercadorias, a entidade responsável pela inspeção escolhe uma amostra para passar pelo processo de verificação (scan), mas o importador é obrigado a pagar o valor das taxas referentes a toda a mercadoria, mesmo a que não tenha sido sujeita a controlo. Esse procedimento é considerado oportunismo, injusto e penalizador para os agentes económicos, o que impõe a revisão da fórmula.
MODELO “PENALIZADOR”
O “Estudo de revisão legal e análise comparativa da inspeção não intrusiva de mercadorias em Moçambique” compara os custos de INI em Moçambique com o mesmo processo na África Sul, Tanzâ- nia e Ilhas Maurícias. Na África do Sul e Maurícias, o processo está isento de pagamento de qualquer taxa, enquanto na Tanzânia paga-se apenas 0,6% do preço FOB (Free on Board), para as importações. As exportações também estão livres daquele encargo, com exceção de alguns produtos. Deste modo, os agentes económicos pedem a revisão do modelo vigente no país, considerando-o bastante penalizador, tendo em conta que as taxas são aplicadas às exportações, importações, trânsito e contentores vazios, encomendados para transportar mercadorias. O estudo aponta ainda que, com a introdução deste sistema, esperava-se mais celeridade no processo, mas há congestionamentos e atrasos no desalfandegamento das mercadorias. A título ilustrativo, os empresários ouvidos na pesquisa queixam-se do facto de o scan usado no porto de Maputo ser fixo, situação que torna o processo mais moroso, enquanto no porto de Nacala é móvel, o que pode contribuir para que haja celeridade. A avaliação destaca também que o sucesso da INI implica a existência da capacidade de pré-selecionar ou detetar as remessas de alto risco para inspecção e advoga a necessidade de clarificação dos mecanismos utilizados para determinar qual dos três canais (vermelho, amarelo e verde) deve tomar cada carga ou bem.
Como uma das saídas para o problema provocado pela utilização da inspeção intrusiva, o estudo recomenda a criação de uma entidade central visando coordenar todos os intervenientes e analisar a possibilidade de agregar todas as taxas existentes ou adoção de um mecanismo para a facilitação cada vez mais do pagamento das taxas.
Reagindo ao estudo, a diretora nacional de apoio ao sector priva- do no Ministério da Indústria e Comércio, Rita Freitas, referiu que esperava ver propostas concretas de modelos para a isenção das taxas no país. Rita Freitas apontou que o grande problema do país prende-se com o facto de os serviços terem sido concessionados a terceiros e há que pagar os custos de investimentos.
Em representação das Alfândegas, Romano Manhique declarou que o estudo peca por não apresentar dados sobre o processo de desalfandegamento das mercadorias antes e depois da introdução do INI. Segundo Manhique, os estudos de comparação deveriam tomar em consideração a realidade de cada país e ver se os mesmos critérios podem ou não ser aplicados em Moçambique e como é que a INI pode ser tornada barata. Isto porque há muitos agentes económicos desonestos, que optam pela subfaturação de produtos. Assim, desafiou a CTA a estabelecer um ponto de equilíbrio entre o seu negócio e as necessidades do Estado.
SCANNERS EM MOÇAMBIQUE
Atualmente, o país conta com 11 locais de INI, localizados em portos, aeroportos, fronteiras, terminais e ferrovias, dos quais cinco na zona sul, três no centro e os restantes na zona norte. A instalação deste processo em Moçambique data de 2005, quando o Governo moçambicano concessionou o serviço INI à Kudumba Investments, LDA, num negócio descrito em vários círculos como pouco claro. A atribuição do negócio dos scanners à Kudumba foi na altura alvo de várias críticas por ter sido influenciada por interesses empresariais ligados à elite política. A Kudumba, que também era importadora, não era elegível e tinha igualmente a SPI, a holding do Partido no poder, como um sócio de referência, o que terá pesado nos resultados finais.