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MOÇAMBIQUE SERÁ UMA LITE ANGOLA?

A generalidade das avaliações que se fazem sobre a economia política da indústria extrativa pinta um quadro negro no que diz respeito à transparência, uma vez que atores políticos entrincheiram-se no setor onde surgem várias oportunidades de negócio. Apesar de reconhecer alguns bons exemplos, nomeadamente no enquadramento jurídico geral, ou na lei do Petróleo, um relatório da Universidade de Oxford aponta os riscos do crescimento económico num país ainda frágil ao nível das suas instituições.

 

O relatório publicado em abril abril pela Universidade de Oxford alerta para o facto de não ter ainda fundações politicas, legais e institucionais que protejam os investimentos de riscos políticos típicos como os das expropriações, nacionalizações e punições fiscais. Sobre os riscos de corrupção, o relatório partilha o entendimento geral segundo o qual Moçambique não tem ainda anticorpos sólidos que possam deter essas práticas, apesar do quadro legal estar lentamente a ser alterado para se equiparar aos de democracias consolidadas, onde os pilares de integridade sustentam todo o edifício institucional, de forma equilibrada, numa imagem resgatada do antigo templo romano.

Amplificando perceções de funcionários de várias outras agências de cooperação baseadas em Maputo, o relatório diz que Moçambique, na melhor das hipóteses, vai ser uma “Angola Lite”. Ou seja, a prática da corrupção, haverá tráfico de influências e o conflito de interesses, mas de uma forma menos devastadora. Serão ligeiras, para usar uma expressão da língua que falamos.

Porquê “lite”? Porque, lê-se no documento, “os interesses políticos e comerciais estão distribuídos de uma forma mais ou menos extensa na sociedade e, “aqui, tudo corre de um modo muito lento“. O documento destaca também o facto de Moçambique ter “algumas fundações básicas“ em termos de transparência, que colocam o país num estágio relativamente mais avançado do que Angola, embora lembre que continua a haver instituições fracas e um setor de justiça inoperante.

Nesta comparação com Angola, o relatório agarra-se apenas a um indicador: o Índice de Perceção de Corrupção (CPI), que a Transparência Internacional, organização baseada em Berlim, divulga todos os anos e onde o país tem tido melhores classificações que Angola. Contudo, a comparação apenas com base no CPI é enviesada, pois a construção de rankings com base em perceções são sempre imprecisas e inconsistentes.

Seja como for, a ideia da distribuição de interesses políticos e comerciais em torno da sociedade sugere uma partilha, entre as elites, das oportunidades de corrupção e seus proventos. Por exemplo, o “procurement” público, as parcerias público-privadas e as grandes concessões de exploração de recursos minerais, com a pequena corrupção a florir, de certo modo, impunemente.

 

BONS EXEMPLOS

 

Um dos aspetos tidos como positivos no caso da gestão da indústria extrativa é o facto de que, segundo o relatório, a corrupção ainda não atingiu os processos de licenciamento de concessões na área dos hidrocarbonetos. “Quatro sucessivas rondas de licenciamento foram altamente competitivas e bem geridas. Não há alegações de corrupção ligadas a qualquer das rondas de licenciamento geridas pelo Instituto Nacional de Petróleos e um sistema de licenciamento competitivo parece estar salvaguardado na nova legislação de Petróleo”, lê-se no documento.

Também se destaca o facto de que, enquanto Angola torceu o nariz à Iniciativa de Transparência na Indústria Extrativa (ITIE), Moçambique aderiu imediatamente ao processo, apresentando o relatório onde os pagamentos pelas empresas do setor coincidem, em geral, com os valores recebidos pelo Governo. O ITIE fornece, no entanto, uma perspetiva muito limitada sobre transparência, pois apenas olha para aqueles dois aspetos (pagamentos e recebimentos), deixando de lado um conjunto de práticas potencialmente não transparentes em toda a cadeia de valor da indústria, mas também outros pagamentos como os que têm origem nos ganhos de capital decorrentes da transação de direitos de concessão e fundos sociais.

Apesar de Moçambique possuir esse quadro legal e institucional razoável, o relatório não deixa de frisar que a corrupção e os conflitos de interesses poderão ter efeitos perversos em alguns projetos. Não há ainda a certeza de que a lei da probidade pública (que tem em vista regular e prevenir os conflitos de interesse) possa moralizar as práticas de gestão ao nível do setor tecnocrático do Estado, onde há gestores com informação privilegiada sobre potenciais negócios públicos e que são os principais beneficiários desses negócios.

Por outro lado, espera-se que práticas menos transparentes continuem a marcar a concessão de alguns negócios na cadeia de fornecimento de bens de serviços, incluindo a construção de infraestruturas para a indústria extrativa. A concessão da base logística de Pemba e projetos de infraestrutura como a Central Termoelétrica de Moatize ou a Linha Férrea de Moatize, em forma de parcerias público-privadas, são exemplos de negócios recentes onde os interesses comercias das elites politicas falaram mais alto.

 

MAIS RISCOS EM 2018

 

Como se sabe, 2018 é o “deadline” para Moçambique exportar o primeiro navio com gás, sob pena de perder o barco num mercado de grande concorrência mundial. Contudo, para que isso aconteça, muita coisa tem ainda de ser feita, sobretudo no campo das infraestruturas, como a da Base Logística de Pemba. A concessão do negócio à ENHILS levantou vários debates em Moçambique, destacando-se uma “guerra” dentro da Frelimo entre alas empresariais (o grupo económico ligado a Alberto Chipande e a Quionga Investimentos) interessadas nas receitas em causa.

A ENHILS foi criada em 2012 como subsidiária da ENH para fornecer bens e serviços à indústria relacionada. Mas a decisão é vista como forma de acomodar interesses empresariais de alguma elite politica. A estabilidade interna da Frelimo depende de uma distribuição mais ou menos alargada das rendas que o setor extrativo pode gerar. O relatório da Universidade de Oxford diz mesmo que a criação da ENHILS acarreta muitos riscos para aquilo que se espera ser o papel da ENH no negócio do gás: o foco é posto no desenvolvimento da participação nas concessões no Rovuma, que passam pela criação da sua capacidade operacional, o que acarreta desafios de ordem estratégica, técnica e financeira. Ou seja, diz o relatório, a ENHILS poderá desviar-se o foco da ENH do seu “core business”. Outros riscos apontados passam pela dificuldade da Empresa Portos e Caminhos de Ferro (CFM) mostrar eficiência, como se viu com a operacionalidade da Linha de Sena, muitas vezes criticada pela Vale e pela Rio Tinto, e que ditou o afastamento do anterior presidente da companhia, Rosário Mualeia.

Os CFM têm o direito da participar no desenvolvimento das infraestruturas portuárias, incluindo nos portos de Pemba e Palma, em colaboração com a ENH. Aliás, já em 2014, as duas companhias estatais constituíram uma outra  empresa, a Porto de Cabo Delgado, liderada por John Kachamila, antigo ministro dos Recursos Minerais e empresário no setor dos hidrocarbonetos. A ineficiência dos CFM não deixa os operadores descansados. Recorde-se que a construção da Fábrica de Gás Liquefeito em Pemba vai depender essencialmente de os portos de Pemba e de Palma, bem como a Base Logística de Cabo Delgado, estarem 100% operacionais.

 

馬塞洛.莫斯 Marcelo Mosse Savana報為《澳門平台》提供獨家報道

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