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Prigozhin quebra o silêncio. Mas onde está e qual o futuro do Grupo Wagner?

Diário de Notícias

Líder do grupo de mercenários fala numa “marcha pela justiça” que não tinha como objetivo “derrubar o atual regime” e voltou para trás “para não derramar sangue”. Já Putin disse que “qualquer tentativa de chantagem para criar agitação interna está destinada ao fracasso”.

O líder do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, quebrou ontem o silêncio para dizer que o objetivo da revolta de sábado não era derrubar o regime russo e que voltou para trás para não derramar o sangue dos soldados russos. A “marcha pela justiça”, que ficou a 200 km de Moscovo, foi uma “masterclass” do que devia ter sido a invasão da Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022, alegou num novo ataque às lideranças militares. A mensagem áudio de 11 minutos foi revelada nas redes sociais mas não afastou as dúvidas: onde está Prigozhin e qual será o futuro do Grupo Wagner?

Numa declaração ao princípio da noite, o presidente russo, Vladimir Putin, disse que “a grande maioria” dos membros do grupo de mercenários são “patriotas” e que terem recuado evitou “um banho de sangue”. Alegou ainda que o motim teria sido travado e que os organizadores se aperceberam que as suas ações eram criminosas, reiterando que “qualquer tentativa de chantagem para criar agitação interna está destinada ao fracasso”. As declarações de Putin, que surgiu irritado, duraram cinco minutos.

Antes de recuar no seu avanço até Moscovo, o líder e fundador do grupo de mercenários terá feito um acordo com o Kremlin – negociado com a intermediação do líder bielorrusso, Alexander Lukashenko (a oposição diz que ele terá servido como mero “carteiro” entre Prigozhin e Putin). Ao abrigo do acordo, o líder do Grupo Wagner recebia uma amnistia e exilava-se na Bielorrússia. Na sua declaração, Putin parece reiterar que os membros do grupo que não queiram juntar-se ao exército russo – como está previsto por lei a 1 de julho – podem também ir para lá.

Ontem, não havia contudo confirmação oficial de que Prigozhin estivesse neste país, apenas informações não confirmadas de que teria sido visto num hotel em Minsk. No sábado à noite, foi visto a entrar num carro e deixar o quartel de Rostov-on-Don – que as suas forças tinham conquistado. Os media russos diziam ontem, citando fontes no gabinete do procurador-geral russo, que a acusação contra Prigozhin não tinha sido retirada. Vários deputados russos exigem mesmo a sua cabeça.

Na mensagem, Prigozhin disse que Lukashenko “ofereceu soluções para permitir ao Grupo Wagner continuar o seu trabalho de uma maneira legal”, sem dar mais explicações. Segundo informações não confirmadas, estaria supostamente a ser construída uma base para oito mil combatentes na Bielorrússia, numa zona a 200 quilómetros da fronteira com a Ucrânia.

11 minutos de Prigozhin

“Não tínhamos o objetivo de derrubar o atual regime e o governo legalmente eleito”, explicou Prigozhin na sua mensagem. “O objetivo da marcha era não permitir a destruição da companhia militar privada Wagner e para responsabilizar os oficiais que, através das suas ações não profissionais, cometeram um número massivo de erros. A sociedade exigia-o”, disse.

Segundo Prigozhin, a marcha começou “por causa de uma injustiça”, em resposta a um ataque a uma das suas bases, que terá morto 30 combatentes e quando o grupo está ameaçado de extinção. Em relação à ideia de que os seus homens, que desempenharam um papel fundamental na guerra da Ucrânia – nomeadamente na conquista de Bakhmut – vão juntar-se ao exército russo (têm que o fazer até dia 1 de julho), disse que não foram assinados quaisquer contratos nesse sentido.

