A Festa do Avante! realizou-se. Apesar de todo o esforço desenvolvido por quem vê no PCP o seu principal inimigo, os grandes interesses económicos e as forças mais reacionárias, para denegrir a Festa e amedrontar os seus amigos, visitantes, construtores e artistas, fez-se e fez-se bem. Em segurança, o PCP provou que é possível viver com o problema sanitário que enfrentamos.
Com normas mais restritivas do que a generalidade dos espaços (incluindo a imposição de um máximo de 16.000 pessoas, em proporção metade da lotação imposta a outros eventos) e um rigor assinalável nas medidas sanitárias abraçado pelos seus construtores e participantes, a Festa foi exemplo de que é possível viver em tempos de pandemia
A realização da Festa do Avante! passa uma mensagem fundamental: a de não ceder ao medo real ou instigado que visa isolar as pessoas, quebrar solidariedades de classe e sociais, para que os trabalhadores aceitem docilmente fazer sacrifícios, abdicar ou aceitar a limitação dos seus direitos e condições de trabalho e de vida e até da sua liberdade.
Se a Festa do Avante foi a demonstração da força do PCP, também nos mostrou a necessidade de valorizar a democracia e as possibilidades de realização através da união de quem vive do seu trabalho, a classe que uma vez mais tem a fatura da crise nas costas
O PCP, um partido com 100 anos, jamais tomaria esta decisão se ela se revelasse negativa para a saúde dos portugueses. Até porque, nesta matéria, foram precisamente os que mais criticaram a Festa do Avante! que debilitaram o Serviço Nacional de Saúde e que, sem a oposição da luta do povo, o teriam destruído para entregar o sector ao negócio. Já em temos de COVID-19, esses mesmos poderiam ter feito a diferença se tivessem acompanhado o PCP quando este propôs soluções para responder a possíveis agravamentos do estado epidemiológico e garantir a normalidade e eficácia do atendimento dos utentes, como é defendido no Plano de Emergência para o SNS, apresentado em Julho na Assembleia da República.
A Festa do Avante! é a festa da solidariedade e camaradagem, da cultura popular, da gastronomia, da música, cinema, dança e teatro, do convívio e debate fraterno. Todas essas dimensões não podem ser simplesmente eliminadas das nossas vidas, são elas também um garante de sanidade.
A Festa do Avante! foi a festa dos milhões de trabalhadores que nunca pararam. Aí estiveram representadas as lutas que travam. As consequências sociais e económicas da pandemia estão aí e na Festa não faltou a denuncia e o apelo à mobilização contra os aproveitamentos feitos desta situação para aprofundar a exploração e justificar novas políticas antipopulares.
A Festa do Avante! foi uma afirmação da cultura como direito de primeira. O acesso à fruição e criação cultural, com as adaptações necessárias, não pode ser posto em causa. Aí também se demonstrou que é possível continuar a produzir cultura e que os artistas e trabalhadores do espetáculo, dramaticamente afetados pela pandemia, não têm de ficar parados.
A Festa do Avante! foi mais uma pedra na engrenagem dos que, a pretexto da pandemia, demandam limitações ao exercício das liberdades e da ação coletiva laboral e cívica. Por isso, a Festa foi também a defesa do funcionamento da vida democrática e da participação, num momento em que esta é crucial.
Neste período milhares de trabalhadores foram despedidos, seja no fim de seis meses de período experimental, seja pela não renovação dos contratos, seja pelos despedimentos coletivos, seja pelos falsos recibos verdes. Milhares de trabalhadores tiveram os salários reduzidos, o direito a férias atacado, maiores cargas de trabalho e mais desregulação nos horários. Os micro, pequenos e médios empresários viram-se sem forma de assegurar despesas, com os apoios a serem canalizados para grandes empresas, muitas delas com lucros. Aqueles que estavam numa situação de maior fragilidade viram o fosso aumentar, com as desigualdades a revelarem-se na ausência de fortes serviços públicos, na ausência de creches e equipamentos para idosos, no acesso ao ensino em condições justas. Agudizaram-se as situações de pobreza e revelaram-se em força os problemas pré-existentes, há muito denunciados.
O país necessita de uma resposta determinada e enérgica, mas as opções feitas até ao momento pelo Governo do PS com o apoio de PS, PSD, CDS e sucedâneos não servem os interesses da larga maioria do povo português. Isso foi evidente no Programa de Estabilização Económica e Social, no Orçamento Suplementar e nos anúncios feitos entretanto, com uma clara opção de vantagem aos interesses do capital para onde estão a ser canalizados milhões e milhões de euros.
Perante uma situação que demonstrou cabalmente a profundidade das deficiências estruturais do nosso país, fruto de décadas, não é admissível que se insista nas mesmas receitas. Há um caminho alternativo que passa pelas lições retiradas da atual situação: a importância do papel dos trabalhadores e a centralidade do trabalho na sociedade; o papel dos serviços públicos; a importância da produção nacional e de ter os sectores estratégicos nas mãos do País.
É urgente recuperar os níveis de produção, do emprego, dos salários e das condições de vida, e assim contrariar o que se anuncia como uma recessão económica profunda e, em simultâneo, enfrentar as causas dos problemas evidenciados e elevar as condições de vida.
Exatamente por isto, trava-se neste momento uma batalha crucial – o aumento dos salários, a começar pelo Salário Mínimo Nacional, a valorização das carreiras, o combate à precariedade e ao desemprego. Não podem ser temas “para depois” porque eles são, em si mesmos, chave para a resolução dos problemas atuais. A CGTP convocou uma ação nacional para dia 26 de Setembro com este objetivo, ação para a qual devem convergir todas as reivindicações e lutas nos vários sectores e locais de trabalho.
Estas exigências são uma questão de justiça social, mas também ficou recentemente demonstrado como a elevação das condições de vida, nomeadamente do poder de compra, é condição necessária para inverter lógicas recessivas.
Se a Festa do Avante foi a demonstração da força do PCP, também nos mostrou a necessidade de valorizar a democracia e as possibilidades de realização através da união de quem vive do seu trabalho, a classe que uma vez mais tem a fatura da crise nas costas. São reais os riscos que se colocam quer ao nível sanitário, quer no plano económico e social, como é notório, mas para os combater é preciso olhar as causas e aplicar políticas novas. Algumas dessas políticas podem ter cabimento já no Orçamento de Estado para 2021 e não faltarão propostas concretas para tal. Nunca foi tão necessária uma política patriótica e de esquerda e por isso o Partido Comunista Português não se confinou nem confinará na resposta à pandemia e aos desafios do presente.
*Deputada do Partido Comunista Português (PCP) – Portugal