Prigozhin revelou ainda que a marcha não fez um único morto no solo, mas mostrou-se arrependido por ter abatido um helicóptero russo, matando pelo menos 15 soldados. Segundo o líder dos mercenários, eles estavam a bombardear os veículos do seu grupo. “Voltámos para trás para não derramar o sangue dos soldados russos”, defendeu, alegando ter ficado a 200 km de Moscovo num só dia.

O líder do Grupo Wagner aproveitou ainda a sua mensagem de 11 minutos para criticar os militares russos, dizendo que a sua marcha a caminho da capital era uma “masterclass” de como devia ter sido a invasão da Ucrânia em fevereiro de 2022. “Demonstrámos um nível de organização que devia ter o exército russo”, indicou, alertando também para os “sérios problemas de segurança que existem em todo o território”. Disse ainda que “os civis receberam-nos com bandeiras russas e com o símbolo do Wagner. Todos estavam muito felizes quando passámos”.

Prigozhin exige a demissão do ministro da Defesa, Sergei Shoigu. Ontem, foi divulgado um vídeo deste responsável num avião com outros responsáveis militares, a ouvir um relatório do terreno. Não se sabe quando o vídeo foi filmado. Já o primeiro-ministro russo, Mikhail Mishustin, admitiu que o país enfrentou um “desafio à sua estabilidade”, defendendo “a união das forças” em torno de Putin.

Envolvimento ocidental?

O chefe da diplomacia russa, Sergei Lavrov, anunciou entretanto numa entrevista com a Russia Today (RT) a abertura de uma investigação sobre o alegado envolvimento de serviços secretos ocidentais na revolta de sábado. Segundo este responsável, no domingo, a embaixadora dos EUA na Rússia, Lynne Tracy, deu sinais de que Washington não tinha nada a ver com o que tinha acontecido. “Foi reiterado que os EUA procedem do facto de que tudo o que está a acontecer é um assunto interno da Federação Russa”, referiu Lavrov.

“Deixámos claro que não estamos envolvidos, não tivemos nada a ver com isto”, reiterou ontem o presidente norte-americano, Joe Biden, nos primeiros comentários depois dos acontecimentos. “Fizemos questão de não dar desculpa a Putin para acusar o Ocidente e responsabilizar a NATO”, afirmou, defendendo que os eventos fazem parte de uma luta dentro do sistema russo. “Vamos continuar a analisar as consequências dos eventos deste fim de semana e as implicações para a Rússia e a Ucrânia. Mas ainda é demasiado cedo para chegar a uma conclusão definitiva sobre onde isto vai chegar”, acrescentou num evento na Casa Branca.

O ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes Cravinho, disse que apesar da “falta de clareza” sobre os acontecimentos, já é possível afirmar que “não há coesão” na Russia e que há “alguma fragmentação do poder”. Em Bruxelas, para uma reunião com os homólogos, salientou contudo que o episódio não deve ser vir como elemento de distração e que a União Europeia deve manter-se focada no essencial. “O fundamental é continuar a apoiar a Ucrânia.”

O conselheiro do presidente ucraniano, Mikhail Podolyak, rejeitou entretanto a ideia de que qualquer sucessor de Putin poderá ser pior. “Às vezes ouvimos uma opinião dos nossos aliados ocidentais: seja o que Putin for, hoje ele é o garante da estabilidade no barril de pólvora russo. Os eventos dos últimos dias provam-nos o contrário”, disse no Twitter, voltando a pedir apoio para derrotá-lo de vez.

Na mesma entrevista à RT, Lavrov fez questão de garantir aos aliados africanos que o Grupo Wagner não irá deixar o continente. O grupo está presente nomeadamente na República Centro Africana (RCA) e no Mali. “A seu pedido, vários combatentes estão a trabalhar como instrutores na RCA. Este trabalho, claro, vai continuar. Tanto a RCA como o Mali fizeram um apelo ao Grupo Wagner para garantir a segurança da sua liderança”, afirmou Lavrov, negando haver “pânico” nestes países.

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